Palavras Domesticadas

Palavras Domesticadas

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Waldir Serrão, o Amigo de Fé de Raulzito


Não é exagerado afirmar que o baiano Waldir Serrão é uma lenda viva do rock brasileiro. Waldir foi amigo de adolescência de Raul Seixas em Salvador, e foi de grande importância na vida de Raul. Numa excelente matéria sobre Raul, escrita nos anos 70 pela jornalista Ana Maria Bahiana, Waldir Serrão é lembrado com grande destaque:

Raul: "Eu conheci um cara chamado Titó. Ele ficou entusiasmado quando eu lhe mostrei o que era rock, como se dançava. E ele me disse: 'Olha, tem um cara que mora aqui perto da fábrica, é um cara humilde mas ele tem mais discos que você, manja paca de rock, gosta de Elvis Presley'. Eu fiquei maluco e disse: 'Traga esse cara aqui.'"
Era Waldir Serrão. Daí em diante figura onipresente na vida do rocker Raul em Salvador, incentivador do rock, promotor de bailes e concertos. O encontro entre Raul e Waldir não está em nenhuma foto, mas ficou inteiro, plástico na memória de Raul:
"Esse encontro foi fantástico. Eu me preparei todo, botei a gola pra cima, engomei o cabelo, botei o topete, porque sabia que Titó ia trazer Waldir Serrão de tarde. Fiquei esperando ele mascando chiclete, pra mostrar que eu era mais cool. Ele chegou da mesma forma. Foi aquele aperto de mão assim de rock, sabe, meio de banda, aquela coisa de juventude transviada, James Dean, o maior barato."
Com Waldir, Raul rompe as paredes do quarto e vai de vez para a rua, para a gangue, a esquina, a arruaça. "A gente procurava briga na rua, quebrava vidraça e roubava bugigangas nas lojas, como nos filmes. Eu não gostava muito daquilo, mas como o rock estava ligado a uma maneira de ser (ou pelo menos eu pensava), eu ia na onda."

Waldir virou radialista e apresentador de tv em Salvador, e acompanhou a trajetória de Raul, o crescimento de sua carreira, e a transformação do amigo em mito, muitos anos depois. A amizade dos dois, segundo o próprio Waldir, "durou até quando ele se foi." Como radialista, usava o apelido de Big Ben (não sei se em homenagem ao lendário Big Boy). Waldir também se arriscou na carreira de cantor. Na foto que ilustra essa postagem, Waldir aparece cantando na tv, com a legenda: " O jovem Waldir Serrão, adepto do rock, está em plena ascenção artística. Seu primeiro disco, Pare e Pense (Waldir Serrão - Joceval Costa Lima) & A Qualquer Hora (Mauro Motta - Raul Seixas) lançado pela CBS, já se encontra nas paradas de sucesso. E ele está terminando seu primeiro livro: A Criação ou Eu, o Rock, que será lançado durante um Concerto de rock no Estado da Bahia"
Essa ilustração é de um recorte de 1971 da revista O Cruzeiro, e faz parte de meu acervo particular. Nessa época Raul era apenas um produtor da CBS, e lançou esse compacto simples do amigo, inclusive com uma composição sua em um dos lados do disco.
Em ampla matéria publicada na revista Rolling Stone, em agosto do ano pasado, sobre os 20 anos da morte de Raul, Serrão é citado em alguns trechos, como não poderia deixar de ser. A citação a ele termina dizendo: "Lenda do rock brasileiro, Waldir "Big Ben" Serrão sobrevive a duras penas, desde que perdeu seu emprego apresentador na Tv Itapoã, aos 67 anos, enfrentando problemas de saúde."

