Palavras Domesticadas

Palavras Domesticadas

quarta-feira, 30 de março de 2011

Caetano X Lobão: A Briga Continua


Caetano Veloso e Lobão há muito vivem se debatendo através da imprensa. Lobão, por seu estilo mais provocador, normalmente é sempre quem alimenta essa polêmica, com críticas mordazes ao músico baiano. Caetano costuma respondê-lo, quando responde, com bom humor, dando a entender que não o leva muito a sério. Isso já vem de longa data. Dizem que tudo começou com duas palavras, “lobo bolo”, trecho da música de Caetano “Rock n' Raul”. Lobão ao ouvir a música, no Programa do Jô, sentiu que era com ele, e respondeu de imediato com a música “Para o Mano Caetano”. Em seguida, o que se viu foram seguidas farpas que os dois andaram trocando pela imprensa, como uma crônica escrita por Lobão em O Globo, intitulada “Quero a MPB de 4, Quarteto Fora de Si”, onde cita Caetano no seguinte trecho:
'Caetano com seu jeito santoamárico-provinciano, apadrinha a bossa nova e diz que ela é superior, que João Gilberto é seu ídolo, aquelas coisas dele, né?'
Caetano em seguida responde:
'Quanto a Lobão, vi no GLOBO o que ele escreveu. Um texto péssimo, confuso, querendo usar coisas que seriam bombásticas, mas não resultando bombásticas.”
Às vezes há uma trégua, mas volta e meia uma questão vem à tona, e os dois acabam se debatendo, mas sempre havendo um respeito mútuo, apesar das inúmeras discordâncias, sejam estéticas ou de opiniões.

Uma vez, inclusive, a revista Trip, em sua edição de julho de 2001 reuniu os dois em uma entrevista em um quarto de hotel, quando demonstraram o respeito mútuo que citei acima, e muito bom humor em relação às críticas e bate-bocas que os dois andavam trocando bastante naquele período. Na chamada de capa a revista destacava um trecho da entrevista:
Caetano: “Tenho recebido muitas farpas suas”
Lobão: “Eu queria mesmo sacanear você”
A entrevista não se prende a esse conflito de opiniões. Abrange assuntos gerais, sejam de ordem artística ou política, onde os dois por vezes divergem, porém nem sempre com um tom provocativo. Também se elogiam e reconhecem qualidades no trabalho de ambos. O bom humor é a tônica no encontro dos dois, como nos trechos abaixo:
Caetano: “Pô, Lobão é foda. Aparentemente agressivo comigo, mas tão engraçado!”
Lobão: “Tenho um respeito geriátrico pelo Caetano”

A polêmica entre os dois, que havia dado uma trégua, reascendeu agora com o comentado caso envolvendo um projeto de poesia envolvendo Maria Bethânia, que recitaria um poema por dia durante um ano, usando a internet como veículo, projeto esse que teria recebido do Ministério da Cultura uma verba de R$ 1,3 milhão. Inúmeros protestos quanto à liberação da elevada quantia, em detrimento a outros projetos culturais, foram feitos, inclusive por parte de Lobão. Em sua última coluna dominical em O Globo, Caetano veio em defesa da irmã. Em um trecho de seu texto afirma:
“Toda a grita veio com o corinho que repete o epíteto 'máfia do dendê', expressão cunhada por um tal Tognolli, que escreveu o livro de Lobão, pois este é incapaz de redigir (não é todo cantor de rádio que escreve um 'Verdade Tropical').
Pelo que se vê a polêmica Caetano X Lobão ainda não terminou.

terça-feira, 29 de março de 2011

Ana Cristina César


Ana Cristina César era um dos nomes mais representativos de uma nova poesia que se estava produzindo no Brasil a partir dos anos 70, e se afirmando na década seguinte. Foi, segundo Eucanaã Ferraz, “personagem fundamental no ambiente artístico e cultural do Rio de Janeiro nos anos 1970.” Segundo Heloisa Buarque de Hollanda, doutora em Letras pela UFRJ, “no meio dos poetas marginais era e se comportava como musa, um pouco distante como devem ser a musas.” Por uma dessas coisas que não têm explicações – e para que buscá-las?, - Cristina resolveu antecipar sua partida desse mundo em 1983, aos 30 anos.

Em 1987, ao ser lançado seu livro póstumo A Seus Pés, o poeta e amigo Armando Freitas Filho escreveu esse texto, sobre a obra e a autora e amiga:
“Olhos azuis, a flor da pele. A Teus Pés (Ana Cristina César) foi escrito na rua e pelo telefone. Num caderno preto, pautado, de capa dura, desses que antigamente, eram usados por pequenas firmas para registro, sempre caligráfico, de suas atividades, do seu 'dever & haver'. Foi escrito com canetas de vários tipos e cores, como se, inconscientemente se desejasse sublinhar e fixar as muitas intenções e nuances, a pegada mais forte ou mais suave de cada texto.
Seu primeiro nome foi “Meios de Transporte”, logo abandonado por ter um segundo sentido demasiadamente explícito. A escolha definitiva me foi comunicada num telefonema extra, de tarde, pois nos falávamos diariamente pela manhã, quando Ana me disse que tinha achado o título, afinal, num poema meu, no último verso.
À princípio achei meio bolero, mas depois fui me acostumando, na medida em que acompanhava literalmente, passo a passo, a feitura do livro. Na época escrevia também o meu, que se chamava “3X4”. Esses 'telefonemas de consulta' eram discussões pormenorizadas sobre os escritos de cada um, quando tudo era visto sem nenhum rigor fetichizado, de colarinho branco, mas sim meio na contramão, a la diable.

