Palavras Domesticadas

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sexta-feira, 8 de julho de 2016

Paulo César Pinheiro - Revista Música Brasileira (1997)

Paulo César Pinheiro é um dos letristas mais representativos do que de melhor se produziu e ainda se produz na música brasileira a partir do final dos anos 60. Autor de centenas de letras gravadas, com os mais variados parceiros, P.C. Pinheiro já deixou gravado seu nome na música brasileira, por tantos clássicos cujas letras saíram de sua inspirada lavra poética. Sua extensa obra e seus inúmeros parceiros falam por si só.
Em seu nº 8, de novembro de 1997, a revista Música Brasileira trazia uma matéria de capa com PC - uma entrevista dada a Luis Pimentel, em que ele fala um pouco de sua trajetória no mundo das letras. A matéria tem por título "O samba bate outra vez, com força e fé":
"Da primeira música até hoje - Lapinha - feita em parceria com Baden Powell e vencedora da I Bienal do Samba da TV Record, em 1968, são 30 anos de carreira consistente, superelogiada e em constante aprimoramento.
Poeta premiado, autor dos livros Viola Morena e Canto Brasileiro, Paulo César Pinheiro é considerado por quem entende como um dos mais importantes letristas da Música Popular Brasileira. A obra impressionante se aproxima das 800 composições gravadas, e a quantidade de parceiros nem ele consegue enumerar de primeira. Depois de uma gargalhada, tenta lembrar:
- É muita gente. Nem sei ao certo. Mas segundo minha biógrafa Conceição, mulher do Pedrinho Amorim, tenho perto de 100 parceiros.
É muita gente. Os mais conhecidos são mesmo João Nogueira, Mauro Duarte, Baden Powell, Eduardo
Gudin, Francis Hime, Rafael Rabelo, Edu Lobo, Tom Jobim, Dori Caymmi, Maurício Tapajós (com quem Paulinho fez O Samba Bate Outra Vez, prato de resistência no cardápio de qualquer roda de samba que se preze), Wilson das Neves e Sueli Costa, Tem também parcerias esporádicas, porém marcantes, como Saudade da Guanabara, ao lado da dupla Moacyr Luz e Aldir Blanc, e uma grande quantidade de compositores jovens a quem Paulinho tem oferecido parcerias.
- Fizeram o mesmo comigo, quando comecei. Os grandes reconheciam o talento e puxavam para um trabalho ou outro ao lado deles.
- E os intérpretes, consegue lembrar quantos já gravaram suas músicas?
- Agora é que são elas!
São elas, sobretudo elas, como Elza Soares, Cristina Buarque, Clara Nunes, Elis Regina ('Essa foi quem me lançou', diz o poeta, orgulhosíssimo), Beth Carvalho, Alcione, Quarteto em Cy, Nana Caymmi...
- Não esqueça de Elizeth Cardoso. Tive sorte de ter sido gravado pelas maiores. É mais fácil dizer quem não me gravou.
Talvez tenha sido Elizeth a que mais gravou Paulo César Pinheiro. Tem os 'eles' também: MPB-4, Paulinho da Viola, Marcos Sacramento. O parceiro João Nogueira, então, gravou quase tudo. E onde quer que se apresente, tem sempre alguém pedindo uma palhinha da maravilhosa Espelho
- Em meio a tantas parcerias, qual aquela que chega mais perto, que propicia um entendimento mais perfeito?
- Difícil dizer, porque cada parceiro é um parceiro, cada caminho é um caminho. São diversos caminhos, como João Nogueira no samba carioca, de calçada, Sivuca nas músicas nordestinas, Dori na mistura de música mineira com música baiana, Mauro Duarte na linha do samba de enredo. São caminhos diversos, diferentes, cada um com seu rumo, sua importância.
capa da revista
- Com essa quantidade invejável de músicas gravadas, dá para viver confortavelmente de direitos autorais?
- Eu fui um dos primeiros autores brasileiros a viver somente de direito autoral. Antes de mim teve o Vinícius, que ganhou dinheiro com música, mas que também foi diplomata, cronista de jornal, crítico de cinema. Eu jamais fiz outra coisa na vida senão escrever poesia, para ser musicada ou não. E continuo vivendo de minha arte.