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O Grito Primal


Um livro bastante interessante é O Grito Primal, do psicólogo americano Arthur Janov. Tomei conhecimento da Teoria do Grito Primal, desenvolvida e aplicada por ele, através de John Lennon, que se submeteu a essa terapia para se livrar de traumas de infância, como o abandono do pai, problemas mentais de sua mãe, e a morte dela por atropelamento após voltarem a se verem com mais frequência já em sua adolescência - ele fora criado por sua tia, Mimi. Como o próprio nome diz, essa terapia é baseada no uso do grito, como uma forma de expulsar traumas. Os reflexos desse tratamento em sua música ficaram explícitos em duas de suas músicas: Mother e Cold Turkey, em que ele ao final, vai soltando a voz gradativamente, até explodir em gritos selvagens.
O livro foi lançado em 1970 nos Estados Unidos, e em 1974 no Brasil. A edição que tenho eu adquiri em 2002, na segunda Bienal do Livro de Campos por módicos 7 reais.
A obra esclarece ao leitor vários pontos básicos da teoria, e faz relatos de vários casos em que a terapia foi usada com sucesso. Um dos pontos básicos da teoria é a localização das Dores Primais e suas origens. "As Dores Primais vão-se armazenando uma a uma em lâminas empilhadas de tensões que procuram libertar-se, mas isso só pode acontecer desde que haja ligações com suas origens. Não será preciso reviver cada incidente, mas é preciso que exista a sensação geral ligada aos acontecimentos".
Sobre a relação paciente x terapeuta, o livro diz: "Na Terapia Primal o paciente é um aliado. Sua Dor (sempre grafada em maiúscula) já esperou tanto tempo que, geralmente, deseja vir para a superfície."
Logicamente, um profissional da área tiraria maior proveito da obra, que tem 427 páginas, mas eu, como leigo no assunto, achei uma leitura interessante e agradável.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Diálogos Metafísicos do Terceiro Milênio


O desenho da ilustração faz parte de uma série que denominei de Diálogos Metafísicos do Terceiro Milênio. Ao conrtário do que pode sugerir o título, essa série foi criada bem antes da virada do milênio, pelo menos uns 15 anos antes. Na época até cheguei a fazer uma revista artesanal, que hoje revendo, vejo como eu desenhava mal. Depois, contunuei produzindo eventualmente, sempre com dois caras levando uns papos meio malucos. Na revista que eu fiz, nos anos 80 havia um prefácio que foi escrito de improviso por um amigo chamado Cláudio Roberto, enquanto tomávamos cerveja em um bar. Ele escreveu num guardanapo e me deu.Então resolvi incluir na revista. Eis o texto em forma de poema:

Diálogos Metafísicos do Terceiro Milênio
não é nada sério
São só dois caras
a procura de um ideal
Um paranormal
Um cara que veja além do além
e atrás do além vem outro além
Além disso,
tudo bem

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Memórias Televisivas



O primeiro aparelho de tv que minha família teve foi comprado por meu pai quando eu tinha cinco anos. Até então eu assistia tv na casa de um tio. Naquele tempo não era qualquer família que tinha o privilégio de ter um aparelho de tv em casa.
Em Campos só entrava o sinal da Tv Tupi, canal 6. Lembro que gostava de ver a linha de shows, que vinha depois do noticiário, o Repórter Esso, que era apresentado pelo locutor Gontijo Teodoro. Antes do terlejornal passava um programa curto, de uns 10 ou 15 minutos, chamado Diário de Um Repórter, apresentado por Alberto Cúri, irmão do locutor esportivo Jorge Cúri e do cantor e showman Ivon Cúri. Esse programa trazia uma crônica diária escrita por Davi Nasser, um simpatizante do governo militar e da ditadura. Eu detestava esse programa, não pelo caráter político, já que eu não entendia nada do assunto, mas porque eu achava muito chato ver aquele cara falando aquelas coisas que eu não entendia nada. Antes do locutor ler o texto do dia, ele citava todas as emissoras afiliadas da Tv Tupi que retransmitiam o programa. A Tupi foi o primeiro canal a atuar em rede. Eu achava que aquelas emissoras que eram citadas fossem modelos de aparelhos de tv, então pensava comigo: “Tomara que a televisão que papai vai comprar não seja dessas que passam esse programa”. Depois do Diário de Um Repórter entrava o Repórter Esso.
O telejornal da Tupi era o mais assistido da época. A televisão ainda tinha muitas limitações. Por exemplo, não havia transmissões por satélite. Isso significava que não se podia ter imagens das matérias internacionais. Essas imagens só chegavam dias depois. O que havia eram fotos, que chegavam não sei através de que meio, mas eram chamadas de “Radiofoto UPI”, e eram as mesmas fotos que saiam nos jornais no dia seguinte. Lembro que às vezes passavam imagens de gols de campeonatos internacionais, principalmente o inglês. Eu achava o futebol deles bem mais corrido que o nosso. Via uma correria desenfreada. Antes de encerrar o jornal, e dar a última notícia, o locutor anunciava: “E eis a notícia final!”. Eu aguardava ansioso essa hora, pois o telejornal, que eu achava chato, iria enfim terminar. Depois de ler a última notícia, o locutor se despedia com a frase: “Muito obrigado, boa noite e até lá!”. Aí então começava a festa pra mim. Começavam os programas da linha de shows, que eram geralmente humorísticos. Quase todo dia tinha programa de humor, que eu adorava.
Quando meu pai comprou nosso primeiro aparelho de tv foi uma festa em casa. Era uma tv da marca Hotpoint, que com o tempo começou a apresentar constantes defeitos. Só vivia na oficina. Logicamente eu e meus irmãos adorávamos ver os desenhos animados. Os desenhos na época, não sei porque, não eram dublados, eram em inglês mesmo. A gente não entendia o que se falava, mas não se importava. Desenhos do Popeye, Pica-Pau, Faísca e Fumaça e tantos outros a gente assistia com o som original mesmo. Só os Flintistones, por algum motivo, eram dublados. Alguns outros desenhos que vieram depois, como os Jetsons e Manda-Chuva já passaram a ser dublados, mas isso foi um pouco mais tarde. E assim foram meus primeiros contatos com a babá eletrônica.

