Palavras Domesticadas

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quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Preciosidades em Vinil - Lóki? (Arnaldo Batista)


Em 1974 os Mutantes, em seu núcleo básico: Sérgio, Arnaldo e Rita – estava dissolvido, com cada um seguindo seu rumo. Primeiro foi a saída de Rita, e pouco tempo depois Arnaldo também deixava a banda, que sob a orientação musical de Sérgio, enveredava para o rock progressivo. Rita naquele ano formava a banda Tutti-Frutti para acompanhá-la em sua empreitada de fazer um rock básico, e lançava o disco Atrás do Porto Tem uma Cidade. Arnaldo, por sua vez, buscava fazer seu som, distante das influências progressivas do irmão, e ao deixar os Mutantes sabia que teria o desafio de fazer um trabalho solo digno de sua genialidade e criatividade, comprovadas nos discos de sua antiga banda. Ainda estava sob contrato com a gravadora Phonogram, e ao conceber o álbum, gravou “Lóki?” gastando poucas horas de estúdio, com necessidade e urgência de uma gravação instantânea para captar aquele clima “genialmente doloroso”. Arnaldo vivia um momento particularmente conturbado: o fim de seu casamento com Rita Lee, sua saída dos Mutantes, e seu envolvimento com as drogas. A música representava para ele uma saída para o seu drama pessoal, por isso a urgência e a necessidade que sentia de criar e gravar seu primeiro álbum como artista solo. Embora o título do álbum remeta ao vilão das histórias em quadrinhos, o irmão desnaturado de Thor, o Deus do Trovão, Loki era apenas uma gíria paulista para designar louco, pirado. O disco começa com “Será Que Eu Vou Virar Bolor?”, um rock com uma letra onde ele contesta uma série de valores, e termina perguntando a si mesmo “onde é que está meu rock n' roll?”. Uma Pessoa Só, a faixa seguinte faz parte do disco O A e o Z, dos Mutantes (já sem Rita), até então inédito, só sendo lançado muitos anos depois. Os arranjos do maestro tropicalista Rogério Duprat fazem uma fusão com elementos de jazz ao rock de Arnaldo. Não Estou Nem Aí é outra boa composição de Arnaldo, com uma letra viajante, que fala em “um mundo de cristal e num sonho surreal”, onde o essencial era “decolar toda manhã”. Vou Me Afundar na Lingerie, outra faixa do álbum, é uma das melhores do disco. Tanto letra como melodia, arranjos, tudo genial. Cê Tá Pensando Que Sou Lóki?, é um rock-samba bem ao estilo da fusão de ritmos e ideias desenvolvida pelos Mutantes. Outras faixas, com Desculpe, Honk-Tonk (instrumental, só piano), Navegar de Novo, Te Amo Podes Crer e É Fácil comprovam a fase criativa em que Arnaldo se encontrava na época. Gravado em fins de 74, e lançado no início do ano seguinte, “Lóki?” acabou se tornando um marco do rock brasileiro. Não é um disco comercial, e vendeu pouco, mas a crítica da época logo reconheceu o valor da obra, como Ezequiel Neves: “Que eu saiba, é a primeira bad-trip transformada em lp. Mas não deixa de ser divertido ouvir um dos baluartes do rock tupiniquim dando bandeira de piração. O disco chega a comover com sua sincera melancolia.” O crítico Tárik de Souza diria: “Minhas homenagens ao melhor lp de rock de 1975. Desigual, imperfeito, caótico, depressivo, enérgico, sentimentaloide, inacabado. Um perfeito 3x4 do rock nacional, com três vantagens sempre ausentes no setor: sinceridade, potência e personalidade.” Em sua biografia, Balada do Louco, escrita por Mário Pacheco, o autor diz sobre “Lóki?”: “ Procurei o dito em sebos e não encontrava, pois o mesmo era disputado aos tapas pelos fãs, e valorizado como uma peça de leilão, que custava naquele tempo cinco mil cruzeiros, o que era grana demais para mim na época, e que ainda hoje continua sendo, mas para encerrar o papo, consegui uma fita do disco”. A cópia que eu tenho, original da época, eu consegui por pura sorte, e sem precisar gastar nenhuma fortuna, muito pelo contrário. Encontrei numa banca de saldo de uma loja nos anos 80. Era do estoque antigo da loja, e o dono, que não conhecia Arnaldo Batista, colocou o disco em promoção para desencalhar. Hoje é um importante item de minha coleção.

5 comentários:

  1. Uma pérola mesmo...
    "Navegar de novo" eu só ouço quando estou muito deprimido e acabo me sentindo bem...
    Discoteca básica do raríssimo rock legítimo nacional.

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  2. esse disco é incrível, parabens por essa raridade, apesar de ter 17 anos tenho um gosto musical bem maduro, diferente da minha faxetária coisa de sertanejo universitário essas porcaria não me atrai, Os Mutantes, Caetano, Chico Buarque isso sim é música brasileira.

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  3. Parabéns por seu gosto musical. Felizmente nossa juventude não está totalmente perdida.
    Abraço

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  4. Nossa cara esse disco é o orginal de 74 ? que raridade! eu tenho aquele relançamento da fontana... mesmo assim penei pra achar rsrs o melhor disco nacional na minha opinião

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  5. Parece que eu já ouvi,faz tempo,qualquer hora ouço com mais atenção.

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