Hoje, quando me lembro desse tempo, não poderia dizer, com exatidão, quem telefonava pra quem. Ora um, ora outro. Ou o telefone tocava sozinho numa ligação telepática?
A Teus Pés, também, foi escrito andando, ao meu lado, pelas ruas do Rio, viajando em 'frescões' ou sentado em mesas de chá transitórias. Foi, aliás, na Confeitaria Colombo que ela me levou a versão final, impecavelmente datilografada em máquina elétrica, às vésperas de enviar os originais para a Brasiliense. Sugeri cortes, supressões de alguns textos. Foram aceitos depressa. Fiquei arrependido, liguei à noite e disse que era melhor considerar com mais calma a eliminação deles. Ela disse não. Os originais já tinham sido remetidos. Dois anos depois penitenciei-me incluindo muitos desses poemas em 'Inéditos e Dispersos' (Ana Cristina César).
Agora estou aqui recordando esses pequenos acontecimentos, publicando intimidades delicadas, O telefone telepático, na ponta do trampolim, não bate mais. É uma caixa-preta, for ever. Nunca pensei que na minha vida acontecesse uma coisa tão forte, tão brusca e selvagem, e que uma ausência pudesse ser tão viva.”

segunda-feira, 28 de março de 2011

Treze - Uma Aventura Literária de Pete Towshend


Muitos astros do rock também já se aventuraram pela literatura. A lista seria extensa: John Lennon, Bob Dylan, Jim Morrison, só para citar alguns. Outro roqueiro que também deixou um pouco sua guitarra de lado para exercitar seus dedos na máquina de escrever (na época ainda se usava essas hoje peças de museu) foi Pete Towshend, líder da banda inglesa The Who. Em 1987 seu livro Horse's Neck seria lançado no Brasil, com o título de Treze. Na ocasião, o designer gráfico, e autor da capa da edição brasileira, Wilton Azevedo, escreveu a seguinte resenha:
"Todo mundo sabe: Pete Towshend, o líder do grupo The Who, foi o roqueiro que, além de introduzir a performance do ruído em seus shows, quebrando e incendiando instrumentos, inaugurou a linguagem do que se intitulou Ópera Rock. Quem conhece as letras de suas músicas sabe que Pete está sempre questionando o comportamento adolescente, principalmente vivendo na Inglaterra, um país onde se encontram pelas ruas adolescentes de até 50 anos.
Horse's Neck é seu livro agora lançado no Brasil com o nome de Treze. É um livro curioso, dividido em pequenos contos que se parecem muito com aquele desejo da gente de um dia cruzar o Pete no meio da rua, pedir um autógrafo e ouvi-lo contar algumas de suas aventuras.

Pete mistura ficção com fatos reais que não passam de situações banais. Acontece que é dele, e, se tratando de Pete, as coisas banais nunca são banais. Além do mais, Pete é bem charmoso ao tirar de si toda a culpa de ter escrito o que escreveu. Já no prefácio, atribui à sua mãe toda a responsabilidade por tê-lo influenciado a ponto de produzir este Horse's Neck, que, na gíria inglesa significa algo próximo a "Tolices".
Em "A Peixaria" ele conta como conheceu o dono, um espanhol que tinha sido violonista famoso em seu país e que mais tarde fugiu para a Inglaterra motivado por um caso amoroso. Pete ia todas as noites à peixaria para tocar junto com o amigo, onde executavam durante horas seguidas solos estilo flamenco. E não é tudo. Ele conta como as pessoas o julgavam homossexual por ficar horas com o amigo espanhol.
Sua imagem controvertida diante do público parece que o acompanha como uma espécie de carma desde a adolescência. O melhor retrato desta imagem é seu pulo voador com a guitarra em um solo estridente.
Foi baseado neste aspecto que desenvolvi o design gráfico da capa, extraindo do grafisno da xerox uma espécie de fôlego suspenso, assim como um vídeo clip das histórias de Pete."

sábado, 26 de março de 2011

Arnaldo Antunes no Sesi Campos


Na noite de ontem (25/03) Arnaldo Antunes se apresentou no Sesi Campos. Apesar de seus últimos trabalhos serem o cd Iê-Iê-Iê e o cd e dvd Ao Vivo Lá em Casa, Arnaldo optou por um outro repertório, já que em vez de sua banda trouxe apenas dois de seus músicos: Chico Salém e Betão Aguiar, ambos no violão ou eventualmente com Betão na guitarra. Como a sonoridade de seus últimos trabalhos pede a presença de sua banda completa, o show acabou sendo um apanhado de sua carreira, o que em certo ponto até funciona melhor, já que pôde assim cantar músicas mais conhecidas do público. Essa opção pelo formato semi-acústico, segundo Arnaldo, foi em função das dimensões do teatro do Sesi.
Arnaldo, desde a época dos Titãs já se revelava um artista multi-mídia. Além de letrista publicava livros de poesia (com influências concretistas) e participava da arte gráfica dos álbuns da banda - um exemplo é o belo trabalho de capa de O-Blesq-Blom. Ao deixar a banda, em 92, Arnaldo lançaria seu primeiro cd e vinil (na época esse formato ainda era lançado) Nome. O projeto ainda incluia um livro e uma fita vhs. Era um trabalho bem experimental e pouco comercial, mas foi a realização de um projeto pessoal que seria impossível de ser concretizado enquanto membro da banda. Seus trabalhos posteriores passaram a tender para um tipo de música mais audível para os ouvidos menos habituados para suas experimentações, sem que isso viesse a significar qualquer tipo de concessão ao mercado.
Voltando ao show, Arnaldo escolheu um repertório que se encaixasse melhor no formato reduzido de voz/violões/guitarra, dando destaque para aquelas músicas mais conhecidas, mas não deixando de interpretar algumas de sua nova safra. Assim, ele trouxe ao palco músicas como O Silêncio, Alegria, Socorro, Não Vou Me Adaptar (remetendo aos Titãs), o Sol entre outras, além de algumas de seu disco atual, como Invejoso, Consumado e Longe (parceria com seu tecladista Marcelo Jeneci). Apresentou ainda uma música inédita ainda sem título, que compôs em parceria com seu baixista Betão Aguiar, Davi Moraes e Pedro Baby.

