segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Uma Grande Mulher Por Detrás De Um Grande Livro
Um dos melhores livros que li em minha vida (prefiro não ousar dizer "o melhor") é "Ulisses", do irlandês James Joyce. A edição que li, com tradução de Antonio Houaiss, e com mais de 900 páginas, me trouxe toda a genialidade de Joyce, e sua escrita revolucionária. Apesar de ser uma obra-prima em todos os sentidos, e hoje ser um livro cultuado em todo mundo, não foi fácil para o autor ver sua obra lançada. A grande amizade entre James Joyce com uma jovem editora americana, chamada Sylvia Beach tornou possível a primeira edição de "Ulisses".
Sylvia era muito interessada em literatura, filha de um ministro presbiteriano, que se muda para Paris no início dos anos 20. Meses depois ela recebe uma bolada de dinheiro dos pais, e abre sua própria livraria, a Shakespeare and Company, a única de Paris especializada em obras de língua inglesa. Em Paris, que era na época a capital cultural do mundo, ela conhece James Joyce, que também havia se mudado com sua família para a capital francesa, e trava com o escritor uma estreita amizade. Joyce já era um nome reconhecido por sua obra "Retrato de Um Artista Quando Jovem", porém seu projeto literário mais ousado, "Ulisses", era sistematicamente recusado pelos editores ingleses e americanos, por se tratar de uma obra altamente complexa e longa. Publicar o romance, que viraria de cabeça pra baixo a prosa do séc. XX, se tornou uma obsessão para Sylvia, que tinha em James Joyce, mais do que um grande amigo, uma verdadeira relação de fã. As fotos que ilustram essa postagem mostram Sylvia e Joyce em dois momentos: a pimeira na livraria de Sylvia , e a foto abaixo, numa calçada de Paris.
Os mil exemplares de Ulisses, editados por Sylvia, quase todos encomendados, demoram para sair, mas em 1922 ganham as livrarias, e contrariando os editores que recusaram a obra, se esgotaram rapidamente. Os exemplares encomendados nos Estados Unidos só chegam através do Canadá, contrabandeados. Somente dez anos depois são editados oficialmente nos EUA.
Uma biografia de Sylvia Beach foi escrita, e somente publicada no Brasil mais de 50 anos depois, e conta sua história, e seu envolvimento não só com Joyce, mas com vários escritores importantes, e a vida cultural de Paris no início do século passado. "Shakeaspere and Company/Uma livraria na Paris do entre-guerras" foi lançado em 2004 pela editora Casa da Palavra. Numa matéria sobre o lançamento do livro, publicado no jornal O Globo, em 25/07/04, o jornalista Arnaldo Bloch diz:
"No fim do livro, a leveza transforma-se mum libelo, quando descobrimos que, decidida a permanecer na cidade durante a ocupação alemã, Sylvia termina por fechar a livraria e amarga seis meses num campo de concentração. As páginas finais, que descrevem a libertação da cidade tendo Hemingway como personagem, parecem metáfora dos muros que no século passado se ergueram diante de ousadias como "Ulisses". Pensando bem, os muros estão ainda de pé, mas a liberdade acaba por triunfar."
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