Em 1981 o compositor cearense Ednardo já havia deixado sua marca no cenário musical brasileiro. Na época o mercado de música no Brasil era mais flexível. Havia espaço e credibilidade para a boa música que se produzia no país. Os músicos podiam mostrar seu trabalho, divulgar sua obra e assim ir ampliando seu público sem precisar cair em esquemas comerciais tão massificadores como nos dias de hoje. Jogadas comerciais e de marketing para impor músicas de baixa qualidade sempre existiram, e naqueles tempos não era diferente, porém havia um maior espaço para a música de qualidade e para músicos com uma proposta de trabalho fora dos padrões comerciais impostos. O trabalho de Ednardo é um exemplo. Naquele ano, a revista Música fez uma matéria com o músico cearense, com o título "Venho de coração aberto, sangrando minha música por todo esse Brasil", assinado por Marina C.M. Teixeira de Mello, e nela Ednardo já se queixava de manobras comerciais:
"Ednardo não gosta que digam que sua música é regionalista. 'O som, o sotaque, o ritmo podem parecer de uma região, mas há em toda música um feed-back, a própria vivência do autor e do seu momento'. Embora o seu 'lar existencial' seja Fortaleza (onde tem mulher, dois filhos - e mais um pra nascer) ele comenta que vive viajando, e 'mora no Brasil'. Já viveu sete anos em São Paulo, três no Rio, e acho que o próprio fato de não ficar muito termpo em cada lugar dá uma riqueza maior às suas composições e ao seu modo de enxergar as coisas.
'De repente o Brasil está em outra época. Essa nova geração pós-Beatles já cresceu codificada, dentro de um antropofagismo, de uma mesmice brasileira. A cultura alienígena tem que chegar a todos os lugares, mas a sua codificação é diferente'. Dentro desse ponto de vista ele contesta os que querem rotular a música - e afirma que sua linguagem é 'brasiliana', sem a preocupação em ser 'a voz do nordeste'. 'A música é o espelho do momento. Quem tiver a sensibilidade para sacar os dados, pode historiografar na música popular brasileira a própria história do país...'
Ednardo observa que o momento brasileiro passou muito tempo estagnado. Nos últimos 15 anos tudo foi manipulado - e o próprio gosto e aceitação popular funcionavam dentro de esquemas mercadológicos. Os problemas se refletiam na arte e era 'conveniente' que um autor durasse o maior tempo possível, para não ter que se investir em gente nova. 'Mesmo assim já estávamos num movimento underground - fora dos esquemas e debaixo do chão - que agora começa a tomar impulso, com possibilidade de se usar a palavra pensamento.'
O empresário chileno Fito mostra um portfólio onde está documentada toda a excursão musical de Ednardo. 'Ainda não há uma coisa sólida em termos de data, mas estamos fazendo fotos, filmes, registros e gravações'. O trabalho de um novo disco está sendo feito em função dessas gravações, feitas ao vivo. Ednardo se entusiasma: 'Está acontecendo uma coisa maravilhosa. Apresento músicas de meu LP de 72, de 76, ou mesmo músicas novas (muitas ainda sem título) - e de repente as pessoas estão cantando. As coisas não correm mais de acordo com um calendário discográfico. Não solicitam só o 'Pavão Misterioso' (massificado desde que se tornou trilha da novela 'Saramandaia'), mas também 'Terral', 'Ímã', 'Manga-Rosa', 'Artigo 26' e muitas outras.
Em matéria de gravadoras, ele prefere manter uma política de 'boa-vizinhança'. reconhece que a parte comercial também é importante, mas prefere não ficar muito tempo preso a uma determinada gravadora. Ainda em abril, a RCA lançou um 'disco de ouro' com uma seleção de de músicas de seus LPs - mas atualmente está tabalhando de uma forma 'semi-independente'. 'A música é o sincretismo total, compreende todo o meio onde se desenvolve - inclusive o comercial. Quem não a vê nessa totalidade, só enxerga uma coisa manca, capenga'.
Ednardo acredita no seu trabalho. Sente cada vez maior a receptividade do público em suas apresentações - e pretende, nesse disco que está preparando, transmitir toda essa vibração. 'A música é a antena que capta a sensibilidade e o momento das pessoas. E o momento é Brasil: aqui e agora'."
Doido dimais
ResponderExcluirSem dúvida
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