Quando Jorge Mautner lançou seu segundo disco, em 1974, Gilberto Gil, que era contratado da mesma gravadora (Phonogram) escreveu um release sobre o disco, num material de divulgação. O texto é intitulado "Como Gil Vê Jorge", que transcrevo abaixo:
" 1- Jorge Mautner é um homem, forte como um rochedo, claro como a água, leve como o vento, os fios elétricos, a bola de borracha, os buracos da flauta, a sola do sapato, as patas do mosquito, e o palito no meio do pirulito. Jorge Mautner pode ser qualquer coisa, porque ele quer ser qualquer coisa. Tudo. Claro que tudo é tudo e todo mundo é, diria você; mas Jorge realiza, em si, a caminhada para a consciência deste TUDO; e como ele brinca com as pedras do caminho!
2 - Jorge Mautner é uma criança distraída e tola, sua tolice é como a lente potente do telescópio do Monte Palomar; traz as estrelas para perto, para dentro, para o centro do pensar. Pensar tolices do menino numa máquina de ampliar. Assim é como eu já vi Jorge Mautner tantas vezes, a pensar, ele é, não tenho dúvidas; ele é um menino distraído que nos pede para lhe ensinar. Um mestre. Ele é um mestre.
3 - 'Desafinado' foi um manifesto da alma do homem da história daquele tempo-Brasil, anos 50. 'Tropicália' foi um manifesto da alma do homem da história daquele tempo-Brasil anos 60. 'Maracatu Atômico' é um manifesto da alma dos anos 50, 60 e 70, é deste tempo-Brasil, caminho do corpo universal, o espírito de Deus.
4 - O LP de Jorge Mautner tem treze músicas, dele ou de parceria com Nelson Jacobina, um garoto dos sonhos cariocas, de aventura de Ipanema. Tuti Moreno e Chico Azevedo, tocam bateria e percussão, e Jorge, Jacobina, Roberto Carvalho e eu, aparecemos aqui e ali, tocando piano, guitarra, violino, bandolim e violão. Jorge canta tudo com aquele jeito de século XIX e XXI. Eu gosto muito do disco. Ataulfo Alves se deliciaria com 'Matemática do Desejo'. Os sambas são todos lindos, e, 'Ginga na Mandinga', de parceria com o baixista Rodolfo Grani Jr. é uma serpenteira que se desenrola enrolando todo mundo, de João Gilberto a Herbie Hancock. Os rocktosos 'Guzzy Muzzy', 'Rock da TV', 'Cinco Bombas Atômicas' e 'Salto no Escuro' me fazem pensar que afinal pinta uma banda, aqui, tocando e soando como os Rolling Stones e assim mil anos-luz de distância dos Rolling Stones, pra frente ou pra trás. Aliás, o LP, eu tenho um pensamento/síntese: o disco está atrás ou à frente, acima ou abaixo de qualquer crítica. Para uma terra que tem Jorge Ben tinha que pintar Jorge Mautner.
Beijos,
Gilberto Gil
PS: Rodolfo, o baixista, é uma espécie, assim, de Gérson do time, observou Caetano.
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