"Ele falava dos mangues, dos que lutavam para sobreviver na lama e do caos da cidade de Recife. Num gesto mais do que louvável tentava resgatar o que o 'desvario irresistível de uma cínica noção de progresso' estava destruindo, os manguesais. Ele fazia da música a mistura de ritmos expressivos da cultura pernambucana, como maracatu e repente, o instrumento dessa luta. A coisa tomou tanta força e criou uma identidade própria que foi chamada de movimento mangue beat. Ele era Chico Science, cantor e compositor pernambucano morto num acidente de carro no dia 2 de fevereiro deste ano.
Francisco de Assis França, seu verdadeiro nome, tinha 30 anos e estava numa fase de plena produção. Participou de várias trilhas de filmes brasileiros, destacou-se em festivais internacionais na Europa, tinha participação prevista no Heineken Concerts em abril deste ano e sua presença no carnaval de Recife e Olinda (esta no bloco Na Pangada do Ganzá, do ator e músico Antônio Nóbrega) seria certamente uma das melhores atrações da festa.
Essa fase de muita produção começou com o primeiro disco, Da Lama ao Caos, em 1994. Uma das faixas do disco, a música A Cidade, foi incluída em uma das novelas da Rede Globo, o que, claro, ampliou os horizontes de Chico e seu grupo, o Nação Zumbi.
Chico Science e Nação Zumbi |
No dia do acidente Chico estava na casa de sua irmã Gorete. Passou a tarde descansando para depois assistir à apresentação da agremiacão A Cobra Alada, ao lado de alguns amigos e parceiros de trabalho. Costumava andar com um carro enorme, um Landau 79, segundo ele 'uma forma de ironizar a repressão da ditadura militar'. Mas naquele dia usar um carro menor, mais fácil de estacionar, seria melhor. Chico saiu então no Fiat Uno da irmã. Na estrada que liga Recife a Olinda aconteceu a fatalidade. O carro do cantor chocou-se contra um poste e ele morreu a caminho do hospital.
A repercussão do acidente foi enorme, comoveu o meio artístico e muitos jovens do país. Mais de dez mil pessoas estiveram no velório. Polêmicas à parte, o secretário da Cultura de Pernambuco, Ariano Suassuna, que fazia duras críticas ao movimento mangue beat, esteve presente e ficou muito comovido coma morte de Chico. O governador pernambucano Miguel Arraes decretou luto oficial de três dias."
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