Palavras Domesticadas

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terça-feira, 27 de agosto de 2013

A Cor do Som: Uma Grata Surpresa de 1977 (1ª Parte)

Em 1977 surgia um novo grupo instrumental no Brasil: A Cor do Som. A primeira vez que esse nome apareceu não foi com relação à banda. Na ficha artística do clássico disco Acabou Chorare, dos Novos Baianos, a banda era dividida em subgrupos, dentre eles, um que se chamava A Cor do Som, formado por Pepeu (guitarra), Jorginho (bateria e percussão), Baixinho (bateria e percussão) e Dadi (baixo). Dadi, acabou ficando com o nome, para batizar sua nova banda.
Como eu falei acima, no princípio a Cor do Som era um grupo instrumental. Seu disco de estreia, lançado em 1977 só trazia uma música cantada, a última faixa, que se chamava justamente A Cor do Som. Nos discos seguintes a maioria das músicas seriam cantadas. Na edição de outubro daquele ano, o Jornal de Música trazia uma matéria com  a banda, assinada por Giba Rocha:
"A trajetória da Cor do Som começa nas ruas de Salvador, se amplia nos bailes do subúrbio carioca e emerge do inconsciente de toda uma geração marcada pelas inevitáveis influências de Beatles e Stones. A parafernália rockeira dos anos sessenta, o choro, o baião, o frevo e o samba eletrificados e recompostos pela sensibilidade ardente da moçada que amadurece o som deste final de década. A tonalidade só poderia ser forte, vibrante e sobretudo alegre: A alegria de Mu (teclados), Dadi (baixo), Gustavo (bateria) e Armandinho (cordas), um grupo de jovens músicos (média de 25 anos) que sobreviveu à confusão geral e agora vai à luta de peito aberto.
Muita gente associa o nome do grupo aos Novos Baianos, mas apesar da origem, influências e acasos a Cor tem vida própria: o nome escolhido já pertenceu ao grupo (instrumental) de apoio dos Baianos, mas foi 'cedido por Pepeu', conta Dadi, que durante 5 anos também fez parte da 'família'.
- 'A minha formação musical é de rádio e televisão. Tudo que tocava na época eu fui assimilando. Ficava vendo Edu Lobo, a Elis Regina na TV e me liguei em Bossa, vieram os Beatles e eu já tava na batalha pra comprar o instrumento. Primeiro eu queria tocar bateria, mas depois optei pelo baixo e como todo garoto, fui tocar em bailes com  aqueles grupos de bairros. Quando os Baianos vieram ao Rio entrei em contato com eles. Tava faltando um baixista, eu fui fazer um teste e fui aprovado.'
Mu, irmão de Dadi, cinco anos mais moço, só mais tarde iria ensaiar os primeiros acordes no piano da mãe, mas já olhava com admiração o novo músico da família. Gustavo saiu cedo para a estrada e quando um dos integrantes do Black Foot desistiu da música (era o dono da aparelhagem) para fazer medicina, ele começou a percorrer uma série de grupos cariocas e a alimentar um sonho: tocar com o The Bubble, mais tarde, 'A Bolha'.
- Pois é, saía um baterista e entrava outro, mas eu nunca encaixava. Enquanto isso era um baile depois do outro, tocando de tudo. Foi uma época de muito trabalho e pouco crescimento, mas ao mesmo tempo deu muita corrida, a gente tinha um repertório muito grande, tocava de tudo mesmo, e eu ia adquirindo experiência.
Finalmente veio a esperada chance com A Bolha e um trabalho mais próximo do que Gustavo queria. Em 70, a viagem à Europa para a compra de equipamentos e a passagem pelo festival de Wight, onde os músicos brasileiros se reuniram e tocaram juntos num acontecimento extrafestival. Enquanto isso, na Bahia, Armandinho do Bandolim assimilava as influências paternas e curtia um 'desafilho' (desafio de pai e filho) com Osmar, um dos geniais criadores do Trio Elétrico. Aos 9 anos já desfilava pelas ruas de Salvador incendiando o alucinado carnaval eletrônico do Trio. Aos 15, ganhou a fase baiana do programa 'A Grande Chance' e veio para o Rio, onde ficou com o segundo lugar na grande final nacional e chegou a gravar um disco.
Armandinho voltou para a Bahia, só retornando mais tarde, trazido por Moraes Moreira. Gustavo chegou da Europa, casou e sentiu que 'a barra começava a pesar'. A Bolha andava devagar, trabalhando legal, mas sem garantir o lado econômico da vida nova que começara com o casamento. Gustavo achou que aquele negócio de música era profissão mesmo e em 74 aceitou o convite para tocar com o Raul Seixas. Dadi deixava os Baianos enquanto Mu participava de festivais escolares e tomava aulas de técnica com Homero Magalhães.
Foi a carreira individual de Moraes que uniu os quatro. Gustavo foi chamado para fazer parte do grupo de apoio e quando Moraes gravou o primeiro disco, além de Armandinho, Mu já participava de uma faixa. No segundo LP, fez o disco inteiro. O entrosamento era perfeito e além das carreiras individuais como músicos de estúdio, Dadi e Gustavo passaram a tocar juntos com Jorge Ben. A ideia de fazer um trabalho próprio começou a nascer de conversas, mas ainda não existiam condições de concretizar o plano. Nem tempo, nem meios, lembra Gustavo:
- É a problemática do músico brasileiro. Ninguém acredita, pouca gente dá valor. O músico tem de se sujeitar a ganhar pouco e ainda fica impedido de mostrar o seu verdadeiro trabalho. Trabalhar com artistas consagrados pode ser gênio, acrescentar, fazer a gente criar, mas também existem figuras difíceis, que não estão interessadas no trabalho do músico. Tem caras que só se preocupam com a grana do show, ou quanto vai render o disco.
Além do mais quem iria apostar num disco instrumental, feito por músicos estreantes? Céticos, mas nunca desestimulados, Dadi, Gustavo Armandinho e Mu decidiram que a oportunidade viria naturalmente, sem forçar a barra:
- Era preciso que alguém acreditasse na gente. Não dava pra parar e ficar ensaiando um repertório. Todo mundo sobrevivia de shows e gravações, e a gente não tinha tempo de ficar estruturando um grupo próprio sem uma perspectiva imediata de levar o trabalho adiante. Tinha que ser na confiança.'
(continua)

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