Palavras Domesticadas

Palavras Domesticadas

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Bob Marley no Brasil - 1980


Em 1980 Bob Marley esteve no Brasil. Mas não veio para cantar, e sim uma viagem à convite da gravadora alemã Ariola, que era quem passaria a lançar seus discos por aqui, e estava se instalando no Brasil. Marley fez contatos com músicos locais, talvez tenha experimentado a "ganja" brasileira, jogou futebol - uma de suas paixões - no campo de Chico Buarque, enfim, conheceu nosso país e alguns de nossos artistas, principalmente os contratados da gravadora Ariola, como o próprio Chico, que havia trocado a Philips/Phonogram pela nova gravadora. Dentre outros contratados da Ariola também estavam Moraes Moreira, Marina Lima (que na época era só Marina) e Alceu Valença.
No Brasil, Marley também participou de festas promovidass pela Ariola, ao lado de seus astros brasileiros, como a registrada nessa foto, que foi publicada 8 anos depois, no dia 13 de março de 1988 na coluna Rio Fanzine, do jornal O Globo, relembrando sua passagem por aqui, acompanhada do seguinte texto:
"Viramos a ampulheta um pouco no tempo. Caímos em 1980, quando um famoso músico jamaicano nos visitou. Naquela época, o reggae ainda era pouco conhecido/divulgado por aqui, embora lá fora ele já estivesse influenciando algumas cabeças brilhantes e fazendo com que conceitos musicais fossem revistos.
Sua visita teve como 'desculpa' o lançamento de sua nova gravadora, a Ariola. Alguns, contudo, insistem até hoje que ele esteve entre nós procurando uma cura para um mal aparentemente incurável: o câncer, que lentamente tomava suas forças. Se a segunda hipótese for verdadeira, ela não foi útil, já que pouco depois, num triste dia, ele se foi.
Restou sua música, sua eterna música. Restaram lembranças. Principalmente entre os privilegiados que tiveram a oportunidade de travar um contato, o menor que fosse, com ele. O Rio Fanzine gostaria de de ter puxado uma cadeira e sentado nessa mesa aí da foto.Gostaríamos de ter conversado com Jacob Miller, trocado figurinhas com Moraes Moreira e procurado saber mais coisas sobre a emergente carreira daquela jovem e bela cantora de nome Marina.
Mas acima de tudo, gostaríamos de ter falado com ele. Sobre futebol, sobre religião, sobre poesia e, claro, sobre música. Para o final da noite irmos para casa com saudades. Saudades de Bob Marley."

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Tim Maia Revisitado


Muito boa a iniciativa da Editora Abril, de relançar parte da obra de Tim Maia em cd para ser vendida em bancas de revistas. A exemplo do que foi feito com discos de Chico Buarque, que já alguns meses são lançados quinzenalmente por um ótimo preço - R$ 14,90 - numa edição caprichada com capa original acompanhada de um livreto com dados biográficos do autor, além de comentários sobre o disco, que funciona como um caprichado encarte, agora chegou a vez de Tim Maia.

Os dois primeiros volumes já foram lançados, no caso, os dois primeiros discos de Tim, o de 1970 e 1971, dois petardos sonoros que marcaram o início de sua carreira. A coleção, a exemplo da que abrange a obra de Chico Buarque, não traz toda a discografia, mas uma parte mais significativa, e como na outra coleção, o primeiro volume traz um preço promocional de R$7,90. No caso de Tim a coleção é composta de 15 volumes, sendo que o último traz um histórico e raro disco, o Tim Maia Racional Vol.3, que muita gente até desconhece a existência. A grande questão é que esse disco, que pode ser considerada a cereja do bolo não vai ser vendido, mas sim enviado para quem adquirir todos os 14 volumes anteriores. Em cada cd virá um código que deverá ser enviado para um site da coleção onde o interessado deverá se cadastrar, e após enviados todos os 14 códigos, o Racional 3 será enviado, sem custos para seu endereço. O grande problema é que nem todos os volumes poderão interessar aos consumidores. No meu caso, por exemplo, não vão me interessar os dois primeiros volumes do Tim Racional, já que os tenho reunidos em um único cd, nem alguns cds dos anos 90. Assim, não vou ter direito de ter o Racional 3. Essa estratégia comercial para obrigar o fã a comprar toda a coleção acaba prejudicando aqueles que preferem ter a opção de só adquirirem os volumes de seu interesse.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Albatroz - Um livro Contracultural


Escrever e ver publicado meu primeiro romance - Chicletes & Prazer - me trouxe uma profunda alegria. Os contatos, as pessoas que acabei conhecendo em função do livro, antes e depois de publicado, o retorno que a obra vem me dando, em termos de opiniões, comentários, incentivo, etc, me dão cada vez mais a certeza de que valeu a pena acreditar em meu trabalho. Dentre as coisas legais que Chicletes & Prazer me proporcionou posso citar o contato com outros escritores e a troca de nossos livros. O primeiro a realizar essa prática foi Cesar Rosec, que há algum tempo escreveu uma excelente biografia de Jorge Mautner ( Jorge Mautner em Movimento). Já sabia da existência desse livro, mas só agora ao fazer contato com o autor através desse blog, pude ter em mãos esse livro, que ainda não li, mas ao folheá-lo pude verificar que se trata de uma biografia altamente recomendada para quem aprecia o trabalho de Mautner.
Outra troca altamente gratificante foi feita com o escritor e jornalista Joel Macedo, um grande conhecedor dos movimentos contraculturais dos anos 60 e 70, e que através de seu romance Albatroz - O Encontro das Tribos dos Anos 60, faz um relato dos mais agradáveis de se ler sobre o rock, o movimento hippie e todo aquele clima da era do flower power, unindo jornalismo e ficção de uma forma bastante interessante.
O livro se inicia no famoso festival de Atamont, em dezenbro de 69, quando os Rolling Stones cometeram o erro de contratar uma facção dos Hell's Angels para trabalhar de segurança no festival, o que acabou gerando violência e morte, e sendo um contraponto para a ideia de paz, amor e não-violência apregoado pelo movimento hippie. Em meio ao clima pesado que o evento representou, Carlos, um brasileiro, depois de relutar, aceita a carona de um motociclista conhecido por Jou-Jou Rainbow, e os dois saem pelas estradas, vivendo aventuras, conhecendo pessoas e se envolvendo com toda aquela atmosfera de liberdade que reinava nos anos 60.
A leitura de Albatroz é das mais agradáveis, e a narrativa passa bastante autenticidade pelo fato do autor ter vivido intensamente aquele período, como atesta o perfil do autor na orelha do livro:
"Joel Macedo participou do movimento de imprensa alternativa dos anos 70 no Rio de Janeiro. Atravessou os Estados Unidos por terra em duas ocasiões e viajou pela Europa, norte da África, Ásia Central, Índia e Nepal como correspondente da histórica edição brasileira do jornal Rolling Stone."
Por isso mesmo, sua experiência no jornalismo underground fez com que ele com habilidade e sensibilidade, unisse informação e ficção, ao citar tantas bandas e figuras que marcaram aquela época, em personagens do livro.
Para quem quiser adquirir a obra pode pesquisar no site da Livraria Cultura, que encontrará para venda. É uma viagem que vale a pena.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Revistas Legais - Rock In Especial Janis Joplin