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Pensamentos Voadores



Muitas vezes certas ideias passam por minha cabeça e não fazem parada. Saem voando e não obedecem a nada. Sobrevoam o espaço de pensamentos procurando pontos de afinidade com outras ideias de outras cabeças. Saem driblando os raciocínios lógicos, que como recrutas de um exército de uma lógica existencial, são guiados por ordens superiores vindas de uma cadeia de pensamentos que obstrui o fator surpresa de uma falsa lógica. Ideias sem lar não são como menores abandonados, e sim andarilhos conscientes que traçam seu rumo a partir da marca de seus passos. Às vezes as palavras entram em minha cabeça, e antes que saiam pela boca, se perdem no silêncio da não-pronúncia, e simplesmente não cumprem seu papel na comunicação verbal em sua troca de pensamentos e ideias. As palavras ditas em hora imprópria, muitas vezes são como o fio condutor de uma corrente elétrica a estremecer e atormentar um corpo indefeso. As palavras pensadas em hora imprópria, e não pronunciadas, é como cometer o criminoso pênalti desnecessário, e o juiz não marcar. Quem sabe se alguma ideia brilhante que me fugiu como o pássaro da gaiola denunciando com seu voo o meu descuido, venha cantar em minha janela, e me fazer crer que tudo é apenas uma questão de esperar que o momento propício das oportunidades nos alcance, e nos ilumine.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Revolver, de Walter Franco - texto do encarte do vinil


Em 1975, o compositor Walter Franco lançava um dos melhores discos de música brasileira que já ouvi, Revolver (não confundir com Revólver). Na edição em vinil, a capa trazia abaixo do nome do artista e do título do álbum, os respectivos nomes em braile, além de na contracapa trazer também em braile a palavra sim. Segundo Walter, a palavra SIM escrita em braile era para passar uma mensagem positiva caso algum cego pegasse em seu disco. Na parte interna havia um encarte com as letras, fotos, uma frase de Gandhi, e um texto do próprio Walter Franco. Como a edição em cd (que eu também possuo) não traz essas coisas, resolvi transcrever o texto de Walter, que faz parte do álbum.

"Não fique mudo agora. Intuição sabe que me pega e me faz sair para a rua de novo. Isso já vai pra dois anos e tanto mas eu gosto mesmo é do número três. Soma. A palavra exata é sim. Toma ar. E eu vou mostrar a minha música como quem joga bolas de gude talvez porque eu tenha uma estória assim. Era uma vez um menino que passava o tempo todo ouvindo os toques de um sino de uma igreja toda branca diferente das outras igrejas dos outros planetas onde outros meninos que gostavam de embocar bolas de gude nos buracos redondos que eles mesmos faziam e eles mesmos... mas essa estória eu sei vai terminar fazendo nenhum barulho porque o silêncio é uma coisa santa mas hoje não consigo então vou tocar e vou mexer muito com as palavras e com as pessoas porque me ensinaram que aoi significa azul em japonês."

