Palavras Domesticadas

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quarta-feira, 28 de março de 2018

Djavan: "Minha Música É Minha Cabeça" - Revista Pop (1979)

Djavan se lançou na música nos anos 70, primeiramente participando de trilhas de novelas, e também se destacando no Festival Abertura, da Globo, em 1975, ao se classificar em segundo lugar com "Fato Consumado". Em 1976 lançou seu primeiro LP pela Som Livre, já mostrando uma musicalidade diferente, com muito balanço e suingue, além de escrever letras bem criativas. Mesmo assim, só viria a gravar seu segundo disco, "Cara de Índio", em 1978. Na edição de março do ano seguinte, a revista Pop trazia uma matéria com o músico, que começava a chamar a atenção e fazer sucesso. A matéria é assinada por Leo Correa, e traz o título "Djavan: 'Minha Música É Minha Cabeça' ":
Cara de Índio está fazendo sucesso. A música, tema da novela Aritana, da TV Tupi de São Paulo, é também o carro-chefe do disco que marca a estreia de Djavan Caetano Viana na gravadora EMI-Odeon.
Para Djavan, o sucesso de Cara de Índio é consequência de um pensamento que ele sempre defendeu: Não há distinção entre índios e nós, o povo em geral. 'Do meu ponto de vista', diz ele, 'estamos todos diante da mesma situação, isto é, cercados.' Na letra da música, ele procura deixar claro esta identidade comum: 'Nessa terra tudo dá, terra de índio/ Nessa terra tudo dá, não para o índio/ Apesar da minha roupa, também sou índio'. Mas, quando a gente pergunta se ele se inspirou nas discussões sobre a emancipação do índio, tão em moda ultimamente, Djavan nega: 'Fiz essa música há mais de dois anos, porque é um lance que sinto desde garoto. Para mim, isso que está acontecendo é apenas uma gota d'água diante do problema real, muito mais amplo'.
Alagoano de Maceió, Djavan foi considerado um sambista na época em que gravava na Som Livre. Este seu segundo trabalho revela o lado nordestino de sua música, em faixas como Alagoas e Estória de Cantador, esta última baseada na tradição e na linguagem do cordel. Ele demonstra ser também um bom cantor e compositor romântico da música na bela e sensual Álibi, que Maria Bethânia gravou com honras de faixa-título. Na área do samba, suas harmonias e divisões situam-no no samba numa linha progressiva, ao lado de Gilberto Gil, Jorge Ben, Paulinho da Viola e outros renovadores do gênero.
Participando do Festival Abertura, em 1975
Aos 29 anos de idade (e dez de batalha artística), Djavan acha que existem muitos outros caminhos a explorar. 'Tenho um som essencialmente nordestino, com todas as influências que recebi na região. Coisas que vão de Luiz Gonzaga a Lupiscínio Rodrigues, Angela Maria, e por aí afora. Mas também tive meu grupo de rock, lá pelos 18 anos. Chamava-se LSD (explica, rindo, que o nome se referia a luz, som e dimensão). Quem não cantava música dos Beatles naquela época? O jazz veio depois, junto com a Bossa Nova. E comecei a compor em cima de tudo isso, meio de brincadeira, até que resolvi ganhar o mundo.'
No tempo da Som Livre, Djavan gravou trilhas de novelas, sempre cantando músicas de outros compositores. Em seguida veio o festival Abertura, onde ele se classificou em segundo lugar, com Fato Consumado, e gravou um compacto duplo, bastante executado. Seu primeiro LP mostrava sua preocupação com o lado instrumental. 'Explorei muito o violão, e o pessoal achou interessante. Mas aí fiquei sentindo, sem querer admitir, que isso não era o que eu queria, não era só aquilo que eu tinha pra mostrar. Sou uma pessoa mais inconstante, mais circunstancial.'
Grandes mudanças de lá para cá, consequência de seu amadurecimento pessoal e artístico, mostram hoje um compositor preocupado com músicas que mostrem também o cantor, não apenas o instrumentista. Hoje, Djavan mora em Vila Isabel, tranquilo bairro carioca da Zona Norte. Lá ele encontra o clima das peladas de rua e das conversas de botequim às quais se habituou durante sua infância, em Maceió. 'Hoje em dia as pessoas conversam muito pouco.', ele se queixa. 'Acabou aquele negócio de chegar na esquina, trocar ideias, saber o que as pessoas estão pensando. E eu preciso saber disso, minha música é isso. As coisas estão aí, pelo ar. Quem chegar primeiro pega.'


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