Sua performance no palco e sua comunicação com o público revelam um artista com ótimo domínio de palco, coisa que já demonstrava desde os tempos dos Titãs. Chegou a descer do palco e cantar próximo à plateia e dançar com desenvoltura de um jeito bem pessoal. O show funcionou bem, não só por Arnaldo, como também pelos dois excelentes músicos que o acompanharam.
Após deixar o palco sob calorosos aplausos, retorna ao palco para o bis trazendo três músicas, para encerrar sua apresentação: Engrenagem, do disco Um Som, Essa Mulher e Judiaria, de Lupiscínio Rodrigues, num arranjo bem eletrificado.
Foi mais um bom show trazido pelo Sesi.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Titãs - Revista HV 1988


Os Titãs eram a minha banda favorita nos anos 80. Eu acompanhava atentamente todo aquele movimento que vinha acontecendo ainda no início daquela década, o surgimento de bandas que traziam um trabalho novo, revelando novos músicos, compositores e letristas de talento. É certo que como todo movimento que ganha a mídia, muita coisa ruim surgia na carona da onda do sucesso - as próprias gravadoras na busca de novos e rentáveis produtos para o mercado inventavam fórmulas, e apostavam em artistas fabricados. Mas o certo é que naquela década muita gente boa surgiu.
À princípio não me liguei muito no som dos Titãs. Seus dois primeiros discos passaram meio batido por meus ouvidos, mas em 1986, quando lançaram o histórico disco Cabeça Dinossauro, o som da banda deu uma guinada de qualidade. Aquele é um disco fantástico, e que merece entrar em qualquer lista dos melhores discos lançados no Brasil, e por sinal, entrou mesmo em várias que já li. Os discos que vieram a seguir mantiveram o nível de qualidade: Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas, Go Back (ao vivo) e O-Blesq-Blom. O disco seguinte, Tudo Ao Mesmo Tempo Agora, já não manteve o mesmo patamar, mas mesmo assim traz bons momentos. Em seguida, já sem Arnaldo Antunes, a banda lançaria Titanomaquia, um disco radicalmente pesado, com produção de Jack Endino, conhecido produtor de bandas pesadas americanas.
Mas voltando a falar de sua fase áurea, em 1988 uma revista alternativa chamada HV (Humor/Verdade) trazia uma matéria de capa com a banda. Falando em capa, a revista trazia uma capa dupla, que aberta, como na foto que abre essa postagem, mostrava uma foto com todos os até então, oito integrantes do grupo.

A matéria trazia 20 depoimentos sobre a banda, como algumas dessas abaixo:
"Os Titãs são o melhor grupo de rock deste país. Eles compreendem o que é essencial para que um rock seja a alquimia da mistura da imensa tristeza que nos envolve com um pouquinho de alegria. Alguns críticos e gravadoras pensam que os grupos de rock como os Titãs, Inocentes, Legião Urbana, Lobão, etc. são descartáveis. Eles são anarquistas de um novo anarquismo. No sentido do pacifismo, da descentralização, onde a extrema hostilidade da disputa pela existência seja substituída não pela concordância e pela uniformidade do tédio, mas sim pela instalação de um suspense maior, em que cada segundo seja supercarregado de emoção, tesão, ardor e... beleza." Jorge Mautner
"Eu acho os Titãs o máximo. O Sérgio Brito é atualmente um dos melhores cantores do Brasil. Além disso, não tenho mais nada pra falar, pois a música deles já diz tudo." Renato Russo
"A partir dos dois últimos trabalhos dos Titãs é que eu passei a tê-los como a minha number one. Principalmente pelas letras, pois a música me lembra bastante o punk dos anos 70, mas isso não deprecia de forma alguma o trabalho musical do grupo. Explico: bandas como Gang of Four ou Buzzcoks hoje são praticamente a bíblia de quem quer fazer rock'n roll. É como se você tivesse de ouvir James Brown e Aretha Franklin pra falar de música negra."
Kid Vinyl
"Eu adoro. É uma banda de afinidades culturais especiais. E é por causa dessas afinidades que a banda se formou. Eles não tocam rock simplesmente por tocar."
Ivald Granato, artista plástico
"Eu gosto tanto dos Titãs que já comprei o disco e um dia pretendo ler o livro e ver o filme."
Washington olivetto, publicitário

quinta-feira, 24 de março de 2011

Gal Costa - Ensaio Fotográfico Revista Status 1985


Em fevereiro de 1985 a revista Status publicou um ensaio fotográfico de Gal Costa nua. Status era na época uma publicação masculina, que competia com a Playboy, e costumava fazer ensaios com modelos famosas e atrizes. Gal, que sempre foi considerada um sexy simbol, e sabia explorar bem sua sensualidade, sem nunca parecer vulgar ou exibicionista, nos anos 80 ainda apresentava belas formas, e esse ensaio foi muito aguardado. Como era de se esperar, as fotos, clicadas por Marisa Alvarez Lima, que por sinal, fotografou muito os tropicalistas, ficaram bem discretas, mais sugerindo do que propriamente mostrando detalhes de seu corpo. Não há fotos de nu frontal nem de sua bunda, mas as fotos ficaram belas, e podem se encaixar no conceito de "nu artístico".
A revista, além das fotos, traz uma boa matéria a seu respeito, e um texto de Caetano Veloso, que transcrevo abaixo alguns trechos, para não tornar a postagem muito longa:

"Gal só me surpreendeu uma vez: quando a conheci e a ouvi cantar. Foi uma surpresa tão grande e tão profunda que ainda hoje vivo sob o seu impacto. Na hora eu pensei: 'A maior cantora do Brasil.' Daí em diante foi só acompanhar os modos com que essa constatação procurou se confirmar (...)

