A trilha-sonora do clássico On The Road, livro de Jack Kerouac, é o jazz. Escrito numa época em que o rock ainda não havia estourado no mundo, o jazz era, na época, a música de contestação e uma alternativa musical para aqueles que se ligavam em algo mais vibrante. Por isso, os beats elegeram o jazz a sua música, e no citado livro de Kerouac, considerado a bíblia da literatura beat, esse estilo musical está sempre presente, como nesse trecho:
"O sax alto estava nas mãos de um luminoso jovem negro, estilo Charlie Parker, um garotão de dezoito anos, bocona escancarada, mais alto que os outros, e grave. Ele ergueu seu sax e gemeu calma e pensativamente, extraindo frases como pássaros, como se fosse o próprio Bird Parker, e deixando-as suspensas com a lógica arquitetônica de Miles Davis. Era herdeiro dos grandes inovadores do bop.
Outrora fora Louis Armstrong mandando ver nos lamaçais de Nova Orleans; antes dele, os músicos loucos que entravam na paradas, aos feriados, e desfaziam as marchas marciais transformando-as em puro ragtime. Então surgiu o swing, e Roy Eldridge, vigoroso e viril, quase explodindo seu trumpete ao arrancar dele sonoras ondas de poder, sutileza, astúcia e requinte lógicos - inclinando, com os olhos radiantes e um sorriso encantador, fazendo todo o universo do jazz gingar junto com ele. Então chega a vez de Charlie Parker arrombar a cena; era apenas um garoto morando num casebre de madeira com a mãe em Kansas City, soprando seu sax-alto todo remendado, entre as toras de madeira, praticando somente nos dias de chuva, fugindo vez ou outra para assistir a banda do velho Basie e de Benny Morten, que tinha Hot Lips Page e todo o resto - e então Charlie Parker se mandou de casa e foi para o Harlem encontrar o louco Thelonius Monk e Gillespie, mais louco ainda - Charlie Parker, que na juventude andava em círculos enquanto tocava. De alguma forma mais moderno, mais inovador do que Lester Youg, também nascido em Kansas City, aquele singelo e sombrio bobalhão no qual toda a história do jazz está envolta - porque ao erguer seu sax, retilíneo e horizontal, sempre colado à boca seca e calejada, ele soprava melhor do que qualquer outro; mas à medida que deixava o cabelo crescer ia ficando mais preguiçoso e desleixado, deixando o sax à meia altura; até que ele ficou definitivamente apontado para o chão e hoje, calçando seus sapatos de sola larga para não se desgastar nas calçadas dessa vida, Young o sustenta debilmente, mantendo-o sempre de encontro ao peito, tocando notas fáceis - e, ainda assim, cool. E eis aqui as crianças da noite bop americana."
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