Na segunda metade dos anos 70, um movimento de black music nacional ganhava força, e tomava conta do cenário musical - o movimento Black Rio. Por ter nascido em bailes no subúrbio carioca, o movimento ganhou o nome da sua cidade de origem. Na época, criou-se muita polêmica com relação à validade de um movimento que trazia influências internacionais, e determinadas alas mais conservadoras viam o movimento como algo sem valor. Lembro que os principais ataques vinham de sambistas revoltados pelo fato de determinadas escolas de samba alugarem suas quadras para equipes de som tocarem aquele tipo de música, pelo fato dos "templos do samba" servirem àquele movimento. Muitos críticos também caíam de pau no Black Rio, mas é verdade que alguns astros da MPB, como Gil e Caetano, por exemplo, aderiram ao movimento. Caetano lançou em 77 o disco Bicho, um álbum bem dançante, como pregava o movimento, e fez shows acompanhado pela Banda Black Rio, um dos principais porta-vozes dos blacks brasileiros. Gil lançava no mesmo ano o disco Refavela, que também trazia elementos da música dançante do movimento black.
Em sua edição nº 30 (fev 77), o Jornal de Música trazia uma longa matéria sobre o assunto, e trazia o depoimento de um dos líderes do movimento Black Rio, Dom Filó:
"Bom, o negócio começou em 72, 73, lá no Clube Renascença, onde eu e o grupo cultural - a direção cultural do Renascença - estávamos fazendo um trabalho de cultura para os jovens, mesmo. O lance era Orfeu Negro, de Vinícius, então a gente montou o Orfeu, aí, tudo bem, um espetáculo maravilhoso, um sucesso, mas jovem negro nenhum. Ninguém tava ligado nesse negócio de cultura. Eu com aquilo compreendi e entrei numa de fazer som. Com o som o pessoal se dividiu e nós começamos a fazer um som lá nos domingos às 8 e meia.
Foi um sucesso. Escolhi o nome e fiz uma programação com slides, filmes, uma programação cultural com muito som variado. O nosso repertório, no início, era o refugo do repertório das boates da Zona Sul. Lá, o discotecário era obrigado a tocar a música que estivesse na moda, assim eles cediam pra nós uma pá de músicas inéditas e que ninguém possuía.. Quem escolhe a música é o discotecário, ninguém da equipe dá palpite.
Soul Grand Prix é som em alta velocidade, então esse nome foi bolado assim porque não tem nada de político e não trazia nenhum problema. Nós apresentávamos slides de cantores negros, nacionais e internacionais, mas colocávamos também pilotos de Fórmula Um, fazíamos uma mesclagem, um trabalho bonito. Aí fomos fazendo sucesso, nos bares também porque em termos de roupas nós éramos muito loucos, sabe? Pintávamos cheios de transa, e o pessoal ficou assim. e sacou em nós um novo caminho.
Dom Filó |
Nós fomos os primeiros no campo áudio-visual. Nós começamos projetando slides de Shaft, Wattsax e outros filmes. Depois ficamos a fim de conscientizar o público, projetando slides de Duke Ellington, Dizzy Gillespie, fazendo uma espécie de introdução à cultura negra por fontes que o pessoal já conhece, como música e os esportes.
A Soul Grand Prix foi a primeira equipe, ela foi além de equipe, fez um lance diferente. Depois surgiram outras, mas na maioria não são um som diferente, com outra concepção, não sacaram nada de novo.
O fato do pessoal ter deixado o samba pelo soul foi uma coisa incrível. Foi porque o samba saturou Não pela forma social, não, mas pelo próprio sabor do samba. Nessa época de 72, estava-se curtindo a nostalgia do samba de 66, daquelas noites de partido alto, daqueles sambas-enredo. Quando chegou essa época de 72/73, o samba tava no auge, mas um auge deturpado, Antonio Carlos e Jocafi, a rapaziada não tava nem aí. Era uma malhação, também, era uma grana violenta. E a rapaziada concluiu que não dava mais. Vamos curtir outro som. E o soul tem raízes. Uma mistura de soul com samba tem mais energia, é uma mistura incrível.
Hoje a coisa já está mudando. Hoje, por lá, você já encontra discotecas. O Black Rio não vai ficar fazendo aquele som só visual. Está mudando mais para Herbie Hankock, Avarege White Band. Até Bee Gees lá é um sucesso com aquela música It Should Be Dance. É bem discoteca. Há um ano atrás, o pessoal não aceitava nada que tivesse guitarra, jogavam coisas nos discotecários. Hoje já aceitam"
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