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Um Abraço em Dedé Mijanguijuaça


Entre a semana retrasada e a passada me encontrei com Nepomuceno, que mora a três quadras e meia de Dedé Mijanguijuaça. Conversamos muito sobre ele, e fizemos análises abalizadas, partindo de diferentes pontos de vista, que se entrelaçavam de forma harmoniosa, significativa, esclarecedora, emocional e analítica, envolvendo opiniões e conceitos pessoais e interpessoais. Ao fim enviei através de Nepô um grande abraço a Dedé. Encontrando com Dedé dias após, perguntei-lhe se ele havia recebido o abraço. Dedé Mijanguijuaça me respondeu que não, e pediu para que lhe enviasse novamente, desconfiado que houve algum problema. Sendo assim, irei procurar Nepomuceno e novamente enviar-lhe um abraço. Às vezes esses problemas ocorrem.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

O Carnaval de Dedé Mijanguijuaça


Dedé Mijanguijuaça é carnavalesco, e carnavaliza de modo igualmente carnavalesco. Houve um carnaval inesquecível em que ele, cinco dias antes, comprou uma lata de sardinhas, abriu a mesma, e a deixou aberta até a chegada dos festejos de momo. Ficou um cheiro insuportável de peixe estragado. Então ele pegou um pote vazio de margarina, fez dois furos, por onde passou um elástico e o prendeu pelo queixo, e saiu com as sardinhas apodrecidas sobre a cabeça. Se divertiu saindo com aquele aroma, e abraçava as pessoas com carinho. Carnaval é diversão, é alegria, é felicidade, é espontaneidade, é arrebatamento, é solução para pequenos conflitos interiores que podem se dissolver em meio a uma alegria incontida.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Anúncio da Coca-Cola - 1973


Andei fazendo uma arrumação em velhas revistas, e encontrei em uma delas, de fevereiro de 1973 (há exatos 37 anos) esse anúncio da Coca-Cola. O anúncio traz a cena de um grupo de rapazes reunidos no calçadão de Copacabana, à beira-mar. Então passa uma moça, e um deles com a garrafa de coca na mão oferece a ela, que passa sem olhar, e o restante dos caras ficam fazendo gracejos para a coitada da moça.
O engraçado é a pinta dos caras. Todos de roupa social, impecáveis, camisa por dentro da calça, sapatinho, etc. O cabelo dos caras é bem interessante. A cabeleira do segundo da esquerda para a direita é hilária, e a expressão que ele faz não fica atrás. É uma imagem bem típica da época. Já que estão próximos à praia poderiam estar de bermuda, sandálias e camisetas, ou mesmo trajes de banho, mas estão todos bem mauricinhos.
O anúncio foi publicado em pleno verão, e nada justifica aquela roupa de frio que a moça usa e também a jaqueta do cara de calça amarela. É muito engraçado ver esse anúncio hoje.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Pensar livremente

Pensar livremente é interromper fluxos de ideias pré-fabricadas que se convertem em palavras padronizadas que se encaixam em formatos óbvios. É não se deixar prender por conceitos antiquados, desgastados, tolos, pré-primários e burros. É pensar e agir de maneira livre e desamarrada dos laços sociais e comportamentais. É surpreender a si, e consequentemente, a todos que compartilham conosco dos ambientes sociais, desde sua origem até o destino, passando por todos os caminhos que se entrelaçam, e transformam o caminhar em experiências positivas.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Coleção Cantos do Rio


Em 1996 a editora Relume Dumará com apoio da Rio Arte (ógão ligado à Secretaria de Cultura da prefeitura do Rio de Janeiro)lançou uma série de livros chamada Cantos do Rio, em que um cronista convidado falava de seu bairro,de suas vivências e a importância do bairro em sua vida. Não sei ao certo quantos volumes foram lançados. Eu comprei dois, não exatamente por causa dos bairros, mas pelos autores: Aldir Blanc, falando de Vila Isabel e Geraldo Carneiro, do Leblon. Também saíram volumes sobre o Baixo Gávea,centro e Lagoa.
Os livros, no formato pocket book e de poucas páginas (ambos que comprei têm menos de 60), são de fácil e agradável leitura, podendo até ser lidos de uma levada só, não só pelo formato, como pelo texto que prende o leitor.
O texto de apresentação da série diz:
"Cantos do Rio: reflexos, reflexões, visões e revistas, recantos e encantamentos de uma cidade que fascina e inspira nostalgia, sorrisos, arrebatos. Cantos cantados, com lirismo e graça incompatáveis ("canta a tua aldeia, assim serás universal") por poetas e cronistas que esbanjam sensibilidade, humor e maestria na arte de contar".
Seguem dois pequenos trechos dos dois livros.
Vila Isabel - Inventário de Infância (Aldir Blanc):
"Fomos ao quintal. Meu avô encostou a velha escada com manchas de tinta ao lado do tanque e subiu até a caixa d'água.
- Anda, vem ver!
Fui puxado pela mão do gigante até o alto.
Meu avô afastou a tampa da caixa.
- Olha...
A lua cheia se refletia na água quieta.
Ergui os olhos para o céu.
- É a lua!
- Aquela não. Aquela é gelada, feita de pedras, uma espécie de vulcão extinto. Agora, essa aqui, dentro da caixa d'água á lua da Zona Norte. Põe a mão nela... Isso. Viste? É trêmula e tépida como as mulheres."

