Em 1985 Jorge Mautner lançava mais um disco, que ganhava o curioso título de Antimaldito, como uma negação do rótulo que sempre carregou de artista de difícil assimilação pelo grande público. A carreira musical e literária de Mautner traz uma marca pessoal, faz refletir e encanta aqueles que sabem seguir pelos atalhos da arte que propõe novas possibilidades. Em agosto daquele ano o jornal O Pasquim trazia uma matéria sobre o disco, assinada pelo letrista, poeta e agitador cultural Tavinho Paes. Eis o texto:
"É nesta semana que Jorge Mautner, líder espiritual do Partido do Kaos, vem lançar seu novo LP: Antimaldito, produzido por uma nova marca da MPB (o selo Nova República, iniciativa brilhante de Zé Vicente Brizola e Roberto Santana), tendo na direção artística Caetano Veloso e os teclados de Mozart Ricardo Cristaldi. Um disco nada descartável. Um anti-chiclete. Um manifesto político em nome do discurso da Nova Era. Histórico, humanista, democrático... Um alvo acima do fígado de Prometeu exigindo o presente da águia.
No LP, Tânatos e Eros se digladiam. Se estourar a bomba H, mantenham-se aos beijos com seus adorados amantes! É o tema da canção Cinco Bombas Atômicas. Jesus e Marx tomam chá das 5 na Inglaterra enquanto Teilhard de Chardin celebra uma missa, com música de Brahms nas estepes desérticas de da Ásia. É a canção Corações. O Lobisomem traz a magia e o Trhiller do Michael Jackson entra em transe. O Cachorro Louco uiva na 3ª faixa. Os Índios Tupi Guarani saúdam a deusa da Guanabara... e na Zona Fantasma, onde Super-Homem exila seus inimigos, um resgate dos verdadeiros revolucionários da MPB: Macalé, Melodia, Arrigo... O lado A é assim.
No lado B a sequência é mais poderosa ainda. Napalm na pele de cordeiro dos lobos cinzentos! Resgatada de 1958, A Bandeira do Meu Partido é o hino do socialismo moreno, do comunismo utópico do 3º mundo. Iluminação é prima do Vampiro, gravada por Caetano, e vem de leituras dos Sermões do Padre Antonio Vieira, enquanto iam sendo escritas as páginas beatiniks do Prêmio Jabuti de 62: Deus da Chuva e do Sol. Demais! No Fado do Gatinho, uma safadeza paira nos telhados de Portugal. O Tataraneto do Inseto é o discurso além-Nietzsche. Um mergulho na Science-Fiction russa. Canalhas, arrependei-vos! é o risco do gênio na cara dos criminosos da Capemi, do Inamps, dos torturadores... Um antídoto sob a fórmula de um veneno.
Tudo baila à guisa do prazer. Uma sociedade que tanto idolatra o trabalho deve estar pronta para homenagear o prazer. Trotski visto pela Tragédia Grega. Machiavelli na era dos computadores. Mautner. A espiral e o cogumelo atômico. O oriente visto pelos gramáticos ocidentais. A cultura original dos aztecas, maias e incas, trazidas aos índios brasileiros, em suas plumagens e rituais. Tudo isso no movimento do Kaos. A formação do guerreiro. A Babilônia e a Atlântida sendo submetidas aos satélites. O cometa Halley que se aproxima. A Democracia. A Utopia e a Fé. O perdão contínuo. A faca frágil do bisturi. Flauta, tambor, chuva e a dança. Mautner. Amadores do mundo, domesticai vosso orgulho.! Warhol e Oswald, Tarsila; os Ideogramas do Tao. A bomba H e o estalinho de São João. A vida. A diferença entre os dragões de Dom Quixote e de São Jorge. Num, o circo católico viu o pecado e matou o fogo pondo sua lança naquelas mucosas em chamas. Noutro, seu amor tornava-se ventos que movem moinhos, e onde há vento é necessário inventar o furacão. Mautner esta aí. Somos muitos Brasis, somos o único Brasil! Axé, kolofé, Agô!"
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