Palavras Domesticadas

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sábado, 9 de janeiro de 2021

Made In Brazil: "Rock Não se Discute. É Ouvir e Dançar"


 Em 1976 a banda Made In Brazil lançava mais um disco, o segundo de sua carreira, Jack, o Estripador, e o suplemento Hit Pop, que vinha encartado na revista Pop, trazia uma matéria e entrevista com a banda:

"Eles formam, certamente, o grupo mais discutido do pedaço. Muita gente os acusa de fazerem música estrangeira, muitos os defendem dizendo que a música não tem pátria: é uma linguagem internacional. Mas, se há discussão, é porque o grupo é importante e está despertando a atenção do público.

Ano que vem, o Made in Brazil estará completando dez anos de estrada. No rock brasileiro, só os Mutantes possuem essa experiência. Mas, ao contrário dos Mutantes, a música do Made sempre teve a mesma filosofia: o rock não comporta complicações nem considerações teóricas, foi feito para dar alegria e fazer dançar.

Há dez anos atrás, os irmãos Oswaldo e Celso Vechione eram garotos que ouviam Elvis Presley, Neil Sedaka e, principalmente, os Rolling Stones. Pelas esquinas do bairro paulista da Pompeia, Oswaldo e Celso conversavam e imaginavam a vida daqueles caras que estavam sacudindo o mundo, dando um susto no universo com sua música. A semente do rock já estava nos dois irmãos, prestes a se transformar no próprio sentido de suas vidas. Em 1963, Celso descolou um violão e resolveu estudar música numa escola. Mas não deu pé. 'Eu só consegui aguentar umas três aulas' - ele diz. 'O problema para quem quer aprender rock na escola continua o mesmo até hoje. Os professores querem ensinar o que ninguém quer saber - uns sambinhas muito chatos.' Três anos mais tarde, os dois irmãos conseguem finalmente uma guitarra marca Rei, comprada de segunda mão por Cr$ 120,00. Logo depois pintaram um baterista e um vocalista. O próprio Oswaldo construiu o seu contrabaixo, e um primo emprestou os amplificadores. Agora só faltava um nome para o conjunto. E entre Pink Pigs e Beat Up, os dois preferiram o nome definitivo: Made In Brazil. No começo de 67, depois de seis meses de ensaios, o grupo se considerava pronto. O repertório incluía músicas dos Troggs (Wild Thing), Kinks, Animals e muita coisa dos Rolling Stones.

A primeira apresentação pública aconteceu no programa de Julio Rosemberg, no canal 4. Depois, fizeram temporadas pelas barras mais estranhas de São Paulo, como a boate Bob's, na rua Augusta, que acabou sendo fechada pela polícia. Nessa época, os shows do Made tinham sempre Caetano, Gil e Gal como espectadores.

Em 1974 o Made lançou seu primeiro LP, chamado simplesmente Made In Brazil. Mas mil grilos de produção atrapalharam a divulgação e execução do disco. Oswaldo depõe:

- O empresário Mario Buonfiglio, que na época cuidava dos nossos negócios, resolveu nos apresentar à gravadora RCA como se nós fôssemos o novo Secos & Molhados. Naquela época, todas as gravadoras estavam procurando um conjunto jovem, que repetisse o fenômeno de vendagem dos Secos & Molhados. Mas nós nunca tivemos nada a ver com o som dos Secos & Molhados. O nosso negócio é rock, um rock alegre e despretensioso, feito para dançar. Aí a gravadora nos fez um adiantamento, em dinheiro, pensando que o disco fosse estourar. Mas não era nada disso. O nosso público, fundamentalmente, é de concertos ao vivo. O disco vendeu bem, mas ainda estamos devendo dinheiro à gravadora.

- Não há dúvidas que o Mario Buonfiglio sabe vender rock. Mas ele vende rock como poderia estar vendendo galinha na feira, se desse mais dinheiro. Ele é um comerciante.

Agora, o Made In Brazil acaba de lançar seu segundo LP, chamado Jack, o Estripador. O disco reafirma, de maneira brilhante, as características do som do Made. Celso explica:

- O objetivo do nosso grupo é quase didático. Todo mundo fala que o rock está estourando no Brasil, mas são poucos os grupos que tocam o rock verdadeiro. A criançada vai aos concertos e só escuta uma caricatura dos grupos estrangeiros mais pretensiosos e classicosos. Resultado: ninguém se diverte e o clima é mais de velório que de festa. O Made quer que a garotada dance, se esbalde com a grande farra que fazemos. Quem não precisa, hoje em dia, de um bom exercício muscular?

Atualmente, o Made In Brazil está trabalhando sem empresário. O próprio Oswaldo faz os contatos, vende os shows e coordena a equipe técnica e de produção. E desse modo, estão ganhando mais popularidade do que nunca. Segundo Oswaldo, o Made não encontra seu público nos mesmos lugares que os outros grupos brasileiros encontram:

- Não interessa ao Made ficar tocando em teatros e pequenas casas de espetáculos, para 400 ou 500 pessoas, que têm de ficar sentadas nas poltronas. O nosso público está nos grandes ambientes, salões e clubes. onde está todo mundo a fim de dançar e se divertir. Para nós, o rock não pode ser julgado nos mesmos padrões dos outros gêneros musicais, não se pode teorizar sobre o rock, pois ele é uma relação entre o som, o corpo e os sentidos. Nos teatros, o público tem que ficar atento por quase duas horas, e acaba se aborrecendo. O Brasil é o país do samba, e a única coisa que pode competir com o samba é o rock dançado. Aliás, samba e rock têm tudo a ver um com o outro...




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