"Mas amigo de Milton, mesmo, era Márcio Borges. Os dois eram inseparáveis e em breve estariam compondo juntos. 'Na verdade, a gente não tinha muita coisa em comum. Mas a amizade vinha por conta da afinidade musical', recorda Márcio.
Apresentados por um amigo comum, Milton e Fernando Brant foram, a um bar e dividiram uma batida, uma cerveja e um ovo cozido para descobrir, em três horas de conversa, uma imediata afinidade. Assim em torno de mesas de bares como o Saloom e das sessões do cineclube CEC, iam se aglutinando os músicos que, depois da mudança da família Borges de volta a Santa Teresa, iriam formar o Clube da Esquina. Quem inventou a expressão foi Márcio, conforme relato do pai, Salomão, 81 anos e memória de menino. 'Por onde andam esses meninos, santo Deus?', perguntava Dona Maria, a matriarca dos Borges, preocupada com Lô e Yé. 'Claro que devem estar lá na esquina, cantando e tocando violão, mãe! Aquela esquina é o nosso clube, o Clube da Esquina', respondia Márcio.
É por isso que Lô rejeita a caracterização do Clube como um movimento musical. 'Para mim, o Clube da Esquina é uma música que fiz com o Milton e, depois, um disco que ele me convidou para fazer com ele. Mais tarde, ele fez o disco Clube da Esquina 2. A imprensa pôs todo mundo dentro desse rótulo e nós aceitamos', afirma Lô. 'Foi um grande empreendimento político, cultural e afetivo, uma iniciativa mais emocional do que estética', avalia Carlos da Silva Assunção, o Cafi, que fotografou tudo. Marcelo Dolabela, estudioso da história da música mineira, concorda. 'Enquanto os tropicalistas passaram seis meses se reunindo para fazer um manifesto, o pessoal do Clube da Esquina lançou um disco e descobriu que tinha feito um movimento', descreve o estudioso, que identifica algumas características comuns aos membros do grupo: a origem de classe média; a divisão em letristas e músicos; o uso do verso livre, sem rimas; o número reduzido de canções de amor, atribuído ao caráter pouco derramado do mineiro.
Lô Borges tinha apenas 17 anos quando Milton o convidou para gravar juntos o álbum duplo pela gravadora Odeon. 'Era um cara que não vendia disco dividindo um álbum duplo com um rapaz de 17 anos e um bando de malucos', lembra Ronaldo Bastos. A ousadia começava pela capa, uma foto de dois meninos que Cafi havia tirado numa estrada de Friburgo. O letreiro com o nome dos artistas vinha na contracapa. 'A gravadora orientou os lojistas a pôr os discos com o letreiro para frente. Mas logo eles perceberam a força da imagem e passaram a virar as capas. Junto com Fa-Tal, de Gal Costa, a Acabou Chorare, dos Novos Baianos, o disco fez a capa ganhar importância e passar a ser informação', lembra o fotógrafo.
O conteúdo não era diferente. Lô e Beto, que formavam o conjunto de covers dos Beatles chamado The Beavers, injetaram no disco o seu entusiasmo pela banda inglesa. 'Levamos um pouco daquelas baladas para o disco. Nós também já fomos modernos', brinca Lô. Reunindo, segundo, segundo as contas de Tavinho Moura, 52 músicos, as 21 faixas foram gravadas praticamente ao vivo. 'Naquela época, o estúdio só tinha dois canais. Todo mundo ensaiava e tocava junto', lembra Tavinho, que apresentou Milton às músicas folclóricas que ele iria gravar em Gerais. As letras tinham um forte conteúdo político, ainda que nunca explícito. 'Preferimos o social com lirismo', define Fernando Brant."
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