Palavras Domesticadas

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quarta-feira, 1 de julho de 2015

Ivan Lins Comenta Seus Discos - Revista MPB (1981)

Nos anos 80 a editora Imprima, que era responsável pela publicação da revista Violão & Guitarra, que trazia letras de música com cifras para serem acompanhadas ao violão, também publicava revistas com textos, sobre compositores ou gêneros musicais. A revista MPB era uma dessas publicações, sempre destacando um compositor ou cantor, falando de sua carreira, trazendo às vezes entrevistas e análises de sua obra. Em 1981, um dos artistas destacados com um número especial foi  Ivan Lins. A revista fala de sua vida, traz uma boa entrevista, e ainda uma análise de Ivan dos discos que ele havia gravado até então. Para a postagem não ficar por demais extensa, resolvi transcrever apenas os comentários de Ivan sobre seus próprios discos:
"Ivan Lins, Agora, 71: 'Destaques: Agora, Madalena, O Amor É O Meu País, Salve, Salve Aleluia. Foi um dos meus LPs que mais venderam. Teve a seu favor todo o aparato do programa 'Som Livre Exportação', que ia ao ar pela TV Globo, então foi um disco de muita repercussão e deu um primeiro grande impulso à  minha carreira. Dele constou também uma música chamada 'Emi' que, apesar de não ter tocado, as pessoas que na época tiveram esse disco, curtiram esse trabalho, até hoje falam dela'.
Deixa O Trem Seguir, 72: 'A única música que se destacou foi 'Me Deixa em Paz', sucesso em todo o país, que Elis Regina gravou (como já havia gravado 'Madalena'). Foi um disco um pouco enrolado. Quando eu o realizei, fiquei muito cheio de mim, achei que podia fazer um negócio mais sofisticado. Sofistiquei demais e acabei dançando: enquanto o primeiro chegou a umas 80, 90 mil cópias, este caiu para 8, 9 mil. Além disso, eu já estava começando a me afastar. Era aquela famosa fase que todo mundo conhece, que já foi cantada em prosa e verso.'
Quem Sou EU?, 73: 'O LP que menos vendeu, na minha carreira toda - umas três mil cópias. Mas aí eu já estava tirando o time mesmo. Ainda assim, foi um disco que eu realmente gostei muito de ter feito. Tem músicas como 'Pra Você Ver', que eu acho belíssima, e a própria 'Quem Sou Eu?', 'Cofre'... Canções muito bonitas, mas que não chegaram a ser conhecidas, não chegaram a tocar. Eu não fiz muita força, nem a companhia na época fez força.'
Modo Livre, 74: 'Destaques: 'Abre-Alas' (minha primeira parceria com o Vítor Martins), 'Tens' (que Nana Caymmi também gravou), 'Deixa Eu Dizer' (O MPB-4 e a Cláudia gravaram), 'Não Tem Perdão'. Foi a primeira vez que eu gravei músicas de outros autores num disco meu; 'Avarandado', do Caetano Veloso, que ficou belíssima; um pot-pourri de samba, com 'General da Banda', 'Recordar É Viver', 'A Fonte Secou'. Era um disco pra vender muito, não fosse a incompetência da gravadora RCA Victor, que não é muito afeita  a artistas classe A. Então esse LP ficou nuns 10 mil. Isso dizem eles, se bem que eu acredito que tenha vendido pelo menos uns 20, 30 mil. Mas a gente não pode provar nada, só desconfia.'
Chama Acesa, 75: 'Destaques ; 'Sorriso da Mágoa' (também gravada pelo MPB-4), 'Palhaços e Reis' (MPB-4, Silvia Maria...), 'Joana dos Barcos'. Trata-se de um LP em que a minha parceria com o Vítor já estava bem mais consistente e é o primeiro trabalho em disco que fiz com o Gilson Peranzetta. Mas principalmente foi um disco de grupo, um disco de músicos, sem orquestra nem nada, só como o quarteto Modo Livre. Eu acho um LP muito importante na minha carreira, pela concepção, pelo lado do músico que eu sou, pelo trabalho dos músicos que estavam me acompanhando. Infelizmente foi um disco pessimamente trabalhado, não recebeu nenhuma atenção por parte da companhia.'
