Nos anos 80, eu recebia da editora Brasiliense um informativo chamado Primeiro Toque, de periodicidade trimestral, e que divulgava os lançamentos da editora. A Brasiliense era na época uma das melhores editoras em minha opinião, pois mantinha um ótimo catálogo de autores, nacionais e estrangeiros. Foi responsável, por exemplo, pela publicação de vários livros da Beat Generation, como o clássico On The Road, de Jack Kerouac, dentre outros. Havia também coleções como Primeiros Passos, Tudo é História, Encanto Radical, Qualé, Cantadas Literárias e Primeiros Voos.
Um dos livros lançados pela coleção Tudo é História, é A Aventura da Jovem Guarda, de Paulo de Tarso C. Medeiros, uma edição de bolso, de preço acessível, que trazia informações, análises, fotos e um resumo do movimento. O texto de divulgação da obra, de título Essas Bárbaras Guitarras Elétricas, escrito por Sofia Carvalhosa, e que veio no Primeiro Toque nº 11 (out/nov/dez 1984) é o seguinte:
“Passeata contra a ditadura, desemprego, pelas diretas todo mundo já ouviu falar, já foi, ou no mínimo já leu no jornal ou viu na TV. E passeata contra o iê-iê-iê, já te passou na cabeça? Pois não é um delírio. Foi no dia 17 de junho de 1967 em São Paulo. O percurso: do Largo São Francisco até o antigo Teatro Paramount, na avenida Brigadeiro Luís Antônio, onde se realizaria o programa Frente Ampla da MPB. Os manifestantes: os representantes da “verdadeira” MPB: Elis Regina, Jair Rodrigues, Zé Keti, Edu Lobo, MPB4, Gilberto Gil (?) e fãs universitários a fim de salvar muitas coisas, uma delas a pureza da música de 'raiz' brasileira, contra os ritmos estrangeiros e essas bárbaras guitarras elétricas. De bandeirinha do Brasil na mão e cantando o hino (Moçada querida/Cantar é a pedida/Cantar a canção/Da pátria querida/Cantando o que é nosso/Com o coração) lá foram eles para o teatro. Nara Leão e Caetano Veloso se recusaram a ir. Assistiram a tudo da janela do Hotel Danúbio e comentaram que aquilo parecia mais uma passeata integralista. 'Tenho medo dessas coisas', disse Nara. Essa passeata foi muito inspiradora de paródias de compositores do Tropicalismo, quando se ironizava uma certa impostação nacionalista da música popular. Na verdade, essa passeata foi uma jogada da TV Record para promover o programa O Fino da Bossa, liderado por Elis Regina, que vinha perdendo audiência para a Jovem Guarda e sua música americanizada. O estranho é que os dois programas eram da mesma emissora. Mas por que Roberto, Erasmo e sua turma ameaçavam tanto a MPB? Em primeiro lugar, a perda de audiência. Depois, o público deles era muito mais amplo: meninas de ginásio, operários, gente de subúrbio que começava a comprar os discos de iê-iê-iê. A música deles não tinha censura cultural. Era pra fazer sucesso. De repente, o descompromisso em salvar a cultura nacional possibilitava falar diretamente de assuntos que estavam reprimidos pelo pessoal 'de cá', com a afirmação de coisas atuais da vida: O MEU CARRO É VERMELHO. Nem Vandré nem Edu Lobo diriam isso, embora tivessem um carro que talvez fosse vermelho. Ou arrebatamento de paixão: MEU CORAÇÃO É DO TAMANHO DE UM TREM; havia um individualismo feroz de saúde brutal: SIGO INCENDIANDO BEM CONTENTE E FELIZ, NUNCA RESPEITANDO O AVISO QUE DIZ: É PROIBIDO FUMAR. Roberto Carlos disse isso. A primeira pessoa que superou essa guerra musical foi Jorge Ben. Enquanto as pessoas brigavam, ele já estava na Jovem Guarda, cantando uma música que dizia: EU SOU DA JOVEM SAMBA.”
POvo nojento ainda bem que essa merda de bossa nova terminou!!!
ResponderExcluirLamentável. E o pior e que essa postura contra a guitarra elétrica, o rock e outros ritmos que usam guitarra ainda existe. É tudo "banquinho e violão". A guitarra é considerada por esses fascistas como algo a ser combatido.É policiamento ideológico, É CENSURA FEITA PELOS PRÓPRIOS MÚSICOS.
ResponderExcluirFoi uma postura lamentável e equivocada. Muitos dos músicos que participaram dessa passeata mais tarde mudaram seus conceitos, e até passaram a adotar a guitarra em suas gravações e shows. Mas na época parecia facismo e conservadorismo. Felizmente os tempos mudaram. Hoje somente os mais radicais ainda conservam essa posição radical e antiquada.
ResponderExcluirUm abraço
Achei o post bem interessante, e usei como base para criar o post do meu blog para o dia de amanhã. O 365mais1 (http://365mais1.tumblr.com) sempre fala de alguma coisa que aconteceu no dia que corresponde. E como esse é o caso do dia de amanhã, vou usar o seu texto. Não é copia e está devidamente mencionado o seu blog. Espero que não haja problemas. Qualquer coisa é só avisar.
ResponderExcluirAbraços!
Pode usar o texto, sem problemas. Bastante interessante a ideia de seu blog. Vou conferir. Abraço
ResponderExcluirEra uma época em que não havia uma clareza de ideais nem direcionamentos. Eles queriam ser nacionalistas. Só não sabiam como expressar isso...ai vem o Caetano...Oswaldiando...e traz todos a luz da Antropofagia. Usando a própria guitarra p criar um dos estilos mais importantes da história da música popular brasileira.
ResponderExcluirExato. Era uma época de divisões na MPB. Radicalismos que não levavam a nada de positivo
ResponderExcluirA Elis tava com medo de perder o emprego,era arrimo de família desde criança,e por extensão queria salvaguardar as tradições da música brasileira.Contextualizando até que faz sentido,até hoje o preconceito sobre a jovem guarda é grande.
ResponderExcluirAquele foi um período meio conturbado. Havia um radicalismo por parte da ala mais tradicional e apegada às raízes. Sei que muita gente que compareceu àquela passeata se arrependeu. O próprio tempo se encarregou de mostrar que tudo aquilo foi um grande erro
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