Em 1993 a pequena editora Nova Sampa, que publicava revistas sobre música, lançou uma edição especial de uma de suas publicações - Rock In - sobre Janis Joplin. A revista traz uma biografia da cantora, além de discografia comentada, filmografia, bibliografia e muitas fotos, algumas bem antigas, de antes de sua explosão, que aconteceria inicialmente no festival Monterey Pop, em 1967.
A vida de Janis já é bem conhecida - seus excessos, sua carreira, sua vida conturbada, repleta de álcool, drogas e sexo.
A revista também destaca várias frases ditas por Janis em suas entrevistas, e que servem para traçar um perfil de sua personalidade, como por exemplo:
"Não sei se estou sendo insensível se disser que o blues negro é sempre baseado na 'falta de':'Estou triste porque não tenho mulher nem dinheiro, nem isto nem aquilo'. Não é o que falta que te faz infeliz, mas sim o desejo específico por algo que você não pode ter; é o querer. O que você gostaria que fosse e que te faz infeliz, que traz o vácuo e o vazio. É por isso que eu bebo."
"No palco eu faço amor pra 25 mil pessoas diferentes, depois vou pra casa sozinha."
"Eu vou continuar'rocando', porque se eu começar a economizar pedacinhos de mim desse jeito, cara, não vai sobrar nada pra Janis."
"Vivo para o momento das apresentações, cheia de emoção e excitação, como que esperando por alguém a vida inteira."

Em sua filmografia são destacados o documentário sobre o Monterey Pop; outro documentário: Janis, de 1975, que assisti em 1977 no cinema e nunca mais revi; e A Rosa, que é um filme de ficção, cuja personagem principal , interpretada por Beth Midler, é baseada em Janis.
A revista é bem informativa, e é um bom ítem de colecionador para quem se interessa pela história do rock e do blues, dos quais Janis Joplin foi um de seus mais importantes personagens.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Antônio Bivar e Leilah Assumpção: Vivendo Intensamente os Anos 70


Antônio Bivar e Leilah Assumpção eram dois jovens escritores e teatrólogos brasileiros, que como tantos outros personagens de nossa contracultura, resolveram partir para Londres e para o mundo na época do movimento hippie. Segue abaixo um depoimento de Bivar, e uma carta de Leilah para ele, relembrando já nos anos 90, aqueles anos loucos.
"Estou morando em uma comunidade hippie. Ingleses, americanos, brasileiros, belgas, etc na Cromwell Road, com um grande jardim interno, do tamanho de um quarteirão. Claro, estou aqui de passagem. As pessoas são maravilhosas e estou achando ótimo não ter lugar fixo, pois assim vou conhecendo meio mundo, ganhando experiência e aprendendo cada vez mais. As pessoas são gentis e sinto que gostam de mim. Me sinto em casa. David, o americano amigo de Naná, me chama para irmos de bicicleta até a Lapônia (onde não há noite nesta época do ano, 24 horas de sol, dizem). E da Lapônia, rodar pela Escandinávia.
Talvez vá. Rute e Jorge Mautner me chamam para ficar com eles na Calábria, onde passarão dois meses. Michael, um dos heads da comunidade, me convida para ser seu companheiro numa ida à Índia. Bem que eu gostaria. Mesmo porque, segundo Michael, não custa nada e vai-se de carona. Outros me chamam para ir à Espanha, que dizem ser deliciosa na primavera/verão. A apaixonante Renata Souza Dantas insiste para que eu vá com ela & turma para Formentera, nas Baleares. Naná quer me levar pra Marrocos. Fico contentíssimo com toda essa joie mas acho que vou ficar mesmo é na Inglaterra, que adoro. Toda uma eternidade para conhecer esta ilha e curti-la ainda seria pouco. Mas talvez, who knows, dê uma saidinha de 15 dias."
Antônio Bivar (Diários Ínfimos, Londres, 18/05/1970)

" São Paulo, fevereiro de 1990
Bivar,
A gente queria mudar o mundo, sim. De forma tranquila. Saindo pelas estradas, aos bandos, nós, os jovens, cada vez mais jovens e cada vez mais bandos. Acho que nós conseguimos. Mais do que tantas outras gerações. Antes se vestia a moda "ditatorial". Hoje cada um veste o que quer, mesmo dentro de griffes. Descobrimos a cor. Nas roupas, nas nossas cartas arco-iris, no mundo! A mulher descobriu sua força, o homem, sua fraqueza. Sentimos o prazer sexual fora de uma relação sadomasoquista. Antes, o prazer só vinha com a punição (dez ave-marias e oitenta pais-nossos). Descobrimos a estrada e estivemos em Londres, Marrocos, Nova York, Amsterdã, Índia, Peru, de mochila nas costas, sleeping-bag e caronas. Formentera, 1970. A ilha do Mediterrâneo onde nadávamos nus (foi a primeiras vez que meu bumbum sentiu o sol direto). Em Londres, 70, dormíamos na fila para ver os Rolling Stones (especialmente Mick Jagger). Não esqueço o dia em que você me contou de sua caminhada pelo campo, de ter sentindo muita fome e, aí então ver surgir a macieira carregadas de maçãs vermelhas e brilhantes. Antes, as estradas, as fronteiras e as porteiras eram todas estritamente demarcadas, e vir de Ribeirão Preto (você) ou Botucatu (eu) já era de uma coragem e ousadia transcendentais. E, de repente, o nosso "Bando" transformou tudo num mundo só(...)
Um grande beijo,
Leilah"

