Os anos 60 significaram uma série de mudanças comportamentais, e o surgimento de uma nova consciência diante de uma série de valores impostos pela sociedade. Nos Estados Unidos, o movimento hippie ganhou projeção, e se espalhou pelo mundo. O ano de 1967 é considerado por muitos como o início do movimento, pois foi naquele ano que começaram a surgir uma série de novos conceitos, e aconteceu um fenômeno que ficou mundialmente conhecido como 'O Verão do Amor". O jovem buscava uma libertação do modelo de comportamento imposto pelo sistema, e a música que se produzia na época, e que era da melhor qualidade, pregava essas transformações. As drogas lisérgicas, assim como as palavras de ordem "paz, amor, liberdade e igualdade" se espalhavam. São Francisco, na Califórnia era a meca do movimento hippie, e o ano de 1967 prometia mudanças no comportamento da juventude.
Em janeiro de 2004 a Revista da MTV nº 33 trazia uma matéria sobre o assunto, em texto de Caio Nehring:
" 'Estamos aqui pra fazer um mundo melhor. Nenhuma censura ou racionalização pode impedir as opções que cada um de nós traz pra nossa situação no planeta. A grande lição dos anos 60 é que pessoas que se importam o suficiente para fazer a coisa certa podem mudar a história. Não acabamos com o racismo, mas acabamos com as leis da segregação. Acabamos com a ideia de que você poderia mandar meio milhão de soldados ao outro lado do mundo para lutar numa guerra que o povo não apoia. Acabamos com a ideia de que mulheres são cidadãos de segunda categoria. Tornamos o meio ambiente um assunto que não pode ser evitado. As grandes batalhas que vencemos são irreversíveis. Éramos jovens, justos, honrados, descuidados, hipócritas, valentes, ingênuos, teimosos, loucos e meio apavorados demais. E estávamos certos." ( Manifesto do Partido Internacional da Juventude - YIP - escrito pelo ativista político Abbie Hoffman).
O espírito do Manifesto do Partido Internacional da Juventude (YIP), escrito pelo ativista político Abbie Hoffman, era o espírito, o sopro da mudança. De São Francisco, nos Estados Unidos, para todo o mundo. O jovem vivia um momento decisivo na busca de formas alternativas de vida. Era 1967, o ano da flor, o ano do Verão do Amor. A juventude queria libertar-se do modelo careta imposto pelo sistema. E o Verão do Amor foi um sonho dentro de um sonho dentro de uma década que reformulou o planeta sob todos os aspectos. Vivia-se uma tremenda guinada comportamental, social e artística, herança dos beatniks dos anos 50, inconformados com a hipocrisia social americana - 'Guera, poluição, moralismo, racismo? Sou contra!'
Na década ocupada pela Guerra do Vietnã de ponta a ponta, slogans de Paz, Amor, Liberdade e Igualdade estavam no peito de toda uma geração. Todos os caminhos levavam a uma São Francisco (Frisco) colorida, onde hippies, liberdade sexual, experiências psicodélicas com LSD, rock & blues elétricos se mesclavam à busca por uma Nova Consciência.
A palavra 'underground' ganhou então novo significado, para além dos subterrâneos do metrô. Underground é contracultura, o que não segue a corrente estabelecida pela experiência humana. Aplicada às artes, abrange o artista independente, que questiona os padrões estabelecidos. Nasce o alternativo, o independente, o feito em casa.
São Francisco e Los Angeles eram a contracultura ao ar livre, ao vivo e em cores. Embalados por uma nova sonoridade e experiências lisérgicas, ao mesmo tempo, queriam retornar às raízes. Um tempo de mochilas nas costas e pé na estrada. Sem destino. Em busca da verdadeira América.
O ideal hippie de volta à natureza, da vida comunitária e do amor livre coexistia com a astrologia, o tarô, a magia, os hare krishna... E vieram os Jesus Freaks, versão hippie dos ideais de Jesus. Surgiram as seitas e mesmo Charlie Manson. Calcula-se que milhões de jovens tinham 'conversado com Deus', por conta de 300 milhões de doses de LSD consumidas entre 1966 e 1975.
De um lado, a sociedade americana marchava contra a guerra e defendia direitos civis iguais. Surgiram os casamentos interraciais, negros e brancos passaram a usar o mesmo ônibus e Martin Luther King, que, como Ghandi, sonhava com o fim da segregação racial, foi misteriosamente assassinado.
De outro lado, fervia o caldeirão do verão em São Francisco e Los Angeles: um caleidoscópio de criatividade sem precedentes no meio de acontecimentos radicais por todo o país.
A linguagem musical, o eterno elo musical, se transformava. De simples coadjuvante rítmica, a guitarra elétrica passa ao centro do palco e revela seus primeiros heróis: Eric Clapton, Jeff Beck e, o maior de todos, Jimi Hendrix.
Jimi Hendrix |
Em uma temporada londrina, Hendrix e banda, a Experience, levam plateias ao delírio. A aparição do guitarrista foi como um Big Bang no universo musical.
Ao pedir licença para beijar os céus, embarcava em viagens coletivas. Esse espírito de celebração ritualística, de improvisações e união entre plateia e palco foi a marca registrada daquela verão.
Tocando exaustivamente nas rádios mundiais, a canção de John Philips, The Mamas and The Papas, vira hino oficial da cidade - 'Se você for a São Francisco, use flores em seu cabelo'.
O primeiro evento grupal da nova tribo foi o Human Be-In em um parque de Frisco. De boca em boca, reuniu 20.000 jovens dançando, entoando mantras e cantando o poder do amor. Para o sistema, tratava-se apenas 'de um bando de gente maluca e pintada dançando pelada no parque'. Poderia até ser. Reunidos, os mestres de cerimônias Allen Ginsberg, o poeta beat, Thimothy Leary, psiquiatra e papa do LSD, o ativista político Abbie Hoffman e o escritor William Burroughs entraram em comunhão espiritual com a massa jovem.
Começava a invasão hippie da Califórnia, que esperava 100.000 até o fim do verão. Concentravam-se no pequeno bairro Haight-Ashbuy, esquina de duas ruas de um antigo reduto negro. Agora, imagine essa massa flutuante misturada a drogas, sexo e rock and roll e você terá ideia da bagunça na 'capital mundial dos hippies'. Acomodações e saúde pública precárias, drogas à vontade, bad trips, overdose, mortes. Havia gente saltando de telhado, achando que podia voar.
Verão é tempo de expansão e os músicos de São Francisco e Los Angeles, assim como os ativistas politicos engajaram-se na criação de novas trilhas musicais.
A música estava no ar, executada a todo volume por bandas como Jefferson Airplane, Grateful Dead, Country Joe and The Fish e Paul Butterfield Blues Band. Rock e blues de pura resistência psicodélica.
A criação artística em efeito dominó. Esse era o clima. Tudo estava conectado. Artistas gráficos uniram-se a bandas. Produziam capas de discos, desenhavam flyers e pôsteres que cobriam a Califórnia. É também de 1967 a criação da Zap Comix, uma revista de quadrinhos independente que transgride todo o código de censura da época e é feita em casa pelo gênio dos quadrinhos underground, Robert Crumb, esposa e amigos. "
(continua)
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