Somos Todos Iguais Nesta Noite, 77; 'Foi o LP que marcou para o grande público a minha volta, com um trabalho bem mais maduro, a parceria já sólida com o Vítor Martins e tudo. Teve uma vendagem incrível, hoje já deve ter chegado a uns 70 mil discos. Um pulinho bom, para quem tinha acabado de vender uns 4, 5 mil discos com o Chama Acesa. E aqui os destaques foram quase tudo: a faixa-título, 'Dinorah, Dinorah', 'Mãos de Afeto', 'Quadras de Roda', 'Diz Aparecida' (que o MPB-4 também gravou). Foi um disco assim que deu o maior pedal, e abriu portas para que de repente re-adentrasse ao gramado Ivan Lins, com sua música e seu piano.'
Nos Dias de Hoje, 78: 'Destaques: 'Cartomante' (que Elis também gravou), 'Aos Nossos Filhos' (idem), 'Bandeira do Divino', 'Guarde nos Olhos'. Vendeu otimamente, umas 80 mil cópias. E teve um impacto muito muito grande, inclusive através do próprio espetáculo, ligado ao problema social do Brasil, à situação política que a gente estava atravessando. Foi o último cascudo forte que a gente deu. Depois, com a abertura e tal, os cascudos começaram a não pegar na direita, então a gente teve de mudar de política.'
A Noite, 79: 'Destaques: 'Antes que Seja Tarde', 'A Noite', 'Desesperar Jamais', 'Formigueiro', 'Começar de Novo', 'Saindo de Mim' (que Simone também gravou). Foi um disco bravo, o que mais vendeu na minha carreira. Já passou das 100 mil cópias.'
Novo Tempo, 80: 'Destaques: 'Novo Tempo', 'Bilhete', 'Sertaneja', 'Coragem, Mulher'. Este disco eu não sei em quanto está, mas não deve passar de uns 60 mil.'
Daquilo Que Eu Sei, 81: 'É uma continuação do trabalho que eu, o Vítor e o Gilson estamos fazendo. Aliás, é o que eu digo sempre, porque não somos afeitos a mudanças radicais. A gente gosta demais daquilo que faz e sabe que têm muitas pessoas que apreciam nosso trabalho, então dividimos com elas essa emoção, esse amor à música. A proposta está bem colocada na faixa-título: 'Daquilo que eu sei/Nem tudo foi proibido/Nem tudo foi permitido/Nem tudo me foi possível/Nem tudo foi concebido/Não fechei os olhos/Não tapei os ouvidos/Cheirei, toquei, provei todos os sentidos/Só não lavei as mãos/E é por isso que eu me sinto cada vez mais limpo'. É um disco que foi gravado bem num clima artesanal, um negócio bem caseiro, com todo amor. Pouca gente, poucos músicos. É um disco de teclados, basicamente. Tem uma música instrumental, 'Braz de Pina', minha e do Gilson; uma balada chamada 'Amor', com belíssima interpretação de minha esposa Lucinha Lins, em participação especial; 'Lembrança', que é minha, do Vítor e do Gilson, e foi gravada pelo George Benson nos Estados Unidos, com o título de 'Love Dander' e letra do Paul Willians; 'Ave', que fala do símbolo da América Latina, o condor; 'Alô , Cirandeira', que é uma ciranda numa visão urbana; 'Dá Licença', uma folia de reis; 'Pano de Fundo', que fiz para uma novela, é cantada na trilha sonora pela Fafá de Belém e agora eu gravei do meu jeito; 'Canavial', uma toada em cima de um poema do Vítor, pequenininho mas lindíssimo, bem ao estilo de Manoel Bandeira ('Se no corpo, se nos olhos/Tenho água, tenho sal/Se o vento traz as ondas, faz maré no meu quintal/Pra viver ou me afogar/Se o verde é igual/Não preciso mais do mar/Tenho o meu canavial');'Quem me Dera', uma continuação de 'Aos Nossos Filhos', só que é a hora de em que nós, os pais, falamos para nós mesmos, o pai pra mãe, a mãe pro pai, o homem pra mulher. Participação especial do Otávio Burnier, que fez violões Ovation em duas faixas. E em 'Canavial' eu toco violão; de repente, assim, eu faço uma surpresa, sei lá , me assanho. Faço uma graça.' "

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