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Jorge Benjor na Praia do Farol - 19/02/11

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Assistir a um show de Jorge Benjor é a certeza antecipada de participar de uma grande festa, com alegria, animação e muita energia. É estar diante de um mito e ícone de nossa música. E não foi diferente o que aconteceu na noite de ontem na praia de Farol de São Thomé, em Campos. Jorge Benjor, com sua indefectível roupa branca e óculos escuros, ao subir ao palco, já levantou o público com A Banda do Zé Pretinho, seguido de Santa Clara Clareou. Em seguida Benjor continuou desfilando seus inúmeros e incontáveis sucessos, de seus quase 47 anos de carreira, que completará esse ano. Poucos artistas têm um repertório tão vasto e conhecido, capaz de fazer um show de cerca de duas horas só com músicas de sucesso, capaz de fazer o público não parar de cantar junto e dançar do início ao fim.

Um dado interessante desse show é que de todos dele que assisti foi o que ele mais cantou músicas do antológico disco A Tábua de Esmeraldas, de 1974: Magnólia, Zumbi, Os Alquimistas Estão Chegando, Menina Mulher da Pele Preta e O Namorado da Viúva. Esse fato me levou a lembrar de uma coisa que li recentemente na internet: que há um projeto de Jorge fazer um show com o repertório inteiro do citado disco, uma ideia de fãs, e que só faltava o aval do próprio. Benjor já declarou que A Tábua de Esmeralda é seu disco favorito, e de muitos de seus fãs, como eu. Pode ser coincidência, mas o fato de em seu show ele ter trazido tantas músicas daquele disco, pode ser um indício que ele anda mesmo revendo as músicas do álbum.

O show contagiante de ontem trouxe ritmos como funk, reggae, samba, com muito suingue e balanço, e músicas que todos cantavam junto, como Zazueira, País Tropical, Engenho de Dentro, Que Pena, O Telefone Tocou Novamente, Gostosa, Do Leme ao Pontal - que Benjor passou a incluir em seu repertório numa homenagem a Tim Maia - W Brasil, Filho Maravilha e Alcahol. Aliás, sobre Alcahol, em minha opinião é uma das músicas mais perfeitas que conheço. O ritmo é exuberante, a letra é uma obra-prima e traz um refrão contagiante. É interessante, pois muito se fala que as músicas da fase em que ele assinava como Jorge Ben eram superiores às da fase atual. Eu até concordo, mas Alcahol, já da fase Benjor é uma das melhores músicas que ele escreveu, em minha opinião. Uma música perfeita e todos os sentidos. Outra obra-prima, que exemplifica sua face mística e religiosa, sem ser doutrinária, mas apenas como uma homenagem, é Jorge de Capadócia.
Foi mais um grande show, mais uma noite de festa, um presente de um dos maiores músicos desse país. Salve Jorge!

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Os Clássicos Rock Stars


A literatura-rock sempre me interessou. Livros que contam a história do gênero, num conceito histórico, social, comportamental, estético, etc. Existem ótimos escritores e jornalistas que se preocupam em pesquisar e analisar o que o rock representou e ainda representa como elemento catalisador de mudanças, sejam elas sociais, políticas, tecnológicas, e como fenômeno de massa - os festivais de rock que, principalmente nos anos 60 e 70 ( e ainda hoje) atraiam multidões de jovens para ouvir seus músicos preferidos e interagirem entre si, é uma prova disso.

O livro Os Clássicos Rock Stars, lançado em 1989, em ediçao de luxo - capa dura, papel couchê, formato grande, 224 páginas, traz um ótimo texto do jornalista e pesquisador americano Peter Herring. A obra ainda traz um excelente material fotográfico, fornecido pelo estúdio David Redfern Photography. Sobre o fotógrafo, o livro diz:
"Desde o início dos anos 60, David Redfern tem tido uma carreira vitoriosa como fotógrafo especializado em música, cobrindo os grandes nomes do jazz, rock e blues. Seu trabalho tem aparecido em muitas capas de discos, ao longo dos anos, e atualmente ele é proprietário de um grande arquivo fotográfico, em seu estúdio de Convente Garden, em Londres."

O livro é dividido em vários capítulos, cada qual destacando um gênero ou um segmento de artistas ou bandas, como por exemplo, Superstars (Elvis, Michael Jackson, Dylan, Clapton, Bowie), Supergroups (Beach Boys, Beatles, Doors, Led, The Who, Pink Floyd), Off Bert (The Jam, Blondie, The Clash, Sex Pistols, Frank Zappa), Black Magic (Bob Marley, Ray Charles, Stevie Wonder, Ottis Redding, James Brown) Roots (Buddy Holly, BB King, Chuck Berry, Lou Reed), Great British (Genesis, Roxy Music, Status Quo).

Os artistas e grupos destacados, além das ótimas fotos, têm suas vidas e carreiras contadas, acompanhados de uma discoteca básica. Os textos são bem escritos, e o livro é bastante abrangente, pois destaca não só o rock clássico, como também alguns artistas e grupos que podem ser considerados de menor importância em um contexto histórico, mas que por algum motivo, mereceram do autor algum destaque em sua obra.
Trata-se de um bom livro para figurar na estante de quem se interessa por rock, sua história e imagens.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Arrigo Barnabé - 1981


