Palavras Domesticadas

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quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

Brian Jones - O que mudou depois de sua morte?


 Nos anos 80 circulava uma boa revista sobre rock, chamada Rock Stars. Era uma revista de formato pequeno, que falava de rock, lançamentos, resenhas de discos, notícias e seções fixas, dentre elas, uma especializada em Rolling Stones, chamada Satisfaction. Em sua edição nº 8, de 1984, a revista traz uma matéria com o controverso ex-membro do Stones, Brian Jones. Discordo de alguns trechos da matéria, principalmente quando há insinuações infelizes que Mick Jagger pode ter dado graças a Deus pelo desaparecimento de Jones, por ser também de temperamento forte e se sentir incomodado por uma espécie de disputa pela liderança da banda. Primeiro, que Brian Jones antes de morrer já não fazia parte dos Stones, portanto, não fazia mais sombra a Mick no quesito liderança. Segundo, mesmo se houve divergências pessoais, sentir alívio pela morte do ex-companheiro seria um grande exagero. Segue a matéria:

"Brian Jones deixou o planeta Terra há 15 anos, no dia 3 de julho de 1969. Ele foi encontrado numa piscina, em circunstâncias que até hoje não foram muito bem esclarecidas. Houve até alguns magazines estrangeiros que questionaram a possibilidade de ele ter sido assassinado. Ora, que motivos teriam para assassiná-lo, por exemplo, seus colegas de conjunto?

Os motivos são poucos, mas não são muito fortes. Um deles é que o Brian Jones era um osso duro de doer. Em outras palavras, um sujeito genioso que insistia muito sobre aquilo que queria e acreditava. E uma das coisas que muito queria e acreditava era a boa música. Pouco antes  de morrer, andava dedicando-se ao aprendizado de outros instrumentos (ele foi o único Stone que apareceu tocando uma cítara, coisa que nunca atraiu seus colegas). Notem que o Mick Jagger demorou vinte anos para aparecer em público co uma guitarra. Se ele tivesse feito isso há quinze anos, teria poupado uma série de manobras ao conjunto.

O fato prático é que, válida a correlação, ou não, depois do desaparecimento de Brian Jones, os Rolling Stones tomaram um rumo mais pop. Até a imagem mudou. De repente, o visual psicodélico cafajestoso, que muitos advogam ter sido anterior ao que os Beatles usavam, foi substituído por terninhos glitter, colants coloridos e (pelo menos em certa época) batons. O único membro que parece ter resistido foi Keith Richards, mas é como diz o provérbio, uma andorinha não faz o que todos verão.

Analisando friamente, quem deve ter dado graças a Deus pelo desaparecimento de Jones foi o Mick Jagger. Ele também é dotado de uma personalidade muito forte e não estava a fim de ser incomodado por ninguém. Por outro lado, Jagger é um dos maiores responsáveis pelo desbunde dos Rolling Stones. Podemos ter uma ideia do que ele acha atualmente do rock, se levarmos em conta o que ele disse no ano passado numa entrevista que foi ao ar pela rede Manchete brasileira. Foram palavras suas: - 'Acredito que o rock está para a música, assim como as ilustrações em literatura estão para a pintura em geral.'

Pense bem; qual o papel das ilustrações que aparecem numa literatura? Se você quiser optar por uma resposta trivialmente óbvia, basta apenas dizer: - 'São ilustrações.' Caso queira ser um pouco mais eufemístico, poderá mencionar que têm o papel secundário de ampliar a compreensão, ocupa um lugar bem próximo no contexto geral do século XX. Terceiro lugar, é graças ao rock que Mick Jagger é Mick Jagger.

Antes de encerrarmos nossa apreciação sobre a era pós-jonesiana dos Stones, precisamos dar uma esticada d'olhos sobre o LP Undercover, em particular sobre as letras. À primeira vista, sensacional. Sensibilidade com os menos favorecidos (parece até coisa de religioso), denúncias da violência e da miséria do mundo, posicionamento em favor da América Latina. Tudo bem, mas quem vai acreditar nisso? Nessas horas é difícil deixar de lembrar daquela paródia que o Frank Zappa fez sobre os Beatles com um disco chamado We Are Only It For The Money ('estamos nessa somente pela grana').

Sinceramente, os Stones podem continuar sendo a maior banda de rock do mundo, mas se o Brian estivesse vivo, hoje, provavelmente estaria esclerosado, ou então acabaria por morrer de desgosto."


 


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