Lembro do festival de rock da ilha de Wight, milhares de pessoas nuas na praia: eu ficava excitado, mas não envergonhado ou escandalizado. Gal estava lá. Eu nem me lembro se ela tirou a roupa. Eu nunca namorei com ela. Uma vez tive uma pequena discussão com o jornalista Ruy Castro (terá mesmo sido esse?) por causa dessa mania atual de se perguntar aos entrevistados se já treparam, se já brocharam, etc... Foi na casa de Eduardo Mascarenhas e por causa da entrevista deste (ele tinha se atrapalhado na resposta à pergunta sobre brochada). Acho uma tolice que as pessoas se sintam na obrigação de narrar suas intimidades. Pois bem, eu e Gal sempre brochamos todas as vezes que tentamos brincar de namorar.

No início de da nossa carreira, dividíamos a cama de casal de Guilherme Araújo (empresário dos dois) em Sampa. Todas as noites eu tentava seduzi-la com um disco de Bob Dylan e papo-furado. Ela sempre resistiu e terminávamos às gargalhadas.
Acho que na época dos Doces Bárbaros, na Bahia, nós tentamos fingir que íamos namorar no hotel onde ela estava hospedada. Foi legal porque eu a vi nua como agora ela aparece em algumas dessas fotos bonitas que a Marisa fez. Tomando banho. Gal é linda."

terça-feira, 22 de março de 2011

Show do Kiss no Maracanã - Junho de 83


Em 18 de junho de 1983, a banda Kiss deu um show histórico no Maracanã. A banda estava completando 10 anos de estrada, e para comemorar realizou uma turnê mundial, que incluiu o Brasil, para delírio de seus fãs brasileiros. A revista Mixtura Moderna fez uma ampla matéria sobre esse show. Se não estou enganado, esse foi o primeiro show de rock acontecido no estádio do Maracanã. Que eu me lembre, antes só Frank Sinatra havia cantado antes no mesmo local.
A revista, dava destaque ao show, e trazia na capa o guitarrista Paul Stanley. Acompanhava a edição um encarte em formato tablóide trazendo fotos e comentários do show.

A jornalista Ana Maria Bahiana comentava:
"O som estava muito baixo,tímido e embolado para um show de rock, ainda mais de heavy metal. O Kiss entrou em cena uma hora atrasado, os canas não deixaram ninguém no gramado em paz, a cusparada de sangue de Gene Simmons em 'God of Thunder' foi vista só por meia dúzia nas primeiras filas e depois, bem tipo nada-a-ver, ele deu de gritar 'Mengô! Mengô!' com o linguão de fora, todo ensanguentado. Para culminar, um bando de crentes enchia o saco da galera, distribuindo folhetos, fazendo pregações aos berros e agarrando as pessoas pelo braço para impedi-las de entrar naquele 'antro de perdição', onde se iria celebrar um 'culto a Satanás', dos 'Kids in Service of Satan', aliás Kiss.
Mas para quem gosta, que noite a de 18 de junho!

O som vem rugindo baixo, mas dá pra sacar que é 'Criatures of the Night' a música de abertura. As luzes estão belíssimas sobre a fumaça e os quatro, assim de longe e com as roupas em full regalia, nem parecem tão gordos quanto na vida real. Tocam, numa enfiada só, 'Creatures', 'Detroit Rock City' e 'Cold Gin', com brevíssimos intervalos para as adulações de praxe 'Helo Rio de Janeiro, we love you', etc, etc. Paul Stanley balança um rabinho de pele preso ao seu macacão de lycra e provoca o público: 'Precisamos do Doutor...(ninguém responde, a princípio), do Doutor... (Love!,a galera urra). DOCTOR LOVE!' - pronto, mais uma música.

O que se passa no palco agora? Ah, sim, começaram os solos, esse ritual imprenscindível ao heavy metal. Vinnie Vincent na guitarra é o primeiro. Bom. O melhor de todos. Acordes rápidos, à maneira de Eddie Van Hallen. Limpo, pouca distorção. Paul Stanley é o seguinte. Faz charme à beça, as meninas deliram, mas é fraquinho demais. Quase o mesmo solo de Vinnie, só que executado canhestramente.
Apoteose final: fogos de artifício por todos os lados, luzes, fumaça e um bis para arrasar com os maiores sucessos da banda, 'I Was Made For Loving You' e 'Rock And Roll All Nite'. Poder, poder! Arquibancadas em pé, dançando" Muita luz, delírio!
Fim de festa, a galera suada apesar do frio, eu me lembro de uma reportagem de Charles M. Young sobre o Kiss não prometerem esclarecer a origem do universo nem o sentido da vida, mas funcionam. Como funcionam."

segunda-feira, 21 de março de 2011

Jaguar fala da briga entre Chico e Millôr


O Almanaque Casseta Popular, revista de humor, que depois se juntaria ao jornal Planeta Diário, e formaria o Casseta & Planeta, trazia em suas edições entrevistas bem interessantes. Em sua edição nº 44, de 1991, o entrevistado foi o humorista Jaguar, de quem, aliás já falei aqui neste espaço, por seus livros e revistas de humor.
A citada entrevista traz muitas histórias, já que Jaguar é reconhecidamente um ótimo papo. Dentre os muitos casos, Jaguar fala de uma briga feia entre duas das mais respeitadas figuras da cultura brasileira: Chico Buarque e Millôr Fernandes. Eu já tinha ouvido falar que os dois mestres da palavra andaram se estranhando, mas não imaginava que a coisa tinha chegado quase às vias de fato.
Em um trecho da entrevista Jaguar falava de Millôr, e comentava sobre alguns desentendimentos e brigas do humorista:
"O Millôr brigou com um monte de gente e a briga mais séria que ele teve, que eu saiba, foi com o Chico Buarque. Alguém perguntou pro Millôr numa entrevista o que ele achava do Chico Buarque e ele disse assim:'Eu não confiaria o meu cachorro pra passear com ele na praia'. Mas aí o Millôr estava lá Antonino's com a Cora Rónai quando chega o Chico de porre e falou: 'Pô, o que você tem contra mim?' E aí o Millôr não respondeu nada e o Chico foi e deu uma cusparada no Millôr. O Millôr pegou e jogou uma garrafa de Johnie Walker, errou e quebrou ao meio. O Chico deu outra cusparada. Acertou. O Millôr jogou o saleiro, o serviço, todas as coisas que estavam na mesa, só faltou jogar a Cora Rónai (gargalhadas). Errou. Aí o pessoal veio, separou e tal. Então eu contei essa história no Pasquim sem citar nomes: O maior humorista brasileiro e o maior compositor brasileiro brigaram e coisa e tal. Aí estou lá em Vila Isabel, e aí o Perna vira e diz: 'Pô, que coisa chata, que aconteceu entre você e o Gil'. O outro chegava e dizia:'Pô, aquela briga entre o Milton Nascimento e o Ziraldo, hein?'(gargalhadas)."