Por volta de 1980 fiquei conhecendo o trabalho de Arrigo Barnabé, e o que eu ouvi deu um nó em minha cabeça. Era diferente de tudo o que eu já havia escutado até então. Lembro de algumas aparições dele na tv, e o lançamento de Clara Crocodilo, seu primeiro disco. Por ser uma produção independente, não era fácil de se encontrar fora dos grandes centros, mas descobri que um amigo que morava no Rio tinha ou conhecia alguém que possuia esse disco, e então pedi para ele gravar em fita k-7, e assim fiquei conhecendo mais profundamente aquele disco antológico. Hoje já tenho o lp, inclusive autografado pelo próprio, quando da primeira vez que se apresentou por essas plagas (esteve duas vezes). Arrigo continua na ativa, compondo e fazendo shows. Uma amiga de Porto Alegre falou de um show dele que ela assistiu recentemente, onde Arrigo só cantou, a sua maneira, músicas de Lupiscínio Rodrigues. Abaixo, transcrevo uma matéria sobre Arrigo publicada na edição de 4 de agosto de 1981 da revista Careta:
"Quem conheceu Arrigo Barnabé em sua fase de estreia na parafernália do swow-business, lembra bem do garotão speed, elétrico até, comandando com caretas e estranhíssimos timbres de voz as desbundantes apresentações de "Clara Crocodilo". Em dias de maior inspiração, até uma maquilagem de presidiário completava o quadro esfuziante do herói à frente da banda Sabor de Veneno.
Uma fase, sem dúvida. Principalmente se levarmos em consideração o background dessa figura, nascida em Londrina, a 14 de setembro de 1951, sob a auspiciosa constelação de Virgo. Pois é. Arrigo era menino, tímido e, na Escola dos Irmãos Maristas, dava-se melhor com os pretos e japoneses, que tinham um nome estranho como o dele:
- Nunca achei que ia ser músico: eu era péssimo instrumentista e queria ser químico ou inventor.

E foi só após inúmeras idas e vindas, desejos e frustrações, que Arrigo Barnabé começou a pensar em decisões definitivas: leu o "Lobo da Estepe", de Herman Hesse, e largou o catolicismo; leu o Pasquim e entrou numas de produzir um movimento musical paranaense; inebriou-se com o Tropicalismo e chegou a uma conclusão: era necessário haver uma ruptura na linguagem da música popular brasileira.
- O tonalismo estava esgotado, recorda ele, e eu achava que a MPB deveria fugir da consonância, brincar mais com os sons, assim:...
Mas Arrigo, que se educou à base de Béla Bartock, Igor Stravinski, Bach, Beethoven, Shuman, Vivaldi, Chopin e etc, não brincava em serviço e, entre 71 e 72, compôs a primeira loucura, Clara Crocodilo, em parceria com Mário Lúcio. Tempos depois, após uma rápida passagem pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP - mais uma carreira abandonada - Arrigo invadiu a salinha da ECA em que Nélson Ayres tocava piano:
- Boa noite, seu Nélson, eu fiz umas músicas e preciso muito que alguém as grave, quer ouvir?
Não deu outra: Nélson ouviu, gostou e até levou um k-7 para a deusa Elis Regina e César Camargo Mariano escutarem.
A curiosa personagem - "que pode estar roubando algum supermercado, assaltando algum banco ou pode mesmo estar atrás da porta de seu quarto, aguardando o momento oportuno para assassiná-lo com seus entes queridos" - virou até coreografia de dança, uma montagem jovem e louca como ela e como Arrigo.
E para mergulhar no desconhecido e fazer uma música além do trivial variado, Arrigo Barnabé só necessita de uma coisa: rotina, daquelas bem tradicionais, com livro de cabeceira -"sem ler me sinto burro" - e hora para praticar esportes, natação por exemplo. Em suma Arrigo resolveu parar e resume isso numa simples frase:
- Não quero ser estrela, quero saber!

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

1º Lagoa Blues Festival - Julho/2001


Em um fim de semana de julho de 2001, nos dias 21 e 22, aconteceu em Campos um evento marcante para os amantes do blues e do rock, o 1º Lagoa Blues Festival, que aconteceu na localidade de Lagoa de Cima. Naquele sábado e domingo, aquele ponto turístico da cidade recebia várias bandas, para realizar um grande festival de música. Muitas pessoas ficaram direto, em barracas de camping (criando um clima woodstockiano) outras assistiram aos shows e voltaram nos dois dias. A Prefeitura, que organizou o evento, colocou à disposição ônibus que saíam de hora em hora, gratuitamente para levar o pessoal, e depois trazê-los de volta.
A programação incluía no primeiro dia a banda Terceiro Grau, especializada em covers de rock dos anos 70 e coisas mais atuais. A Terceiro Grau abriu a programação do sábado. Embora seu estilo não fosse o blues, serviu para aquecer o público com um bom rock'n roll para todos os gostos.
A segunda atração, que subiu ao palco já anoitecendo, foi a Avyadores do Brazyl, lendária banda do grande Luiz Ribeiro, que nos deixou recentemente. Lembro que a Avyadores fez um grande show, calcada em seu primeiro cd Alguma Coisa Vai Acontecer no 401, que eles haviam lançado recentemente, e alguns covers do sempre competente Luiz, que trazia na formação de sua banda na época Sérvulo Sotto no baixo e João Felipe Veloso na bateria, com a participação de Angelo Nani na gaita.

Em seguida seria a vez de uma boa surpresa da noite, uma banda que eu ainda não conhecia, mas que me impressionou bastante, a Big Head. Trazendo na formação Kleyson na guitarra e vocal, Felipe Capachão, no baixo, Gustavo Vieira na guitarra e Huguinho na bateria, a Big Head trazia um repertório de rocks e blues clássicos, já mostrando uma grande performance e desenvoltura no palco, mesmo com a responsabilidade de ser uma banda estreante e ter subido ao palco após um excelente show dos Avyadores.

A última banda local a se apresentar foi a Blues Band Vidro, uma banda que na época tinha 13 anos de estrada, e trazia na formação Betinho Assad na guitarra e vocais, Fábio Cabelo no baixo e Nelsinho Memeia na bateria. Essa, que foi a formação da Blues Band Vidro durante muitos anos, mostrou competência no palco, com Betinho demonstrando domínio de sua guitarra, que lhe valeu elogios de Victor Biglione.
A Big Allambick, liderada pelo lendário guitarrista Big Gilson foi a primeira atração de fora, e fez um show memorável, tendo Big Gilson dado um verdadeiro show de guitarra em composições próprias e clássicos do blues.
Terminando a noite, Big Joe Manfra, outro grande instrumentista, traria um show de ótima qualidade, mas por ser a última atração, e já bem tarde, tocou para um público um tanto reduzido, mas fechou a noite com um grande show, demonstrando ser um ótimo guitarrista.

