Thomas Mann (1875-1955) foi um dois grandes nomes da literatura do séc. XX. Autor de grandes obras, teve em "Morte em Veneza", publicado em 1912, seu maior sucesso literário. Mann tinha uma ligação com o Brasil, por ser filho de uma brasileira. Por ocasião da publicação de "Morte em Veneza" em uma coleção de clássicos da literatura editados pelo jornal O Globo, o acadêmico gaúcho Moacyr Scliar (1937-2011), escreveu sobre o escritor à pedido do jornal:
"Em matéria de literatura, Thomas Mann (1875-1955) não pensava pequeno: seu primeiro romance, 'Os Buddenbrooks', escrito aos 25 anos, abarca a trajetória de uma família alemã através de quatro gerações - um vasto painel da burguesia europeia. Grandioso é também o famoso 'A Montanha Mágica' ('Der Zauberberg', de 1924), ambientado num sanatório para portadores de tuberculose, doença então sem tratamento específico e que demandava longas internações. É neste sanatório que o jovem Hans Castorp discutirá as ideias do seu tempo com Settembrini, um italiano humanista, e com Naphta (claramente moldado no intelectual stalinista Georg Lukacs), um raivoso radical. Seguiu-se a trilogia 'José e Seus Irmãos' (Joseph und Seine Brüder), que parte da narrativa bíblica para construir uma história sobre o conflito entre liberdade pessoal e tirania política - o livro foi escrito à época em que os nazistas estavam tomando o poder, o que levou o escritor a exilar-se primeiro na Suíça e depois nos Estados Unidos.
Toda a literatura de Mann reflete os tempos difíceis em que viveu. Nascido em Lübeck, seu pai era um rico comerciante e influente político; já a mãe, Julia da Silva Bruhns, era brasileira, filha de alemão com mulata. O jovem Thomas foi um medíocre estudante. Na verdade, deveria tomar conta dos negócios do pai. Com o falecimento deste, a firma foi liquidada. Antes de recomeçar os estudos, Thomas passou um ano na Itália com o irmão Heinrich (também escritor, autor de 'Professor Unrat', adaptado para o cinema com o título de 'O Anjo Azul') e lá começou a a escrever; à princípio contos, e logo 'Os Buddenbrooks'. Com o sucesso do livro, que vendeu mais de um milhão de exemplares, teve início uma sólida carreira que daria ao escritor o Nobel de literatura em 1929.
Mann e sua esposa, Katia |
Em contraste com as caudalosas obras antes mencionadas, Thomas Mann escreveu duas pequenas novelas que são verdadeiras obras-primas: 'Tonin Kröger' (1902), uma espécie de narrativa autobiográfica sobre a arte, e a famosa 'Morte em Veneza' ('Der Tod In Venedig', 1912), adaptada para o cinema por Luchino Visconti. O personagem principal é o respeitável professor alemão Aschenbach, que, movido por enigmático impulso, decide passar alguns dias em Veneza. No mesmo hotel está hospedada uma família polonesa; e a atenção do professor é atraída por um jovem de incomum beleza, Tadzio. Esta obsessão perturba-o profundamente; a despeito de uma epidemia de cólera, Aschenbach permanece na cidade. Pinta o cabelo e maquia-se, patético símbolo de sua degradação. Doente de cólera, está na praia quando vê Tadzio. Trocam um olhar e logo depois Aschenbach morre.
É fácil ver em 'Morte em Veneza' a história de uma contida paixão homossexual, e talvez ela exista, mas a obra não se restringe a isto. Tadzio é o símbolo da beleza, a beleza que Aschenbach persegue e que, como diz Thomas Mann, não pode ser desvinculada de Eros. Este ideal de beleza associado à paixão é que sustenta a existência do artista. No discurso de aceitação do Nobel, Mann mencionou, como seu santo favorito, São Sebastião, aquele que, com o corpo crivado de de flechas, sorri angelicalmente em meio à agonia. Graça em meio ao sofrimento é, para o escritor, a fórmula maior do heroísmo. O heroísmo que encontramos tanto no escritor que resistiu ao nazismo como no idoso intelectual que, na novela, procura em vão chegar ao ideal da beleza."
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