Leblon - Crônica dos Anos Loucos (Geraldo Carneiro):
Para mim, o Leblon é uma província tão imaginária como a Gália Tropical. Suas fronteiras variam ao sabor do desvario e do esquecimento. Às vezes, durante este relato, o Leblon confinará ao norte com o Jardim de Alah, ao sul com o Paraíso, a leste com o Oceano Atlântico e a oeste com as ficções selvagens de José de Alencar; outras vezes, suas fronteiras serão ainda menos previsíveis. Mas, de uma maneira ou de outra, será um país povoado de sereias e quimeras."

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Gilberto Gil em Show Empolgante



A prefeitura de São João da Barra encerrou a série de shows dominicais de verão no Novo Balneário na praia de Atafona com um de nossos maiores ícones musicais: Gilberto Gil. Não se pode deixar de elogiar o critério de bom gosto que foi adotado para os shows programados para o local, privilegiando a boa música acima de tudo. O grande público que prestigiou a todos os shows deixa provado que não é necessário apelar para shows mais populares e de gosto duvidoso para atrair turistas e tudo que vem em consequência. O show de Gil é uma prova disso.
De toda a programação, que trouxe Maria Rita, Nando Reis,Roberto Frejat, Leila Pinheiro & Roberto Menescal e Rita Lee, o show de Gil é o que eu aguardei com mais expectativa. Gil foi um dos meus ídolos de adolescência, e não dá pra fazer uma análise isenta e distante do fator emoção. Lembro do primeiro show de Gil que eu assisti, aos 15 anos, quando ele estava lançando o clássico Refazenda, e todos os outros que eu viria a assistir depois, em fases diferentes de minha vida, e sempre com um toque especial de emoção. O show desse domingo não foi diferente.
Gil e sua banda subiram ao palco para um show que trouxe como base seus grandes sucessos e algumas de suas música mais representativas. Abriu o show com Tempo Rei, uma música que não chega a ser um de seus maiores sucessos, mas uma música emblemática, que ele sempre coloca em seus shows, e que inclusive dá título a um documentário sobre sua vida em sua terra natal, Ituaçu, lançado nos anos 90. Sua presença no palco, seu carisma e musicalidade já previam nesse primeiro contato com o grande público, que em seu show não faltaria empolgação e músicas de forte apelo. Em seguida, uma sequência de reggaes que ia cada vez mais conquistando a plateia: A Novidade, Não Chore Mais, e Is This Love ,de Bob Marley. Após uma breve explanação sobre o samba, principalmente em seu universo de menino baiano, onde o samba de roda tem muita força, principalmente na região do Recôncavo Baiano, Gil inicia uma sequência de sambas: Andar com Fé, Aquele Abraço e Chiclete com Banana, gravado por ele no histórico disco Expresso 2222.
O ritmo tipicamente nordestino, baião, xaxado e forró, outra forte influência em sua obra seria representado por Não Grude Não (do cd Banda Larga e Cordel) e Esperando na Janela. A cada nova música, todas de grande sucesso, o público se empolgava mais, e Gil bem à vontade no palco, mostrava sua diversidade musical em diferentes ritmos, como a reflexiva A Paz, o rock de Punk da Periferia, e uma série de sucessos como Vamos Fugir, Realce, Palco, Madalena, Toda Menina Baiana, etc.
Em shows como esse, de um artista com tantos sucessos e um trabalho tão amplo, sempre fica faltando algumas, ou muitas músicas, que não caberiam nos cerca de 90 minutos de show. Assim ficaram de fora, por exemplo, Expresso 2222, Refazenda, Procissão, Drão, Super Homem, etc. Daria até pra fazer um novo set-list só com obras primas que ficaram de fora.
É bom ver nosso ex-ministro novamente no lugar onde sempre se sentiu mais à vontade, no palco, junto a seu público, e nos brindando com sua arte, talento, musicalidade e carisma. Salve Gil!