O domingo começaria com a banda Rei Midas, de Macaé, trazendo covers de blues e algumas composições próprias, seguidos por Celso Blues Boy, a primeira atração de peso do segundo dia, trazendo um belo show.
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Baseado em Blues, outra das bandas programadas para o segundo dia, apresentou um show de qualidade, que trazia no vocal André Casquilho, um ótimo vocalista, além de um dos melhores gaitistas de blues do país, Jefferson Gonçalves. Outra lendária banda de brasileira de blues subiria ao palco naquela noite: A Blues Etílicos, cujo trabalho é um dos mais reconhecidos no segmento blues do Brasil. Foi um show que entusiasmou a galera, e não deixou o pique cair.

Encerrando o festival, a grande atração foi o guitarrista Victor Biglione, que mostrou ser um dos melhores guitarristas de blues do país. Tocando no formato básico de trio, acompanhado de baixo e bateria, Biglione fez um show pra ficar na memória.
Já não me lembro do repertório, mas não me esqueço que o show foi de arrepiar. Seus solos de guitarra contagiavam o público, e o baixista e baterista não ficavam atrás. Foi um show perfeito para encerrar aquele inesquecível festival. O evento foi todo filmado, e merecia ser apresentado, mas nem sei nada sobre aquelas imagens. Gostaria de poder rever aqueles momentos. Quem sabe, um dia.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Papai É Leão


O desenho acima, intitulado "Papai é Leão", é um dos preferidos de minha lavra, e futuramente fará parte de uma exposição que deverá se chamar "Tá na Moita o Tartamudeio", que por sua vez, faz parte de um projeto pessoal chamado "Há Muito Tempo Eu Vivi Calado, Mas Agora Eu Resolvi Falar".
O desenho foi feito inspirado em um colega de escola quando eu era adolescente. O pai desse colega fazia parte do Lions Club, cujos membros costumavam se chamar informalmente de "leões". Um dia fomos a casa desse colega para estudar ou algo assim, e ele usava uma camisa onde estava escrito "Papai é Leão". Essas camisas foram confeccionadas pelo Lions para serem distribuídas para os filhos de seus membros. Só que essas camisas eram de apelo infantil, e nós já éramos adolescentes, então passamos a zoar com esse colega por causa de sua camisa de criança, e ficávamos o tempo todo repetindo pra ele a frase "papai é leão". Acho até que ele nunca mais deve ter usado aquela camisa, de tanto que nós pegamos no seu pé. Anos depois fiz esse desenho, que à princípio não trazia nada escrito na camisa do personagem, mas me veio à lembrança o fato relatado, então resolvi escrever nela "Papai É Leão", embora a figura do desenho não tenha sido inspirada nesse velho colega de escola. Fica apenas como uma referência das tantas lembranças daquele período.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Zap Comix- O Gibi Que Te Deixa Ligado


Já algumas vezes falei aqui neste espaço sobre quadrinhos underground, destacando mais de uma vez aquele que pode ser considerado o papa dos underground comics: Robert Crumb. Como falei num post anterior, na década de 90 houve no Brasil uma tímida, mas ao mesmo tempo expressiva revitalização desse segmento de quadrinhos, citando, inclusive algumas revistas do gênero que foram publicadas por aqui. Mas volto ao assunto, pois recentemente adquiri um importante livro, com excelente qualidade gráfica e bastante informativo sobre esse segmento editorial de quadrinhos. Trata-se da Zap Comix, que a editora Conrad publicou em 2003.

O livro traz textos bastante informativos sobre a época e as circunstâncias de publicação da Zap Comix, que era uma criação de Crumb, mas que trazia vários outros artistas que produziam quadrinhos na linha underground. O livro destaca outros nomes importantes como Clay Wilson, Rick Griffin, Robert Williams, Manuel Spain, Victor Moscoso e Gilbert Shelton.
A orelha do livro já evidencia a importância da obra para a contracultura, que invadia principalmente as ruas de San Francisco, na California naqueles revolucionários anos 60, reproduzindo um texto extraído do livro Rebel Visions,de Patrick Rosenkranz:
"Robert Crumb fez a coisa que pôs tudo em movimento. Em dois meses explosivos de febre criativa, ele concebeu e desenhou a Zap Comix, que se tornou o modelo e a inspiração para dezenas de gibis underground que rapidamente a seguiram."

O texto de contracapa também destaca a importância histórica no contexto da revolução cultural e comportamental que se experimentava naqueles anos:
"A história de como uma revista artesanal revolucionou os já agitados anos 60 tornou-se uma lenda. Como prova da importãncia da Zap, nos últimos trinta anos surgiram milhões de artistas, revistas e fanzines inpirados no exemplo daqueles alucinados que um dia resolveram fazer uma revista sem pedir permissão a grandes editores e outras autoridades, e saíram eles mesmos vendendo a Zap pelas ruas de San Francisco. Os efeitos da revista fazem notar não só nos quadrinhos, mas transbordam para a literatura, a música pop, a publicidade e o cinema."
A compilação editada pela Conrad traz todos os artistas aqui citados, em histórias retiradas das Zap Comix originais em seus 14 primeiros números. É uma excelente publicação, que só agora, quase oito anos depois eu adquiri. Valeu a pena.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Eduardo Araújo - 1975


Em 1975, Eduardo Araújo fazia um rock da melhor qualidade. Estava lançando um excelente disco: Pelos Caminhos do Rock, e fazia parte de um grupo de artistas que surgiram na Jovem Guarda, e após o fim do movimento continuaram fazendo rock, de uma forma mais madura e radical. Hoje ele nada lembra o cantor de rock que já foi. Costuma se apresentar com um chapelão de vaqueiro, cantando um country meio sertanejo e chato. Mas seu passado é glorioso, como cantor e compositor que fazia soul e rock de primeira. Não é à toa que na época, a revista Pop fez com ele uma matéria intitulada "Eduardo Araújo Rockeiro de Corpo e Alma":

"Rockeiro que não evolui perde público". É assim que Eduardo Araújo, um cara que, na época da jovem guarda já levantava muita poeira na estrada do rock, explica as mudanças que sua imagem vem sofrendo de uns tempos para cá. "Na verdade, essa mudança começou há alguns anos. Quando o pessoal da Jovem Guarda saiu do iê-iê-iê e entrou na onda da musiquinha romântica tipo dor-de-cotovelo, eu caí fora e comecei a fazer o 'bolero eletrificado', que era uma música muito mais brasileira. E mandei brasa em "Maringá" e "Chuá-Chuá", por exemplo. Depois evoluí bastante tocando guitarra e passei a elaborar novos arranjos. Estou sempre acompanhando o movimento da música que se faz lá fora, mas acho que o nosso rock tem de ser diferente, autêntico."

