1975 foi um bom ano para Milton Nascimento. Naquele ano ele lançaria um de seus melhores e mais bem sucedidos discos, Minas, além de estar envolvido com outros projetos, inclusive a nível internacional. Quando esta matéria foi publicada na revista Pop, Milton não havia lançado ainda o citado disco, mais falava de alguns projetos paralelos, dentre eles, fazer o lançamento de seu amigo Beto Guedes, que na ocasião só havia participado de uma única gravação: um disco coletivo com Danilo Caymmi, Novelli e Toninho Horta. Beto aliás, participaria de forma destacada no disco Minas, não só como instrumentista, como no dueto vocal em uma das músicas que mais se destacaram naquele álbum, Fé Cega, Faca Amolada.
Abaixo segue a transcrição da matéria:
"Cada show de Milton é um acontecimento em que crianças, velhos e jovens partilham emoções intensas geradas pela música. Aqui, ele fala de como descobriu que não há nada de errado em sua cuca, revela seu grande amor pelas crianças e conta que está escrevendo uma peça musical.
Gosto de fazer shows para estudantes e deixar a cargo deles a organização e divulgação dos espetáculos. Tenho viajado muito pelo Brasil e estou impressionado com a incrível renovação do público. Você pinta no palco e vê gente de 13, 14 anos superlotando o teatro e curtindo o mesmo som. Já o Circuito Universitário não me satisfaz. Esse negócio de chegar de manhã numa cidade, cantar à noite e viajar em seguida não dá pé. Dá a impressão de que a gente está tomando banho em água suja. Prefiro chegar uma semana antes, entrar em contato com o povo do lugar, curtir a cidade, receber e dar o máximo de informações.
Este ano, quero viajar por todo o Brasil cantando minhas músicas. Estou com várias composições novas e ando louco para mostrá-las. Também estou escrevendo uma peça musical junto com Márcio Borges, Ronaldo Bastos e Fernando Brant para lançar Beto Guedes, um compositor e cantor da pesada. É capaz de virar um grande musical, uma coisa incrível mesmo.
Até bem pouco tempo atrás eu morria de medo das pessoas pensarem mal de mim. Fui criado em Três Pontas, interior de Minas, onde os grilos são inacreditáveis. Nunca gostei de gente que vive censurando o procedimento dos outros, pouco se importando com a verdade de cada um. Levei grande parte da minha vida fazendo autocensura, me policiando mesmo. Mas o artista, por sua própria natureza, não pode ficar tolhido por qualquer tipo de censura. Do medo nasce o pânico, e aí a autodestruição vem rápida: bebida, desinteresse, chateação. Então, num dia de extrema lucidez, bati um papo comigo mesmo e percebi que nada havia de errado no meu interior. Tudo o que me conflitava vinha de fora. Aí saquei que a única pessoa que tinha direito a mim era eu mesmo. Daí em diante, fiz só o que achava certo e entrei numa muito boa.
Meu sonho atualmente é comprar uma casa onde possa viver com gente legal, aberta, sem nenhum preconceito e cheia de verdade interior. Minha maior paixão é meu filho Pablo. Eu adoro crianças! Ela mora em São Paulo, com a mãe. Mas estou sempre em contato com ele. Quando me apresentei no Anhembi, em São Paulo, houve um negócio que me emocionou muito: tinha gente à beça e, quando cantei Pablo, os pais ergueram seus filhos nos braços e ficaram cantando e pulando. Uma loucura! Parecia que todos os bebês de São Paulo estavam lá. Menos meu Pablo. A mãe dele teve medo da multidão e preferiu não lavá-lo. Nesse dia, chorei de montão."
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