domingo, 20 de março de 2011

Revistas Legais - Vogue Caetano


A revista Vogue Brasil lançava em 1987 uma edição que trazia uma longa matéria de capa com Caetano Veloso. Com excelente acabamento, trazendo muitas fotos, biografia, entrevista, discografia e muitos depoimentos, a revista é um excelente documento sobre o polêmico personagem de nossa história cultural. Amado e odiado na mesma proporção, por suas posições, Caetano nunca passou despercebido pela mídia, seja por sua música ou por suas constantes brigas públicas com a imprensa. A matéria se inicia com esse texto de apresentação do publicitário Washington Olivetto:
"Ninguém neste país tem demonstrado tanta capacidade de fazer o novo de novo quanto ele. Caetano está mudando sempre para continuar a mesma coisa: Caetano. Mais do que um compositor e um cantor extraordinário, ele é radar. Detecta, fuça, redescobre, patrocina. É ao mesmo tempo terremoto e sismógrafo. Por isso, não é à toa que o Andrea Carta e equipe escolheram o Caetano para abrir a new age da Vogue. Setenta páginas sobre um Caetano adoravelmente jovem e irredutivelmente mudo. Em silêncio. Fazendo barulho."

A revista traça uma trajetória de Caetano desde seus primeiros passos em Santo Amaro da Purificação, até sua vitoriosa carreira, e traz uma série de depoimentos:
"Com Caetano tem sido, desde que nos encontramos, como se nossas vidas transmitissem no espaço de um destino. Um espaço curvo, onde as aproximações e os afastamentos se dessem sempre sem a perspectiva da separação. Mas, antes, com a garantia elástica da unidade de um despropósito. Porque os interesses que nos reuniu têm estado sempre projetados para além de um finalíssimo estético-cultural, para além das aparências de um necessário utilitarismo subjacente, para além dos perigosos desvios do preciosismo (no caso dele) e da vulgaridade (no meu)" Gilberto Gil
"Tenho tanta coisas a dizer pra Caetano. Ele está fazendo coisas tão lindas. Olha, Caetano anda dizendo por aí que eu sou gênio. Diga para ele não falar assim, não. O gênio é ele. Caetano é um poeta. Caetano está lá no alto, lapidando a inteligência. Mas vamos pensar um pouco mais sobre o que Caetano está fazendo. Tenho tantas coisas a dizer pra ele. O que é que eu vou dizer pro Caetano? Não, não diga nada disso. Diga que eu vou ficar olhando pra ele." João Gilberto

O próprio Caetano escreveu um texto para a edição da Vogue:
"Eu, por exemplo Amargo Santo da Purificação: Só posso falar com você sobre o que você não entende numa forma que você não entenda.
Nos setenta milímetros do infinito, nos dois mil e um anos de viagem, na longa metragem, no Urubuquaquá, no Pinhém, anywhere, no século passado, eu no presente, eu no singular, desgarrado da neve, caindo? Para fora da tela, desprojetado? Minha fantasia, meu pesadelo desprotegido, eu não. Amor morto motor da saudade: No dia eu fui embora não teve nada demais. Não tenho medo, não: nada é pior que tudo. Soy loco por ti, América(While my eyes go looking for flying saucers in the sky). É preciso estar atento e forte, não temos medo de temer a morte. Vocês não estão entendo nada! nada! nada! Tomar uma aguinha de coco, sofrendo a brisa mansa de Itapoã. Um daqueles passarinhos viria pousar no braço da vitrola, mas isso não incomodaria Joãozinho, que continuaria construindo seu labirinto que vai da beira do Rio para a mesma beira do Rio.
O calidoscópio giragiragira e nos projeta mil anos no tempo, atrás ou adiante, numa época muito diferente da atual."

