É comum, quando se forma uma roda de samba que não se acerta, o batuque é sem ritmo, a batida não traz aquele molejo típico de uma batucada bem executada, dizer que "tem branco no samba". É uma piada em torno de uma hipotética falta de jeito de alguém que não traga o DNA da negritude para executar um ritmo que nasceu dos negros, se desenvolveu e se difundiu através dos negros. Logicamente, como falei, é só uma piada, já que muitos brancos executam o samba melhor que muitos negros. Está no sangue, independente de raça.
Fazendo uma analogia, o mesmo se poderia dizer a respeito do blues, uma música que nasceu dos negros americanos, que traz toda uma história de dor, sofrimento e lamento dos negros explorados e segregados, que se expressavam através da música que criavam. Pois um branquelo inglês, John Mayall, que não traz em seu sangue a herança racial dos velhos bluesmen americanos, pioneiros do blues, se tornou um grande mestre e um dos nomes mais respeitados do blues, a partir dos anos 60.
John Mayall é também um pioneiro, pois foi um dos primeiros artistas ingleses a se enveredar pelo blues, e revelar muitos músicos. Embora, modestamente, tenha uma vez afirmado: "Não me considero 'o pai do blues britânico'. Houve outros, como Alexis Korner, que tinham a missão de abrir as portas para as pessoas', a verdade é que Mayall revitalizou o blues, e fez muitos roqueiros conhecerem as raízes do rock.
Nos nos anos 60, a segunda geração do rock surgia com toda a força, vários grupos se formavam, aconteceu o fenômeno da britsh invasion, quando vários grupos ingleses passaram a ganhar destaque no meio musical (Beatles, Stones, The Who, The Kinks, Animals, etc), mas os velhos bluesmen americanos estavam esquecidos, e alguns até passavam por sérias dificuldades. Foi necessário que músicos brancos e ingleses, como Mayall, trouxessem um novo e reformulado blues para as novas gerações, para que nomes fundamentais do blues, como B.B. King, Muddy Waters, John Lee Hooker, Howllin'Wolf, dentre outros, voltassem a ser lembrados.
John Mayall herdou sua inclinação musical de seu pai, que tinha uma coleção de discos de jazz, e daí descobriu o blues. Segundo li, Mayall aprendeu a tocar de forma autodidata violão, gaita e piano, e com 22 anos formou seu primeiro grupo, The Powerhouse Four. Mais tarde formaria o lendário The Bluesbrackers, que teve tantas formações, passou por tantas mudanças, que só uma grande e detalhada pesquisa para enumerá-las. Mas para resumir, posso apenas citar alguns músicos que passaram pelos Bluesbrackers: John McVie, Mick Fleetwood, Mick Taylor, Roger Dean, Davey Grahan, Eric Clapton, Tony Reeves, Chris Mercer, John Riseman, Collin Allen, John Mark, Johnny Almond, Harvey Mandel, Larry Taylor e Don Sugarcane Harris.
A alta rotatividade dos músicos de sua banda pode ser explicada pelo rigor com que ele conduzia os músicos, com leis internas com relação a drogas e o álcool (coisa difícil de se controlar no meio musical). Eric Clapton, por exemplo, foi um que buscou a liberdade de tocar da maneira que queria, abandonando a banda de Mayall, para formar o Cream. Para seu posto foi recrutado Peter Green.
Mayall uma vez disse: "Levamos o blues a sério, ele foi absorvido por nós profundamente e agora faz parte da gente também, é uma linguagem universal". Talvez essa declaração explique sua devoção e rigor em seu trabalho. Seria difícil destacar algum disco em especial da ampla discografia do Jonh Mayall's Bluesbrackers, mas aqueles primeiros trazem o que há de melhor no blues britânico, como Bluesbrackers - John Mayall With Eric Clapton (66), Hard Road( 67), Crusade (67), Blues Alone (67) e Bare Wires (68). Aliás, Bare Wires, é considerado por muitos críticos, como seu melhor disco na década de 60. Representou uma virada em sua carreira, pois a partir dali só passou a gravar material próprio, com uma concepção mais moderna e arranjos mais elaborados. Outro disco, já dos anos 70, que eu gosto muito, e possuo em vinil, é Moving On (73), um álbum ao vivo, em que Mayall faz com perfeição uma fusão do jazz com o blues.
Hoje, aos 78 anos, John Mayall continua na ativa, e tive a alegria de assisti-lo ao vivo em 2008, no festival de jazz e blues de Rio das Ostras, quando também pude fazer um contato pessoal com ele, um verdadeiro mestre.
Grande lenda viva mesmo... Bare wires é um tremendo disco contando com Mick Taylor, guitarrista que entrou nos Stones após a morte de Brian Jones..
ResponderExcluirTambém tive o privilégio de conhecer John Mayall pessoalmente em Rio das Ostras e até tirei umas fotos com ele...O mais interessante é que ele estava no meio do público em uma modesta barraquinha autografando discos e 70% do público não fazia idéia de quem se tratava: um dos maiores responsável pela revitalização e disseminação do blues no velho continente..
Sim, Felipe, foi uma grande surpresa ver Mayall em meio ao público, autografando seus cds, como um simples mortal.
ResponderExcluirAbraço