O blues foi sem dúvida uma grande fonte de inspiração, e uma música que influenciou toda uma geração de jovens músicos que surgiram, principalmente na década de 60, e modificaram o panorama do rock. E o bluesman que mais influenciou esses jovens músicos, foi com certeza Muddy Waters. Waters foi o grande responsável pela eletrificação do blues, fazendo a união com o rock - um casamento perfeito.
Na sessão dominical Rio Fanzine do jornal O Globo, de 18/02/90 o jornalista José Emílio Rondeau fala sobre o lançamento nos EUA, de uma caixa com cinco LPs, cobrindo a carreira de Muddy. A matéria tem por título "Memórias de um bluesman", e segue abaixo:
"O 'caixotão' retrospectivo já deixou de ser novidade há muito tempo e foi até mesmo questionado recentemente quando descobriu-se uma série de desleixos técnicos imperdoáveis em um produto tão caro e pretensamente tão exato na cobertura histórica de uma obra artística - soube-se assim, que boa parte do caixote 'Storyteller', de Rod Stewart, havia sido masterizada a partir de discos em vinil que iam sendo transferidos para a linguagem digital dos compact discs.
Ou seja, um processo perigoso e curto atalho para a desmoralização de um produto nobre e 'sério'.
Entretanto, ainda que tenha passado a novidade e que o caixote tenha entrado na rotina fonográfica, regularmente surgem as gemas raras que fortalecem o prestígio e a função do formato.
É o caso dos caixotes da Chess Records, em geral - compilações individuais de mestres do blues que nasceram para o disco e praticamente passaram toda sua carreira no velho selo de Chicago - e do recém-lançado caixote de Muddy Waters, em particular.
Existiu apenas um bluesman que tenha construído uma obra tão importante por suas qualidades musicais bem como antropológicas, que tenha influenciado sucessivamente gerações de músicos tanto quanto Muddy: Robert Johnson, uma das primeiras influências de Waters.
No entanto, Muddy transcendeu seu mentor no instante em que transplantou-se do delta do rio Mississipi para as ruas de Chicago e eletrificou o blues.
Reunida aqui de forma ampla e compreensiva pela primeira vez (descontada uma coleção anteriormente editada no Japão com 11 LPs), a obra de Muddy é a história da travessia do blues dos campos de algodão do Sul dos Estados Unidos para o asfalto da cidade grande.
Como Robert Johnson, Waters influenciou definitivamente o nascimento de bandas e artistas como os Rolling Stones (cujo nome, como o da revista americana, foi inspirada na canção 'Rolling Stone', de Muddy), Led Zeppelin, Johnny Winter, Eric Clapton, Jimi Hendrix, Michael Bloomfield, Ry Cooder e tantos outros. E ter acesso a essa coleção é quase o mesmo que aprender a história da transformação do blues do campo em rock and roll.
A seleção das 72 faixas incluídas neste caixote engloba das primeiras gravações de Muddy para o selo Chess, no final dos anos 40, até as últimas, em 1972(*), 11 anos antes da morte de Waters.
Os registros da caixa também incluem os anos da decadência (meados dos anos 60) e as homenagens do final da década seguinte ('Who's Gonna Be Your Sweet Man When I'm Gonne', gravada em Londres com os então 'garotos' Rory Gallagher, Mitch Mitchell e Rick Grech).
Não são apenas as dez faixas inéditas ou as raridades que tornam este caixote o mais apetitoso da leva da Chess (que já havia lançado um dedicado a Willie Dixon e outro a Chuck Berry), nem as anotações de fascinante leitura feitas por Mary Katherine Aldin (jornalista e radialista, a quem coube detalhar a vida pessoal de Muddy) e Robert Palmer (jornalista e crítico, autor do ensaio sobre a música de Waters) num livreto de 32 páginas que é obrigatório para quem se interessa, ainda que de passagem pelo blues.
'Muddy Waters - The Chess Box' é o compêndio definitivo da trajetória do blues em todo seu esplendor, com toda a selvageria, com toda a bravata, com toda a luxúria, com toda a urgência que fez a nata do rock dos anos 60 querer ter nascido preta. E, de preferência, com o nome de Muddy Waters."
(*) Pelo que me consta Muddy Waters gravou discos após 1972. Conheço pelo menos um - "Hard Again", de 1976, com produção e participação de Johnny Winter
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