quarta-feira, 16 de março de 2011

Momento Mala


Essa tira acima, publicada em O Globo me fez lembrar de um fato que aconteceu comigo há alguns anos. O crítico de música que vai ao dentista, e lá é obrigado a ouvir um "fó-fó-ri-fonfon" tocado por Kenny G., foi parecido com algo que me aconteceu numa tarde de sábado, numa localidade onde trabalhava em meus tempos de ferroviário. Estava em uma lanchonete onde o pessoal se reunia, na companhia de quatro pessoas, sendo que um dos caras tinha levado uma fita cassete de Kenny G., e pediu para tocar pra gente ouvir. Como não suporto Kenny G., logicamente fiquei contrariado com a escolha da música ambiente, mas como eram quatro fãs daquele som xarope, e eu não estava muito disposto a entrar em um conflito de opiniões, fingi que estava até curtindo, e apesar de não fazer falsos elogios, acho que consegui disfarçar minha contrariedade por estar ouvindo aquele som.
De vez em quando eu falava alguma coisa, mas nunca eram elogios, como por exemplo, na hora em que falei que conhecia um saxofonista melhor que ele: David Samborn. Ao afirmar isso, era como se eu dissesse a eles que Kenny G. era bom, mas David Samborn é melhor ainda. Essa com certeza foi a interpretação que eles deram, mas o que eu disse na verdade é que Kenny G. é muito chato, e Samborn é um músico muito melhor em seu instrumento. O "fó-fó-ri-fonfon" continuava tomando conta do ambiente, o pessoal elogiando aquele som xarope, e eu ali fingindo que também estava curtindo. Eu até poderia dizer que aquele som não me agradava, mas como falei acima, seria meio desgastante ter que debater com os quatro caras, e eu naquele dia não estava muito a fim de argumentar em contrário contra aquela quase unanimidade. Um dos caras até pediu para o dono da fita tirar uma cópia para ele enquanto o som continuava tocando, e eu torcendo para a fita acabar logo. Como eu não sou muito de falar mesmo, minha falta de elogios à música que tocava não dava a entender que eu estava indo contrário à opinião geral. Lembro que já no fim da fita, um dos caras, em certo trecho da música olha para mim sorrindo, me chamando a atenção para a música que tocava, e aí então eu tive que pela única vez soltar um falso elogio: "Mó som!", foi o que eu falei, até porque àquela altura já não dava para revelar a verdade sobre como aquela música chata estava entrando em meus ouvidos.
Aquele, como outros momentos que às vezes temos que viver, eu chamo de momentos malas. Esse momento mala, ao som de Kenny G. é inesquecível, e como na tira do cartunista Reinaldo, que faz parte do Casseta & Planeta, se pudesse aplicava uma anestesia nos ouvidos.

domingo, 13 de março de 2011

The Dark Side Of The Moon - Primeira Audição no Brasil


Achei interessante quando reli essa matéria sobre lançamento de discos, que saiu na revista Pop de junho de 1973. O jornalista e crítico Tárik de Souza comentava sobre um disco que estava sendo lançado no Brasil naquele momento. O texto fala de quando a gravadora Odeon, que distribuía por aqui os lançamentos da Harvest, de onde o grupo Pink Floyd era contratado, importou a fita master para a prensagem e lançamento no Brasil. O disco The Dark Side Of The Moon, que se tornaria um dos álbuns clássicos do rock, sendo recordista de tempo nas paradas de sucesso era apenas mais um lançamento. O jornalista, ao fim da matéria afirma que o disco seria um dos mais importantes lançamentos de 1973, sem saber que na verdade The Dark Side Of The Moon estava destinado a ser um dos mais importantes álbuns da história do rock. Segue abaixo a matéria:
"No estúdio da Odeon houve tumulto quando chegou este tape de Londres. Técnicos e produtores acotovelaram-se na sala de som para ouvi-lo. Nivaldo Duarte, técnico de gravação, sentiu-se cansado durante a irradiação, porque não conseguia ouvir o disco sem pensar no trabalho minuncioso para a obtenção dos efeitos do LP. Mariozinho Rocha, produtor, conta que mesmo os técnicos mais velhos, imunes à atração da música pop, rendiam-se ao impecável equilíbrio sonoro do Pink.

Uma batida de coração abre e fecha o disco, que promete ser uma investigação - ou apenas um conjunto de algumas ideias sonoras - sobre o lado escuro da Lua.
Depois de muitas intervenções faladas (como locutores de um juízo final) misturadas a ruídos diversos e lentas e plácidas baladas, uma voz conclui como se transmitisse do espaço: 'A face escura da Lua não existe. A verdade é que a Lua é completamente escura'. Ponto final. Voltam as batidas do coração. Mas o ouvinte já foi conduzido por variadíssimas sensações sonoras e provavelmente nem percebeu que seguiu uma única faixa, por mais de trinta minutos. Sem dúvida, The Dark Side Of The Moon será um dos mais importantes lançamentos deste ano de 1973."

sábado, 12 de março de 2011

Félix, Herói de Infância


Quando somos crianças temos a capacidade de transformar meros mortais em verdadeiros heróis, em figuras que exaltamos, e é como se essas pessoas não fossem como nós, e pertencessem a um outro grupo de seres humanos. Como gostava, e ainda gosto muito de futebol, eu tive meus ídolos, muitos. Dentre eles, certamente o maior era o goleiro Félix. Minha admiração por ele era enorme, e passei a considerá-lo um herói em minha mente.
Félix veio para o Fluminense em 1968, e lá ficou por dez anos, até encerrar sua carreira. Gostava de seu porte, admirava suas defesas, que ouvia pelo rádio. Na época poucos jogos eram transmitidos ao vivo pela tv. Era mais comum ver em tape, ou nos programas esportivos. Admirava sua elegância no gol. Normalmente ele se vestia todo de preto, como na foto acima. Usava um elástico nos pulsos e na cintura, e não costumava usar luvas, nem na seleção brasileira, onde ele foi tricampeão em 1970, no México.
Aliás, em 1970 ele chegou a ser criticado por alguns jornalistas, por falhas que teria cometido, como no jogo contra o Uruguai, mas ele fez defesas memoráveis, e sua atuação no jogo mais difícil para o Brasil naquela copa, contra a Inglaterra, foi irrepreensível.
Lembro de muitas atuações brilhantes pelo Fluminense, defesas fantásticas, que as narrações pelo rádio me faziam ficar imaginando seu corpo voando pelo ar para mais uma defesa. Por tudo isso Félix se tornou um mito, um herói na minha imaginação de criança.
Félix hoje vive em São Paulo, e pelo fato de ter sido o goleiro do Tri no México, é sempre lembrado, e solicitado a dar entrevistas e depoimentos. Isso o ajuda a nunca ser esquecido.
Por tantas lembranças que guardo dele dos meus tempos de criança, ele será pra sempre meu grande herói das quatro linhas.