Para ele, rock não é apenas ritmo, mas toda música que se faz hoje para os jovens. Uma música com mensagem e que pode ser até samba: "O Milton Nascimento é um dos melhores rockeiros do Brasil". Entusiasmado com seu novo show, que já apresentou no Rio e em São Paulo e vai agora para todas as capitais, e com o LP Pelos Caminhos do Rock, que tem até som latino, Eduardo Araújo mostra uma fé inabalável no sucesso do rock brasileiro: "Os rockeiros ainda são perseguidos e têm muitos problemas com a censura. Mas é só a gente resolver certos grilos, e o rock vai estourar de verdade por aqui". Ele acha que, é preciso liberar festivais ao ar livre para o público conhecer os conjuntos novos, já que as gravadoras pouco se interessam por eles.
Provando que acredita realmente nesse trabalho jovem, Eduardo Araújo acaba de fundar a Pirata Gravações Musicais, que vai botar muito rock novo na praça. "Mas é importante também que os músicos simplifiquem os arranjos, fazendo um rockão com raízes brasileiras, que leva o público a participar. Daí pra frente, ninguém consegue segurar o movimento: "A não ser que os rockeiros insistam em continuar agindo dessa maneira, tão desunidos. "Mas a gente precisa dar uma grande força. Afinal, alguma coisa tem de acontecer com a juventude brasileira."

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Preciosidades em Vinil - The World Is A Ghetto - War (1972)


The World Is A Ghetto, da banda War é um dos melhores discos de música negra que possuo. Lançado em 72, o disco traz toda a vibração, ritmo e balanço da black music dos anos 70. Conheci o War através da música The Cisco Kid, que abre o disco. Muitos anos depois o encontrei em um sebo, e mais por causa dessa música levei o álbum, e depois, o ouvindo todo, vi que havia adquirido um grande disco.
No livro 1001 Discos Para Ouvir Antes de Morrer, The World Is A Ghetto muito merecidamente é incluindo na lista, e recebeu do crítico Tim Sheridan o seguinte comentário:
"No início dos anos 70, viver numa cidade, nos Estados Unidos, era uma experiência dicotômica, especialmente em Los Angeles - onde os sonhos de Hollywood contrastavam de forma gritante com a realidade do cotidiano das crescentes comunidades latinas e afro-americanas. A divergência de culturas criou um estado de tensão (os distúrbios raciais em Watts, em 1965, ainda doíam na memória coletiva), mas também proporcionou um terreno fértil para a música, no qual surgiram bandas como Sly And The Family Stone e War.
O War, uma convergência de jazz, funk, rock e influências latinas, tinha feito sucesso com "Spill The Wine", um single que contava com Eric Burdon, ex-líder dos Animals. Os sete integrantes do War seguiram em frente e gravaram dois álbuns muito promissores. Mas foi em The World Is A Ghetto que a banda utilizou todo o seu pontecial. O título sugeria uma manifestação política pública, mas a capa de Howard Miller transmitia a vibração iluminada do álbum - a ilustração mostra um Rolls Royce com um pneu furado, preso no gueto. De fato, "The Cisco Kid", com seu sabor latino (uma homenagem irônica ao herói do cinema dos anos 50), e a funky "Were Was You At" são totalmnte apolíticas, num tom muito mais de celebração da vida do que de proselitismo. Mesmo as letras da faixa-título trazem a mensagem otimista de um amor nascido do smog da cidade.
A extraordinária reação positiva do álbum (foi o mais vendido de 1973) mostra que o War soube traduzir a experiência urbana. A banda continua a fazer sucesso ao longo da década, mas Ghetto ainda é seu trabalho mais coeso e satisfatório."

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Erasmo Carlos & A Bolha - Uma Parceria Arrasa Quarteirão (1977)


Em 1976/77 Erasmo Carlos vivia uma ótima fase em sua carreira. Havia lançado há pouco tempo seu excelente disco A Banda dos Contentes, e havia se juntado à banda A Bolha em uma parceria que resultou em uma memorável série de shows, como atesta o anúncio acima. Em sua edição de fevereiro de 77 o Jornal de Música em sua sessão Ao Vivo, em que se comentava os shows da época, o crítico Guerra escreveu sobre essa parceria sob o título “Erasmo Carlos, festa de arromba”:
“Pela primeira vez na história do showbizz carioca o inesperado aconteceu: um show de rock bem produzido, bem iluminado e com pique. “A Bolha e seu crooner Erasmo Carlos” (segundo o próprio Erasmo) botaram pra derreter na sala Corpo Som do MAM (Rio). Apesar de seus 35 anos (a mesma idade de John Lennon) Erasmo mostrou ser muito mais jovem que muitos roqueiros desta Guanabara poluída.

Seus velhos sucessos como Minha Fama de Mau, Festa de Arromba, e Vem Quente Que Eu Estou Fervendo foram apresentados com uma garra e um drive tão fortes que era impossível ficar parado pelos cantos. Eu dancei, pulei, gritei até quase cair de quatro. A Bolha demonstrou mais uma vez ser o melhor grupo de rock das quebradas. É só a rapaziada ter o que tocar que o som rola mesmo. Pedro Lima mostrou ser o nosso Keith Richards até na aparência. Sua guitarra-base foi da maior responsabilidade ao lado do piano de Rubinho, os dois formaram um wall-of-sound à la Phill Spector que segurou o baixo de Lincoln e a guitarra de Marcelo Orelha nas variações com a maior eficiência. Se o show fosse gravado em disco, Erasmo Carlos & A Bolha seriam o nosso Rock'n Roll Animal.”
Obs: Rock'n Roll Animal é um antológico disco ao vivo, gravado por Lou Reed em 1974. Se o crítico compara o show de Erasmo & A Bolha com o disco de Lou Reed, é porque foi mesmo arrasador.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

O Que É Pop?