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Amaro Tem-Tudo


Amaro Tem-Tudo sabe do que gosta, e em sua ideia os fatos se entregam e se integram, e sua voz pronuncia palavras sem compromisso com coisas reais em momentos de bate-papos, quando determinadas afirmativas aleatórias ganham status de verdades inquestionáveis, pelo menos em sua mente, que sabe viajar pelos limites entre verdades e mentiras. Dessa forma as frases atingem seus objetivos, que em nada se comprometem com o que as pessoas poderão achar. Além do mais, meu nego, limites podem servir de aliados ou algozes, dependendo de contextos a serem analisados sem compromisso, porém com um alto grau de espontaneidade para se refletir longe de devaneios que afugentam qualquer possibilidade de virarem integrantes de momentos pretensamente lendários. A falta de qualquer tipo de compromisso com preocupações relativas à recepção de frases pelas pessoas que irão estabelecer diálogos, e que no momento da pronúncia das frases em questão, que virão repletas de falsas verdades colocadas na mesa de negociações dos conceitos futuramente expostos pelos interlocutores, nada mais serão que frases jogadas ao vento como cinzas de cigarro se espalhando pelo ar numa tarde de vento na montanha.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

A Passagem de Brigitte Bardot por Búzios em 1964




Muito se comentou, e ainda se comenta sobre uma viagem que a atriz francesa Brigitte Bardot fez ao Brasil, em 1964, no auge de sua fama e beleza. Brigitte era na época um dos nomes mais badalados de jet set internacional, e logicamente, por onde andasse, era notícia. No final do ano de 64, ela e seu namorado vieram passar o Natal no Brasil, e na época visitaram Búzios, até então uma simples aldeia de pescadores, mas com um visual deslumbrante. Essa passagem por Búzios foi muito comentada, e anos mais tarde até foi erguida uma estátua da atriz na famosa praia.
Em 2004, quando se completaram 40 anos dessa sua passagem por Búzios, a prefeitura local resolveu homenageá-la, convidando-a para retornar ao balneário e receber as devidas homenagens, até pelo fato de Brigitte ter com sua presença promovido o crescimento e o turismo da região. Ao receber o convite, Brigitte respondeu agradecendo, mas dizendo que não se lembrava daquela passagem por Búzios, para desapontamento de muitos. De fato, para alguém que tinha uma vida tão corrida, e fez inúmeras viagens não só a turismo como também profissionais, é até aceitável que não se lembrasse de um passeio realizado há 40 anos em uma pequena aldeia de pescadores em um país distante da América do Sul.
Porém, lendo seu livro de memórias, um grosso volume de mais de 600 páginas, “Iniciais BB - Memórias” (Scipione Cultural), vê-se que ela se lembra muito bem daqueles dias em Búzios. Eis alguns trechos de seu relato:
“Aquele pequeno desvio pelo Brasil me fez muito bem.
Tornei a ver os alegres amigos de Bob (seu namorado), o apartamento ainda sujo, mas agora familiar, Penha, a empregada, uma negra gordona, adorável, a mãe de toda aquela turma de avoados, Jorge Ben, o rei incontestável da bossa nova veio tocar violão para me alegrar. Bebia-se cachaça.
No dia seguinte, nosso amigo Denis Albanese e sua mulher Dolores levaram-nos em seu barco para visitar as ilhas perdidas, selvagens e intactas de Angra dos Reis.
O barco era pequeno, era um veleiro, éramos oito a dividir entre risos uma única cabine.
Depois de alguns dias inesquecíveis passados tal como Robinson Crusoé entre terras virgens, céu puro e mar morno, depois de ter ficado irreconhecível por causa do excesso de sol, das picadas dos insetos e do sal que queimara meus cabelos e minha pele, mais parecida com uma índia do que com uma estrela, Bob achou que hora de irmos a Búzios passar alguns dias indispensáveis para eu voltar ao meu aspecto inicial antes de enfrentar o duro trabalho que me esperava.
Passamos o Natal em Búzios, na casa de Ramon Avellaneda, cônsul da Argentina no Brasil, e de sua mulher, Marcela.
Na noite de Natal, depois de ter decorado e disfarçado uma palmeira de árvore de Natal cheia de bolas, de guirlandas e de papais noéis muito vestidos, que pendiam tristemente no lugar dos cocos, depois de de ter enchido de presentes de todos os tipos os nossos sapatos, ou melhor, chinelos e sandálias, à guisa de Missa do Galo, fomos todos tomar banho de mar.
Eu guardo uma estranha lembrança daquele único Natal “diferente dos outros”. Daquele Natal ao contrário, ao contrário das tradições, com aquele calor e aquele ambiente diametralmente oposto a tudo o que simboliza o Natal.”