sábado, 5 de março de 2011

Show de Gilberto Gil e Jackson do Pandeiro - 1976


No dia 20 de setembro de 1976 Gilberto Gil subiria ao palco do Teatro Gláucio Gil, em Copacabana, para fazer uma participação em um show de um de seus ídolos de infância e adolescência: Jackson do Pandeiro. Com certeza, deve ter sido um show histórico, assim como os outros dois que se seguiram, sempre às segundas feiras, na temporada que Jackson fez naquele teatro, tendo como convidados Dominguinhos e Jards Macalé.
Sobre o encontro de Gil com Jackson, o Jornal de Música nº 24, de outubro de 1976 fez a seguinte matéria:
"Convidado especial na estreia do show de Jackson do Pandeiro no Teatro Gláucio Gil, no último dia 20, quando estiveram juntos pela primeira vez em um palco, Gilberto Gil fez uma breve análise da importância de Jackson na MPB e, especialmente, em seu trabalho.
'Quando eu era menino, ficava escutando ele no rádio e pensava: um dia vou cantar como esse cara. Eu tenho um balanço parecido como dele.' O ouvido atento e curioso de Gil, que o levaria a percorrer diversos caminhos dentro da música, não apagaria contudo a marcante influência de Jackson. A tal ponto, que o próprio Gil hoje reconhece que nem Luiz Gonzaga o marcou tanto musicalmente.

- A grande importância de Jackson – explica Gil – é que ele é um dos chamados definidores cíclicos da MPB. Ele introduz o coco, a malandragem nordestina, enquanto Luiz Gonzaga traz o baião, que tem suas raízes no sertão, na caatinga, no country nordestino. Luiz é rural, e Jackson urbano. São, enfim, duas faces de uma mesma moeda, expressões máximas da música do Nordeste. Na minha formação, os dois são fundamentais, só que eu tenho mais mais parecença com Jackson. "Suingo" igual a ele. De Luiz eu trago uma carga empática maior, pelo volume da obra dele, que é um empreendedor, uma figura mais política.
- Quando Luiz Gonzaga apareceu – é Jackson que intervém – cantando baião e essas coisas, eu pensei, minha mãe cantava umas coisas mais temperadas. Aí, em vez de seguir o Luiz, vim para o coco, maracatu, forrozada.
- É, você é mais beira de praia – prossegue Gil -, mais dendê. Gonzaga é mais agreste. Você é um diletante.
- Peraí – espanta-se Jackson – assim você tá me esculhambando. Que diabo é diletante?
- É um cara que faz as coisas por prazer – tranquiliza Gil.
- Ah, aí tá certo. Eu sou isso mesmo – conclui Jackson.”

sexta-feira, 4 de março de 2011

Chico Buarque Análise Poético- Musical: Discordância


Em 1984 foi lançado pela editora Codecri, que era ligada ao jornal O Pasquim, o livro "Chico Buarque Análise poético-musical", de Gilberto de Carvalho. O autor faz um estudo analítico da obra de Chico, como o próprio título do livro define. Trazendo o prefácio do produtor e poeta Hermínio Bello de Carvalho, que por sinal, lhe dá uma boa credencial, o livro oferece um bom material para quem pretende vasculhar a obra de Chico Buarque, seja para alguma tese ou simplesmente para melhor entender a obra do retratado, como foi meu caso ao comprar o livro. O autor demonstra ser um estudioso da obra de Chico, como ele mesmo deixa claro na contracapa do livro:
"Este livro foi escrito tendo como base algumas palestras feitas por mim sobre a obra de Chico Buarque, o compositor. Confesso que reescrevi o livro tantas vezes quantas foram as minhas perplexidades ao tentar investigar a obra e o artista. Cada vez que me detinha a analisar uma letra de música sua, mais riqueza descobria, mais detalhes sutis encontrava. Como a incrível capacidade de colocar em cada sentença, em cada frase, em cada contexto o que Flaubert chamava de 'le mot juste' (a palavra justa)"

Dividido em três partes, onde se destacam "o feminino em Chico Buarque", "Chico Buarque e as Cantigas de amigo", "letras e comentários críticos", etc, o livro destaca as principais letras, que são analisadas e esmiuçadas, como também aconteceu em outras obras posteriores. Um fato que depõe contra o livro, principalmente por se tratar de um autor que estuda e analisa o texto poético de Chico, são alguns erros que aparecem em trechos de letras, como por exemplo:
"... e também pra me perpetuar em tua escrava
que você pega, esfrega, mas não lava" (Tatuagem)
Faltou a palavra "nega" após "esfrega"

"e me arrastei, e te arranhei,
e me agarrei nos teus cabelos,
no teu peito, teu pijama,
nos teus pés, atrás da cama (Atrás da Porta)
Em vez de "atrás da cama" é "ao pé da cama"

"...Se acaso me quiseres
Sou dessas mulheres que só dizem sim,
Por uma coisa à toa,
Uma noitada boa,
Um cigarro, ou botequim" (Folhetim)
O correto é "Um cinema, um botequim" e não "Um cigarro ou botequim"

"Já passou, já passou
Se você quer saber
Eu já curei, já curou..." (Já Passou)
O correto é "Eu já sarei" e não "Eu já curei"

Por meu exemplar se tratar de uma 3ª adição, esses erros já poderiam ter sido corrigidos. Também existe um ponto de discordância entre mim e o autor. Não se trata de um erro, como no caso das letras, mas apenas um conflito de opiniões. Ao analisar a letra de Amor Barato, do disco Almanaque, o autor faz o seguinte comentário:
" Amor Barato é a música mais fraca do LP Almanaque. Contrariando um hábito antigo, que era fazer long-plays com todas as músicas de excelente nível, o compositor Chico Buarque vem colocando, de uns tempos pra cá, nos seus últimos LPs, uma ou duas músicas bem abaixo do seu padrão (afinal, ninguém é de ferro, e nenhuma fonte é inesgotável, dirão alguns de seus intransigentes admiradores).
Com efeito, os versos 'Eu queria ser/Um tipo de compositor/Capaz de cantar nosso amor modesto' me soam tão mal como se fossem versos em que o jogador Zico dissesse que gostaria de ser um perna-de-pau, jogando uma bola de meia."
Eu discordo frontalmente dessa opinião. Amor Barato é um samba inspirado, na melhor tradição de seus sambas. Melodia agradável, de seu parceiro Francis Hime, e uma letra bem feita, bem construída, que em nada compromete sua obra poética.
Mesmo assim, "Chico Buarque Análise poético-musical é um bom livro.