Recentemente, ao assistir ao documentário “Uma Noite em 67”, que comenta e mostra cenas do festival de música da Tv Record daquele ano, vi uma cena de bastidores em que Caetano Veloso, que participou daquele festival com Alegria, Alegria, numa entrevista define sua música como uma composição pop. O entrevistador então pede para Caetano definir o termo “pop”, já que essa palavra ainda era nova em nosso vocabulário. Caetano então diz que pop era tudo ligado a fenômenos de massa, como era o caso em sua música da citação da coca-cola e personagens populares como as atrizes Brigitte Bardot e Claudia Cardinalli.

Com o tempo, o termo foi se popularizando, principalmente após a difusão da “pop-art” e da expressão “música pop”. Com relação à “pop-art”, lembrando a definição de Caetano, o que se fazia principalmente era transformar imagens de objetos e pessoas que se faziam presentes no cotidiano das pessoas (portanto, fenômenos de massa) em objetos de arte. Andy Warhol, por exemplo, transformou a embalagem de um produto que era largamente consumido em supermercados em um de seus quadros, caso da Sopa Campbell's. Algumas figuras públicas, cujos rostos eram constantemente mostrados pela mídia também eram retratados por Warhol, como Marlilyn Monroe, Elvis, Mao Tsé Tung, Beatles, Mick Jagger, Muhhamad Ali, Elizabeth Taylor, etc. A partir de fotos, as imagens eram reproduzidas, se usando técnicas de sombreamento e uso de cores, e viravam objetos de arte. Outro artista da escola pop, como Roy Lichtestein utilizava imagens de histórias em quadrinhos, também outro fenômeno de massa, para utilizar em sua obra. Mais tarde o termo passaria também a denominar outros segmentos de arte, como “cinema pop”, “literatura pop”, etc.

Com relação à música pop, é interessante notar que o termo, ao longo dos anos foi mudando de conotação. Nos anos 60 e 70, “música pop” era muito usado para definir um som mais experimental, algo como o som de Jimi Hendrix, Grateful Dead, grupos psicodélicos em geral, etc. Lembro que um amigo que tinha um conjunto de baile nos anos 70 uma vez comentou que no contrato para tocar em um clube da cidade havia uma cláusula que estabelecia ser “proibida a execução de música pop”. Ou seja, nada de música mais elaborada, e sim músicas mais populares, para se dançar.
À partir dos anos 80, a definição de música pop foi se modificando, e hoje quando se diz que determinado trabalho é pop, equivale dizer que é um som mais voltado para uma vertente mais popular e comercial, de melodia fácil e instrumental padronizado para se atingir uma ampla faixa de público. Às vezes quando nesse espaço reproduzo alguma matéria com uma banda dos anos 70, e seu trabalho é definido como pop, fico imaginando o estranhamento que deve causar a quem não é habituado com a antiga conotação. Com relação à origem da palavra, reproduzo uma matéria publicada em uma revista no fim dos anos 70:
“Há quem diga que o termo pop tem uma origem das mais simples, como convém, aliás, à sua rápida divulgação na linguagem: ele se origina do anúncio do 'popcorn', nossa pipoca, largamente consumida pelas massas americanas. O 'corn' foi engolido, e ficou apenas pop. A ser verdadeira essa hipótese, vemos que pop é a expressão diferente que todos esperavam estar à espera. Ela resulta do consumo em massa. A massa de alimentícios e de publicidade que nos entra pela boca e pelos olhos, num crescendo que muitos pensadores do nossos tempos acham vá tornar-se insuportável.”

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Paulinho da Viola Poeta


Muito já se analisou e se discutiu sobre a questão poesia/letra de música. Embora muitas letras sejam pura poesia, alguns teóricos consideram que tecnicamente são duas categorias distintas. Letra é letra, poema é poema. Muitos dos próprios autores endossam essa tese. Isso não significa que um texto que nasceu poema, ao ser musicado deixe de ser um poema para virar letra. A verdade é que poucas vezes vi casos em que músicos que também são letristas tenham mostrado um texto meramente poético, que não nasceu para ser musicado. Por exemplo, nunca vi um poema de Chico Buarque, Caetano ou Gil, por exemplo, embora até acredite que eles tenham feito alguns, que não nasceram para ser musicados. Uma das excessões que me lembro no momento é Cartola, que uma vez na tv recitou um belíssimo poema de sua autoria. No caso daqueles que são somente letristas, e só trabalham com o texto, conheço vários poemas de autores como Aldir Blanc, Cacaso, Abel Silva, Paulo César Pinheiro e outros.
A exemplo de Cartola, outro sambista que apresentou um belo poema, que nasceu como poema, e assim ficou, por não ter sido escrito para ser musicado, foi Paulinho da Viola. Em 1976 ele lançou simutaneamente dois discos: Memórias Cantando e Memórias Chorando - o segundo, um disco instrumental somente de chorinhos de sua autoria. No encarte de Memórias Cantando aparece um belo poema de Paulinho, chamado Memória:


De onde vem esta memória, revelando mundos/revirando tudo, como se fosse um tufão?/A varrer, cuspindo entulhos/num erguer e demolir de muros/Nas esquinas e despovoadas ruas de meu coração?/De onde vem essa memória/às vezes festa, às vezes fúria/num abrir e fechar de portas/louca procura de respostas, mistura de murmúrios/fonte de delícias e torturas?/Onde anda agora essa memória?/No mundo da lua, brincando de soltar subterfúgios/a ficar na rua, se fazendo de surda e me deixando assim/um dia, um ser perdido em lutas e outro/um pobre menino a flutuar sonhos absurdos/Onde anda essa memória?/a que horas chegará, como sempre, obscura/com suas preciosas falhas/que recolho agradecido/para traçar o rumo de minhas canções?/Velhas estórias, memórias futuras?/Sei de onde vem, já sei por onde andou/saiu para de trocar de roupa, não pode andar nua/Amo o oceano que retém no fundo/os mistérios de sua natureza

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Egberto Gismonti - Matéria Revista Ele Ela


Egberto Gismonti sempre foi para mim, um músico que me chama a atenção, não só por sua musicalidade, como também por suas ideias e pensamentos. Dentre tantas matérias antigas sobre ele que guardo até hoje, há uma da revista Ele Ela, que acredito ser do fim dos anos 70, e que traz muitas frases interessantes ditas por ele, ao longo de uma entrevista. Vou citar abaixo algumas dessas frases:
"Faço a música que quero com a técnica que consegui."
"Felizmente descobri a tempo que não deveria ser um intérprete. Não era mais o meu negócio depois de me conscientizar da possibilidade de compor. Aos trancos e barrancos terminei o curso, apesar das reações dos professores levados à loucura pelos meus acordes que os faziam lembrar o jazz ou o samba. Fui mudando de professor três vezes, mas isso não me inibia. Apesar de tocar de ouvido, eu deveria ser muito bom aluno. A diretora do Conservatório chegou a dispensar meu pagamento das mensalidades."
"Não estou preocupado com música. Estou preocupado com a história que se vai contar usando a música como como linguagem. Estou preocupado em motivar as pessoas a ouvir música e compor."