Pois é, a descrição detalhada, nome de pessoas, e palavras e expressões como “dias inesquecíveis”e “eu guardo uma estranha lembrança” provam que Búzios não se apagou de sua lembrança.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Jorge Ben plagiado por Rod Stewart



Em 1979 Rod Stewart emplacou um grande sucesso com a música Do Ya Think I'm Sexy?, uma parceria sua com o baterista Carmine Apicce. Porém o refrão da música era uma cópia descarada de Taj Mahal, de Jorge Ben, que na época ainda não havia adotado o Benjor. Quem conhece as duas composições sabe que não estou exagerando. Para não ficar dúvidas sobre o processo que correu na época, e todo o desdobramento que o caso ganhou, transcrevo aqui parte da matéria que saiu sobre o assunto na revista Música nº 33, daquele ano, cujo detalhe da capa ilustra essa matéria.

“Depois de muitas discussões e provas, foi dada causa ganha a Jorge Ben sobre a autoria da música de Rod Stewart “Do Ya Think I'm Sexy?”, de seu último disco. Pegando de surpresa o próprio Jorge Ben, que não acreditava, modestamente, no plágio, também, por sua vez, não lhe rendeu dinheiro algum, pois os lucros desta música estavam doados à UNICEF(órgão da ONU destinado à proteção de crianças no mundo) – em reconhecimento ao Ano internacional da Criança.
Assim que todo mundo escutou a música de Rod, logo se lembrou que havia, no Brasil, uma música parecida, de Jorge Ben. Pois é, essa música era Taj Mahal. E foi aí que tudo começou. Uma discussão em torno de um possível plágio, incluindo um processo da gravadora em cima do próprio Rod Stewart.
Esses casos de plágio há muito são comentados, discutidos, mas pouco são levados a cabo, muitos acabam morrendo diante de um obstáculo terrível: a prova. Para efeitos legais, para provar o plágio são necessárias cinco notas comprovadamente iguais. Todas elas juntas numa mesma frase musical, e dispostas num mesmo tom. No caso de Rod Stewart há alguns agravantes. Antes de lançar seu disco, Rod já tinha visitado o Rio de Janeiro, ouvido muita música brasileira, visto o próprio show de Jorge Ben, num teatro carioca, além de muitos outros shows de músicos brasileiros.
Questionado, Rod procurou passar a bola adiante, tirando o seu da seringa: “Na verdade, nessa música eu só coloquei a letra. A música foi composta pelo meu baterista Carmine Apicce (que, diga-se de passagem, não esteve no Brasil com Rod).
Processo levado à frente e ganho. Seis países do mundo deram causa ganha a Jorge Ben, mas o dinheiro que é bom, ele não vai ver nenhum. Isso porque desde o lançamento do disco de Rod Stewart, já tinha sido programado que todo e qualquer dinheiro arrecadado seria doado à UNICEF. Assim, a única obrigação de Rod Stewart será dar o crédito musical a Jorge Ben e aprender a lição.”

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Poeta Augusto de Campos fala sobre a Tropicália



Nem todos compreenderam ainda, no Brasil, a atuação do grupo da Tropicália. Caetano, Gil e seus companheiros se utilizam de uma metalinguagem musical, vale dizer, de uma linguagem crítica, através da qual passam em revista tudo o que se produziu musicalmente no Brasil e no mundo, para criarem conscientemente o novo, em primeira mão. Por isso seus discos são uma imprevista colagem musical/literária, onde tudo pode acontecer e o ouvinte vai, de choque em choque, redescobrindo tudo e reaprendendo a “ouvir com ouvidos livres”, tal como Oswald de Andrade proclamava em seus manifestos: “ver com olhos livres”.
Os compositores e intérpretes do Grupo Baiano nem ignoram a contribuição de João Gilberto, nem pretendem continuar, linearmente, diluindo as suas criações. Eles deglutem, antropofagicamente, a informação do mais radical inovador da Bossa Nova. E voltam a pôr em xeque e em choque toda a tradição brasileira, bossa-nova inclusive, em confronto com os novos dados do contexto universal. Superbongosto e supermaugosto, o fino e o grosso, a vanguarda e a jovem guarda, berimbau e Beatles, bossa e bolero, são inventariados e reinventados, na compreensão violenta de seus discos – happenings, onde até o melodramático e redundante Coração Materno, do velho cantor Vicente Celestino volta a pulsar com os tiros de canhão da informação nova.

