Jorge Mautner é um artista múltiplo. Cantor, compositor, cineasta e escritor, Mautner sempre foi acima de tudo um pensador, que através de seus textos expõe suas visões a cerca de uma série de questões. Autor de diversos livros, sempre instigantes e reflexivos, em 1993 lançava Miséria Dourada, pela editora Maltese. Na época o jornalista Antonio Carlos Miguel comentava o lançamento e traçava um perfil de Mautner, num texto intitulado "O kaos contra o nazismo":
"Mais conhecido por sua atuação na música popular, Jorge Mautner volta à ficção com o livro 'Miséria Dourada' (Editora Maltese). Ele estreou há 31 anos, com o romance 'O Deus da Chuva e da Morte', que lhe valeu o prêmio Jabuti de revelação literária. Nascido em São Paulo, em 1941, filho de judeus vienenses que vieram ao Brasil organizar o repúdio ao nazismo, Mautner sempre transitou entre música e literatura. Em 1958, aos 17 anos, compôs 'O Vampiro', lançada num compacto e duas décadas depois regravada por Caetano Veloso. Neste mesmo ano, o escritor começava a aparecer, através da revista 'Diálogo', do filósofo Vicente Ferreira da Silva.
- A minha música é uma continuação da literatura. As minhas canções são fábulas e nunca deixei de escrever na realidade. Tenho mais de duas mil páginas escritas inéditas - conta o escritor/cantor.
Nos anos 70 ele voltou a publicar, mas 'Fragmentos de Sabonete' (75) e 'Panfletos da Nova Era' (80) estavam mais próximos do ensaio do que da ficção. Agora, além de 'Miséria Dourada', a Maltese programa a reedição dos quatro livros de Mautner lançados nos anos 60: 'O Deus da Chuva e da Morte', 'Kaos', 'Narciso em Tarde Cinza' - que formam a 'trilogia do kaos' - e 'Vigarista Jorge'. Será a oportunidade de os leitores mais novos entrarem em contato com uma literatura que fundia a técnica da escrita automática dos surrealistas, o existencialismo e a influência beatnik, com ecos da juventude transviada dos anos 50. Na época, a crítica ortodoxa repudiou os temas e a postura do jovem 'vigarista'. E, em 1965, ele abandonaria o Brasil.
- Com o golpe de 64, o meu livro foi apreendido. Antes mesmo do Ato Institucional número 5, em 1968. 'Vigarista Jorge' foi o primeiro a ser incurso na Lei de Segurança. Fui então para os Estados Unidos, onde me tornei secretário do grande poeta americano Robert Lowell.
- Com o golpe de 64, o meu livro foi apreendido. Antes mesmo do Ato Institucional número 5, em 1968. 'Vigarista Jorge' foi o primeiro a ser incurso na Lei de Segurança. Fui então para os Estados Unidos, onde me tornei secretário do grande poeta americano Robert Lowell.
Ele voltaria ao Brasil em 1972, depois de uma temporada em Londres, onde conheceu os então exilados Caetano Veloso e Gilberto Gil. A empatia foi imediata, e o período está registrado no longa-metragem, filmado em 16mm, que Mautner dirigiu.
- Quero relançar 'O Demiurgo', filmado em Londres com Caetano e Gil. Ele é muito atual, e inclui dez minutos com Gil completamente nu, que tive que cortar na época. Tem um problema de sincronização, porque ele é em som direto, e o câmera estava 'viajando'. Mas hoje é possível corrigir isso.
Jorge mergulhou fundo no movimento hippie dos anos 60 e 70. Seus sete discos editados - o último foi Pedra Bruta, em janeiro deste ano - mantiveram acesos seus ideais. E o que soava anacrônico nos yuppies anos 80 hoje volta à tona.
- Como pensador e sempre na marginalidade, maldito, eu influenciei três gerações. Não escrevo para agradar, e sim para tumultuar e para revelar. Ao contrário de hoje em dia, que só produzem coisas para bajular, para vender... enfim, perfumaria. O meu ofício de escritor é de revelar, no sentido de Dostoievsky. Também sempre me opus aos concretistas, discordo do formalismo deles. Já a minha influência da negritude vem dos nazistas, que hoje em dia estão em alta absoluta. O meu novo livro trata disso, o 'kaos' contra o nazismo. E o Brasil tem uma missão profunda, se o mundo não se 'brasilificar' ele vai virar nazista. Essa missão do povo brasileiro é profundíssima, porque aqui, embora nós tenhamos uma democracia formal, em parte, é na verdade o único lugar que misturou índio, negro e branco. Daí a grande riqueza e a grande novidade, ainda para o século XXI, da nossa cultura. Por isso cito o tropicalismo, Caetano e Gil. O Brasil é o país mais negro do mundo, mais do que a Nigéria. E também a maior nação de escravos do mundo moderno. Somos a nona potência industrial, e o salário mínimo está abaixo do Haiti. Esta é a tecla básica."
Jorge mergulhou fundo no movimento hippie dos anos 60 e 70. Seus sete discos editados - o último foi Pedra Bruta, em janeiro deste ano - mantiveram acesos seus ideais. E o que soava anacrônico nos yuppies anos 80 hoje volta à tona.
- Como pensador e sempre na marginalidade, maldito, eu influenciei três gerações. Não escrevo para agradar, e sim para tumultuar e para revelar. Ao contrário de hoje em dia, que só produzem coisas para bajular, para vender... enfim, perfumaria. O meu ofício de escritor é de revelar, no sentido de Dostoievsky. Também sempre me opus aos concretistas, discordo do formalismo deles. Já a minha influência da negritude vem dos nazistas, que hoje em dia estão em alta absoluta. O meu novo livro trata disso, o 'kaos' contra o nazismo. E o Brasil tem uma missão profunda, se o mundo não se 'brasilificar' ele vai virar nazista. Essa missão do povo brasileiro é profundíssima, porque aqui, embora nós tenhamos uma democracia formal, em parte, é na verdade o único lugar que misturou índio, negro e branco. Daí a grande riqueza e a grande novidade, ainda para o século XXI, da nossa cultura. Por isso cito o tropicalismo, Caetano e Gil. O Brasil é o país mais negro do mundo, mais do que a Nigéria. E também a maior nação de escravos do mundo moderno. Somos a nona potência industrial, e o salário mínimo está abaixo do Haiti. Esta é a tecla básica."
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