"Criatividade é a capacidade de trabalhar sobre águas nunca dantes navegadas. Coitado de quem se preocupa em trabalhar sobre o óbvio. Eu estou voltado para a energia das pessoas."
"O rock abrange todo tipo de gente. É uma música sem preconceitos como é sem preconceito o garoto que tem hoje 15 ou 20 anos. Eles gostam de mim e do Cartola. Será que há algum mal nisso?"
"O Brasil é um país colonizado, mas também é colonizador. A Bossa Nova tomou o mundo. O Tom Jobim está aí até hoje nos Kojaks e Barettas(séries de tv da época) da vida. Cheguei na Romênia e no saguão do hotel souberam que eu era brasileiro e imediatamente arriscaram um I Like Tom Jobim. A brasilidade está no Brasil e fora dele.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Cara de Cão


A revista Rock Stars era especializada em rock, e circulou nos anos 80. Trazia sempre informações sobre as bandas que se destacavam naquela década, e também apresentava sessões e matérias sobre bandas antigas. O número 18, de junho/julho de 1986 por exemplo, trazia dentre outras matérias, uma sobre os 15 anos da morte de Jim Morrison. Como todas as revistas, também havia uma sessão de cartas de leitores (naqueles tempos pré-internet eram cartas mesmo). O que me chamou a atenção nesse número da revista foi uma carta, que reproduzo abaixo, conforme foi publicada:
"Prezados amigos do rock. Eu queria que minha probidade fosse colocada na revista Rock Stars. Eu quero dizer que sou o cara de cão. Eu falei para minha família e irmão. Que eu sou o cara de cão ninguém acreditou. Eu quero falar pra vocês da ROCK STARS que eu sou o cara de cão podem acreditar.
Observ. - Escutem a música do cantor Roberto Gil. É esta música. Obser. - Pessoa me afasta. O cantor Roberto Gil canta sempre este sucesso aqui no Amapá. Faz muito sucesso. Eu ligo o rádio às vezes encima desta música - Pessoa me afasta. Eu fico confiadão, assustado então eu sou o cara de cão.
Sabe Diretor da Rock Stars eu sou esquisito, eu sou separado do meu lar. Observ. - segundo os Técnicos eu fui o único jovem que sofreu de tristeza em 1984. Neste ano, os demônios se enrolaram durante a noite na minha rede de dormir. Eu enxergava eles dançando. Eu sou também visionário de vez em quando eu enxergo fantasma à noite às vezes eu sou Excêntrico.
O cão é meu guia, a gente vê ele. Eu estou com o cão nas pernas não dá pra ver. Isto é meu e não sai de mim. Eu vou na igreja rezar para meu guia. Sabe Diretor da ROCK STARS eu vou sempre na umbanda. Eu vou rezar com mulher espírita na umbanda.
Quando eu dormia Diretor eu soltei um gemido de cachorro pela boca. Eu fui esticar as pernas e soltei um gemido de cão pela Boca. Os cachorros de minha comunidade de vez enquando latem sabem porquê? Porque o meu espírito penetra no deles. Eu sou um metaleiro cara de cão podem acreditar. Eu estou reinando aqui em Macapá. Eu tenho voz de cantor, um bom tom, eu tenho muitos fans. Se vocês quiserem telefonar para mim. Observ. Fone 632-6330. Se caso telefonarem, telefonem de manhã cedo às 9 às 10 horas da manhã eu só faço me levantar da rede."

A música de Gilberto Gil (e não Roberto) que ele chama de Pessoa Me Afasta é Pessoa Nefasta. Espero que ele já tenha melhorado.

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Fica A Seu Critério


Esse poema concreto foi feito a partir dessa frase, que ouvi quando me apresentei em um trabalho, e no meu primeiro dia, por desconhecer certos procedimentos perguntei a um colega sobre uma porta, se eu devia deixá-la aberta ou fechá-la, e ele me respondeu: "Fica a seu critério". Depois fiquei reciocinando sobre essa frase, que pode ter um caráter dúbio. Pode ser uma coisa positiva, por denotar uma liberdade para agirmos da forma que achamos mais apropriada, sem precisarmos seguir uma norma pré-estabelecida, da qual até podemos discordar. Mas também a frase pode trazer um lado negativo, quando somos obrigados a tomar uma decisão, que pode não ser a melhor alternativa, por nossos critérios pessoais não serem os mais apropriados para a situação, e assim cometermos um erro de avaliação.
Pensando na frase, resolvi desmembrá-la, e formar todas as combinações possíveis usando as palavras que formam a frase, trocando a ordem das mesmas. Após ter em mãos todas as combinações, resolvi colocá-las em uma determinada ordem, para compor o poema concreto. Nesse processo, a mensagem implícita na frase original passou a fazer parte da composição do poema, pois "ficava a meu critério" estabelecer uma ordem nas frases que se originaram. O primeiro critério que adotei foi sortear as frases,e ir colocando-as na ordem do sorteio. Porém já na primeira tentativa não me agradou determinada sequência de frases, e achei que um sorteio não seria a melhor forma de agrupá-las em determinada ordem. Depois de pensar um pouco, adotei um critério e acabei o adotando. Se você ler somente a primeira palavra de cada frase verá qual foi o processo que adotei. Adotando esse processo, sobrou uma última frase, que acabou fugindo da ordem que determinei, porém curiosamente, essa última frase tem um sentido lógico, diferentemente das demais, cuja grande maioria não diz absolutamente nada. Dessa forma, sem querer, o poema passa uma mensagem, como algo que se inicia de forma clara, depois vai se deformando, perdendo o sentido, mas ao fim, recupera a mensagem inicial.