Remexendo em velhos papéis, encontrei uma página de revista, que não consegui identificar qual, trazendo uma entrevista com o grande músico e arranjador Eumir Deodato, que já há muitos anos faz uma respeitável carreira no exterior . A matéria é assinada por Sergio Barbo, e reproduzo abaixo:
"Eumir Deodato é o músico brasileiro mais bem sucedido no showbizz internacional, mas quase um desconhecido em sua própria terra. Na parede de seu estúdio, nos EUA, encontram-se 15 discos de platina, sem contar os 5 milhões de singles para a sua versão para 'Also Sprach Zaratustra (2001)', de Strauss, seu maior sucesso mundial, que chegou ao topo das paradas em 72. Este carioca, filho de um serralheiro português, foi também um dos únicos brasileiros a ganhar um Grammy(*) (os outros são Laurindo Almeida, Sérgio Mendes e Tom Jobim).
Ele fez parte da primeira geração de bossa-novistas, que se reuniam no apartamento de Nara Leão no Rio no final dos anos 50, mas como era muito moleque e não sabia tocar nada, ficou dois anos trancado em seu quarto só estudando música. Saiu de lá dando aulas para Dori Caimmy, César Camargo Mariano, Marcos Valle e Roberto Menescal, entre outros. Depois, produziu a própria Nara Leão, Maysa, Elis Regina, Milton Nascimento e Tom Jobim. Lá fora, seu nome consta em discos de Roberta Flack, Aretha Franklin,, Earth, Wind & Fire, Wes Montgomery, Tony Bennet e Frank Sinatra. Produziu, por exemplo, 'Ladies Night' e 'Celebration', clássicos do Kool & The Gang.
Precursor da discoteca, do acid-jazz, citado e sampleado por grupos de jazz-rap e hip-hop, como Buckshot LeFonque (de Branford Marsallis) e Fun Lovin' Criminals, foi regravado por George Benson, Sarah Vaughan e The Jamer Taylor Quartet . Mas foi a islandesa Björk quem se encarregou de tirá-lo do exílio musical (desde 90, ele é investidor da Bolsa de Valores), através dos arranjos de algumas canções de seu disco, 'Post', de 95. Ele acompanhou a cantora em suas apresentações no Brasil, e depois deu uma esticada para umas férias na praia.
Como surgiu a ligação com Björk?
Ela descobriu que eu havia feito o arranjo de 'Travessia', do Milton Nascimento, então me ligou. Disse que pensou que eu não existia, e se eu gostaria de produzi-la. A minha filha disse que ela era legal, então comprei os discos do Sugarcubes e o solo da Björk, e gostei, achei inovador. Ela me incentivou a voltar, tenho afinidades com a Björk e pretendo fazer mais coisas com ela.
Foi divulgado que vocês não entraram na coletânea 'Red, Hot & Rio' (que reverterá fundos para a pesquisa da AIDS), porque ela não gostou do novo arranjo de 'Travessia'
Ela acha que esta versão não supera a original, mas deve inclui-la em seu próximo disco. O que aconteceu foi que nós fomos maltratados. Eu tive que pagar a estadia do hotel. Um sujeito, que não sabe nem quem é a mãe dele, falou que o arranjo de 'Travessia' estava diferente do original, mas eu fiz o original. Depois, também, cortaram a Gal do projeto... Aí, foi a gota d'água.
E como foi sua ida para os EUA em 67?
Eu estava influenciado por Miles Davis e comecei a fazer uns arranjos difíceis. Mas estava produzindo Leny Andrade e ela não sabia entrar naquelas músicas - eram muito sofisticadas. Aí, fiquei sem trabalho nas gravadoras por causa disso. O violonista Luís Bonfá estava indo para os EUA e me levou junto pra tocar com ele. Então, Astrud Gilberto e Creed Taylor me convidaram para produzir e eu acabei ficando por lá. Mas eu alternava com o Brasil. Assim produzi 'Sabiá' para o Tom Jobim e tiramos umas fitas do Milton Nascimento do baú, uma das quais era 'Travessia'. O Milton já existia, mas era desconhecido.
Você já fazia há 25 anos o que as pessoas chamam hoje de acid-jazz...
As pessoas estão voltando a ter interesse por este tipo de música. Fiz alguma coisa com o Incognito, apesar de não gostar muito deles, e fiquei de fazer algo com o Brand New Havies, que acabou não acontecendo. Esse cara do Incognito, se for para a China vai dizer que gosta de música chinesa. Vem pra cá e diz que gosta de música brasileira. A música brasileira já foi assimilada, e está diluída lá fora. O Herbie Hancock utiliza música brasileira, mas não dá crédito. Todo mundo faz jazz, mas suingado com samba.
O líder do James Taylor Quartet falou que você é um dos heróis dele. Disse que conversou com você há uns dois anos para fazerem um disco juntos...
É mesmo? O americano? É tanta gente que eu converso, que depois nem me lembro.
Não, é o homônimo inglês. Atualmente ele faz um trabalho parecido com o seu nos anos 70. Ele fez uma cover do '2001'.
Agora estou me lembrando (ele anota o nome de James Taylor numa agenda. Agora vou fazer '3001', para ficar na frente deles.
(*) A citação do Grammy, não leva em conta o Grammy Latino, que vários brasileiros já ganharam. Como não há data na matéria, pode até ser que na época, essa categoria nem tivesse sido instituída.
Nenhum comentário:
Postar um comentário