- Graças ao tamanho da obra ou à sua batalha de cobrar, acompanhar, correr atrás?
- As duas coisas. Não só graças ao volume da obra como também à minha tenacidade em conhecer as questões ligadas ao direito autoral. Não dá para ficar reclamando de direitos autorais, sem conhecer os seus direitos, para reclamar com convicção. Nós, compositores, precisamos conhecer pelo menos o mínimo, a base do direito autoral brasileiro. Fui um dos fundadores, juntamente com o Maurício Tapajós, Aldir, Hermínio, Sérgio Ricardo e outros companheiros, de uma sociedade arrecadadora que nasceu para ser diferente, a Sombrás, que acaba de fazer 15 anos de existência. De alguma maneira, fizemos parte da mudança do direito autoral no Brasil, que não mudou o suficiente, mas avançou bastante.
Acompanho a minha obra, atentamente, onde quer que ela esteja. Recebo dinheiro de Israel, às vezes sem nem saber ao certo a que música se refere. Fui um dos primeiros autores brasileiros a receber direito autoral vindo da União Soviética, na época em que ainda era comunista.
- Você cuida disso sozinho ou já montou uma estrutura de acompanhamento pra lhe ajudar?
- Tenho uma editora própria, que faz um controle da minha obra, das edições musicais. Alguns parceiros também editam comigo. Mas a minha editora nasceu para editar a minha parte na parceria. Nessa área, também fui um um dos primeiros compositores a fundar uma editora musical.
P.C. Pinheiro ao lado de Clara Nunes
Pioneiro, batalhador e com um fôlego de fazer inveja, Paulo César Pinheiro é um explorador de caminhos e de possibilidades artísticas. Para quem não sabe, tem bagagem também no ramo das trilhas sonoras, já tendo trabalhado para o cinema, o teatro e a televisão. Começou com a novela O Semideus, em 1973, para a qual compôs dez músicas em parceria com Baden Powell. No ano seguinte fez a trilha da peça que inaugurou o Teatro Manchete, Pippin, com Marília Pêra e Marco Nanini, direção do saudoso Flávio Rangel. Ainda na televisão fez músicas-temas também para Escrava Isaura, para as minisséries Teresa Batista e Tenda dos Milagres, e também para as produções infantis, como Ratimbum e Sítio do Picapau Amarelo. No cinema, as produções mais marcantes com trilhas suas foram Tati, a Garota (de Bruno Barreto), A Batalha dos Guararapes e O Triste Fim de Policarpo Quaresma (ambos de Paulo Tiago).
Poeta elogiadíssimo pelo público e pela crítica (existem pelo menos três trabalhos acadêmicos destrinchando sua obra), Paulo César Pinheiro tem dois livros de poemas publicados, Viola Morena e Canto Brasileiro, e três inéditos (em sua maior parte feitos de sonetos), que estão sendo revisados e finalizados para lançamentos entre 98 e 99, quando o poeta estará completando 50 anos de idade, e espera-se uma série de homenagens a acontecer por todo o país.
- Muita gente nova fazendo um bom trabalho, Paulinho? Que letrista novo ganharia o Prêmio Paulo César Pinheiro?
- Infelizmente, os mesmos. Acho que não houve muita renovação e os letristas que estão mostrando trabalho hoje são os mesmos que começaram mais ou menos na minha época, como Aldir, Abel Silva, Chico Buarque, Victor Martins, Nei Lopes. Não vejo renovação e até sinto falta.
- Já na parte musical, há uma novidade a cada dia.
- Exatamente. É um número enorme de novos compositores, produzindo e mostrando trabalho.
- E os novos intérpretes que estão chegando ao mercado? São muitos e alguns muito bons.
- São, apesar das dificuldades que eles enfrentam para marcar presença. Se o artista novo não tem o apadrinhamento de uma multinacional, não consegue gravar. Se grava um disco independente, enfrenta dificuldades para distribuir e divulgar.
- Mas, apesar das dificuldades, felizmente eles insistem, não é?
- Felizmente."
 

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