Augusto de Campos, 1969

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Rita Lee em Atafona


Comentar shows de artistas como Rita Lee às vezes se torna uma tarefa um tanto difícil, pois são personagens que modificaram o panorama musical de seu país, fizeram história e se tornaram lendas vivas. É o caso de Rita. Ter feito parte da mais criativa e influente banda brasileira, os Mutantes, e em seguida ter sobrevivido a sua saída do grupo, um tanto traumática para ela, e ter realizado um trabalho solo dos mais marcantes do rock tupiniquim dos anos 70 não é qualquer coisa.
Seus discos dos anos 70, da fase em que atuava com sua excelente banda de apoio, Tutti-Frutti, estão entre o que de melhor já se produziu no rock brasileiro. A partir de 1979, quando dissolveu sua banda de apoio, e passou a compor e até dividir os holofotes com seu marido, o guitarrista Roberto de Carvalho, sua carreira deu uma guinada. Passou a ter um acento mais pop e menos rock, embora suas composições não tivessem perdido o tom irreverente, uma de suas marcas desde os tempos dos Mutantes. Os fãs de antes, como eu, torceram um pouco o nariz, para a nova fase de Rita, pois em suas novas composições faltava aquela pegada rock'n roll, bem característica em seu trabalho. Mas mesmo nessa fase, reconheço, não faltaram boas composições, já que Rita, como todo bom hit maker, nunca perdeu a manha e ainda conseguia aliar popularidade e qualidade. Sem dúvida, nessa fase - nos anos 80 - sua carreira, em termos comerciais, experimentou um crescimento considerável, mesmo sendo ela na fase anterior uma artista de sucesso.
Por isso, os fãs antigos como eu, ou aqueles que não viveram o melhor de sua fase rock'n roll, mas que conheceram depois, e se tornaram fãs, não deveriam esperar que o melhor de Rita fosse apresentado no show. Não me decepcionei porque fui para assistir a um grande show, de alguém que traz toda uma história, e uma carreira marcada por fases distintas.
O show iniciou com Flagra, de sua fase pop, aliás, um de seus maiores sucessos, que foi até tema de abertura de uma novela das sete da Globo. A empatia com o público, que logicamente, em sua maioria era formado por uma geração que conheceu Rita nessa fase, foi imediata. Em seguida, Rita pinçou de seu antigo repertório dos anos 70, uma de suas melhores composições em minha opinião, Luz Del Fuego. Para mim, um assumido fã das antigas, foi o melhor momento do show. A inclusão dessa músic, logo no início, deu a mim a impressão que haveria um equilíbrio entre as duas fases de sua carreira, mas ao longo do show vi que ela preferiu apresentar sua fase de maior sucesso. Não faltaram hits como Chega Mais, Banho de Espuma, Doce Vampiro, Buana Buana, Lança-Perfume, Amor e Sexo e tantas outras. Houve até a participação de um cover de Michael Jackson, fazendo sua performance no palco . Um bom momento do show foi Obrigado Não, uma de suas boas composições da fase recente, quando aproveitou para falar de política, eleições, e dos recentes escândalos de Brasília, não poupando o governador Arruda com um sonoro “filho da puta”, bem merecido, por sinal. Da fase Tutti-Frutti, como não poderia deixar de ser, ela cantou Ovelha Negra, mas ficaram faltando outros sucessos, como Esse Tal de Roque Enrow, Mamãe Natureza, Corista de Rock, Babilônia, Miss Brasil 2000, e tantas outras, além de alguma coisa dos Mutantes.
Em termos de produção, o show esteve impecável, com painéis no fundo do palco, que projetava imagens e efeitos visuais bem interessantes, inclusive fotos de Rita em diferentes fases de sua carreira. Uma chuva de papéis metalizados também proporcionou um belo efeito visual. Uma linda e deslumbrante lua cheia foi uma colaboração extra para o belo visual da noite.
O que falar de um show de Rita Lee? No palco estava uma lenda viva, num show bem produzido que conseguiu levantar o público e fazer um show profissional. Era ela, Rita Lee, e isso basta.