quinta-feira, 3 de março de 2011

Maestro Julio Medalha Fala de Frank Zappa


Em meados dos anos 90, foi lançada uma revista especial sobre Frank Zappa. A revista Top Music resolveu dedicar-lhe uma edição especial, o que pode ser considerado um fato raro na imprensa brasileira, já que Zappa nunca foi um artista dos mais populares, apesar do grande prestígio e reconhecimento que conquistou entre os "intelectuais do rock", como dizia o dj Monsieur Limá. Sendo assim, não se trata de um astro que promoveria uma grande venda de revistas. A iniciativa corajosa foi excelente, e "Frank Zappa Vida e Obra" é uma revista para qualquer admirador desse músico visionário e genial guardar para sempre.
A revista traz curiosidades, frases, discografia, depoimentos, letras traduzidas, etc. Traz ainda uma entrevista com o respeitado maestro brasileiro Julio Medalha, que estudou música com Zappa na Alemanha nos anos 60. Segue abaixo trechos dessa entrevista:

Como foi sua convivênvia com Frank Zappa?
Julio Medalha - No começo dos anos sessenta eu fui para a Alemanha estudar regência sinfônica, na escola Superior de Música da Universidade de Friburg. Fica em uma pequena cidade ao sul, perto da floresta negra, um lugar muito bonito. Lá se reuniam os principais nomes da música contemporânea europeia e também norte-americana. E lá havia um jovem rapaz de cabelos curtos, bigodinho simples e tal. Um cara modesto, que falava pouco. Era norte-americano e chama-se Frank Zappa. Eu tive um contato muito bom com ele.
Fale sobre isso
- Ele demonstrava um conhecimento muito grande de todos os tipos de música possíveis e imagináveis. Sabia tudo. Sabia o que era Canto Gregoriano, Beethoven, Stockhausen, conhecia tudo de música pop. Countie Basie... sabia tudo. Absolutamente uma formação gigantesca, um homem de grande conhecimento técnico, que naquela época tinha como pretensão fazer uma carreira na música pop.

Como era Frank Zappa como ser humano? Fora o talento musical?-
- Ele era um sujeito que... o norte-americano de uma forma geral tem um compromisso tão grande com o profissionalismo, que quando está num lugar com esse propósito não consegue se soltar muito. Ele era assim. Também muito simples e modesto. Quem conheceu o Frank Zappa naquele período sabia que ele ia fazer um grande trabalho. Era um sujeito sem arrogância, até humilde para quem tinha tanto talento.


O senhor aprendeu alguma coisa com FZ?
- O que nós achávamos curioso nele era exatamente essa questão de ser um músico que em princípio queria fazer uma carreira com música popular, mas estava no meio do mais avançado antro da música clássica. Quer dizer, ali era um local de discussão das ideias da chamada música de concerto e, no entanto, tínhamos um músico pop ali dentro.
Qual é, na sua opinião, o maior legado que FZ deixou para a cultura?
- A visão crítica que ele teve do seu tempo e a excelente qualidade técnica de sua música. Foi um homem importante na área musical artística, na área técnica, com visão social aguçada e irônica de seu país. Esse cara não morre.

terça-feira, 1 de março de 2011

Tá Na Moita o Tartamudeio


Desenhar sempre foi uma forma pela qual eu sempre gostei de me expressar. Com o tempo, fui desenvolvendo diferentes formas de usar o desenho como uma maneira de expor meus pensamentos, ou simplesmente usá-los de uma forma meramente estética, simples e objetiva de expressar esse tipo de aptidão.

Pensando nessas diferentes formas de me expressar através do desenho é que elaborei um projeto que um dia pretendo levar adiante. Penso em trabalhar as diversas vertentes de expressão que venho desenvolvendo, através de uma exposição que reúna vários de meus desenhos, que eu denominaria de "Tá Na Moita o Tartamudeio". Alguns dos desenhos que seriam expostos estão aqui representados, e que ilustram as diferentes formas com as quais trabalho, e que vão desde formas geométricas feitas a mão, por computador, figuras de expressões humanas, etc.

"Tá Na Moita o Tartamudeio", traria os diferentes estilos em que trabalho, de forma a abrir um leque que venha abranger as fases de meu trabalho gráfico, desde os desenhos simples de expressões humanas, até aqueles que unem texto e desenho num só trabalho.

Juntar todas essas diferentes fases será um trabalho prazeroso, apesar de um tanto cansativo, porém recompensador, pois é sempre positivo reavaliar sob um novo olhar, agora de um ponto de vista mais amplo, que dará um foco menos pessoal, e mais aberto a uma visão alheia, as diferentes formas de expressão que meu trabalho gráfico vem abrangendo em todos esses anos.

Sendo assim, "Tá Na Moita o Tartamudeio" procurará ser uma mostra de tudo que venho criando no aspecto gráfico nesses anos todos. Será uma forma de exprimir através de diferentes técnicas, mas sempre carregadas de uma liberdade formal, que é justamente o que denota o prazer de criar, que á a forma mais contundente de exprimir a criação, no sentido mais pleno de seu significado.

"Tá Na Moita o Tartamudeio", será portanto, uma forma expor e de me expressar visualmente, e através dessa expressão, buscar um novo modo de colocar ideias, usando prioritariamente o aspecto visual, e assim buscar reflexões, mesmo que elas se apresentem de diferentes e heterogêneas formas (o que também seria um objetivo da mostra), ou mesmo não acarretem nada além de algo para se ver, observar, e simplesmente desaparecer após os olhos se afastarem das ilustrações expostas.