Todo inovador, aquele que propõe novos formatos, novas leituras e novos conceitos acaba pagando um tributo por sua ousadia. Mas por outro lado, as mentes mais abertas para novas propostas acabam assimilando essas evoluções. Astor Piazzola, músico argentino, é um desses exemplos, ao estabelecer um novo formato para o tango, modernizando-o, desconstruindo sua base, mas sem desrespeitar sua essência. Mesmo assim, sua música nem sempre foi bem recebida em seu país, pois o tango foi e ainda continua sendo uma enlouquecida paixão nacional, e modificar sua estrutura tradicional é para os mais conservadores quase um crime lesa-pátria.
Na verdade, justamente por esse caráter de adoração e respeito, o tango não se renovava, e vivia, portanto, uma época de profunda calmaria quando Piazzolla chegou com sua proposta de inovação, dando um novo impulso ao ritmo, provocando uma divisão de opiniões. Por um lado, a ala fundamentalista do tango não aceitava aquilo que ela considerava uma heresia, as mudanças harmônicas e a nova forma de se interpretar o ritmo, e por outro lado, os músicos mais jovens se sentiam fascinados e seduzidos com as mudanças propostas.
Essa incompreensão não se limitou à sua terra natal. Lembro que em um dos antigos Festivais Internacionais da Canção (FIC), uma vez Piazzolla se apresentou como convidado, e foi vaiado por um bando de imbecis, que não sabiam nem o que estavam ouvindo. Ao contrário dos argentinos tradicionalistas, que não aceitavam mudanças, aquela parte da plateia brasileira vaiava por desconhecimento e burrice. Mas o que importa é que sua música foi reconhecida, admirada e festejada por muita gente, e Piazzolla foi um músico extremamente respeitado ao longo de toda sua carreira.
Tendo passado a infância em Nova York, Piazzolla rodou o mundo recebendo as influências mais variadas. Já nos anos 50 ele misturava o bandoneón com orquestra, utilizando o violão eletrônico, reciclando assim toda a estrutura do tango e seduzindo os vanguardistas. Um disco em parceria com o saxofonista Gerry Mulligan é um exemplo dessa fusão musical proposta por Piazzolla, unindo o tango ao jazz, com muito improviso e inventividade. Libertango, Adiós Nonino e Balada para um Loco estão entre suas composições mais aclamadas e conhecidas.
No Brasil, Piazzolla tinha grandes admiradores e amigos, como Vinícius de Moraes e Chico Buarque, para quem o músico argentino chegou até a enviar um tango para ele colocar letra, que nunca foi terminada.
Piazzolla morreu em julho de 1992, deixando uma obra das mais ricas e respeitadas.
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