O dia 11 de setembro é marcado por fatos negativos. O mais lembrado é o ataque terrorista das Torres Gêmeas nos Estados Unidos em 2001. Também houve o golpe de estado que atingiu a democracia chilena em 73, culminando com a morte do presidente Salvador Allende, e o que muita gente não sabe, é que foi num 11 de setembro de 1987 que aconteceu outra tragédia, o assassinato de Peter Tosh, um dos nomes mais representativos do reggae. Para quebrar um pouco a negatividade da data, é bom lembrar que foi num 11 de setembro de 1962 que os Beatles entraram pela primeira vez em um estúdio como contratados de uma gravadora, iniciando uma história de sucesso. Mas voltando a Peter Tosh, pode-se dizer que ele é uma espécie de vice-rei do reggae, já que a figura, a liderança e a importância de Bob Marley na difusão do reggae são incontestáveis. Em setembro de 1997 o fanzine Dread Times, especializado em reggae, lembrou da data, e publicou uma matéria sobre Tosh, assinada por Mauro França, e adaptada do livro Catch a Fire - The Life of Bob Marley, de Timothy White:
"Há exatos dez anos o reggae perdia uma de suas maiores expressões. Na noite de 11 de setembro de 1987, Peter Tosh foi brutalmente assassinado na sua própria casa em Kingston. Por isso abrimos esta edição com um relato sobre os acontecimentos desta fatídica data, uma história pouco conhecida dos regueiros brasileiros.
Depois de um longo período de estagnação criativa e disputas judiciais, Peter Tosh tentava em meados de 1987 retomar o pique da sua carreira. Em julho ele lançou o álbum No Nuclear War, depois de um hiato de quatro anos desde Mamma Africa, e planejava fazer uma turnê para promovê-lo. O objetivo também era melhorar sua situação financeira, que era precária, em boa parte devido aos custos dos vários processos em que havia se metido. As negociações com a gravadora visando obter um adiantamento para o projeto fracassaram, e Peter e seu empresário decidiram levantar alguns empréstimos. Quando pegou o avião de volta para a Jamaica, com a esposa Marlene Brown, no dia 06 de setembro, Peter dizia aos amigos mais próximos que a principal razão para a turnê era que ele estava quebrado.
Ele também estava isolado. Seu último show na Jamaica havia sido em 83, suas músicas raramente tocavam nas rádios e os amigos músicos mantinham uma certa distância. Muitos não gostavam de sua mulher, que não gozava de uma boa reputação. Peter havia cortado relações até com Bunny Wailer, a quem acusou de depreciar os valores morais do reggae com suas músicas para dancehall. E denunciava todos os deejays, novos e veteranos, chamando-os de corvos. No último ano, ele ainda perdera uma longa batalha pela posse do mais jovem dos seus oito filhos com várias mulheres e ainda teve sua casa incendiada.
Aquilo pareceu levar os pistoleiros à loucura e eles começaram a atirar em uníssono enquanto iam saindo, oito ou nove tiros cruzando a sala. Uma bala atingiu o fêmur de Michael Robinson, fazendo-o cair debaixo de uma mesa. Houve uma pausa e então o tiroteio recomeçou. Doc Brown recebeu uma bala na cabeça, morrendo instantaneamente. Free-I recebeu dois tiros atrás de sua orelha. Outro tiro foi dirigido a Michael, atravessando seu chapéu e atingindo sua testa; ele estava caído pensando quanto tempo um homem leva para morrer quando sentiu outra bala penetrando nas costas. Houve uma última rajada do caótico tiroteio, seis ou sete balas cruzando todas as direções. Santa Davis recuou quando uma bala atingiu seu ombro. Joy tremeu quando uma outra furou sua perna direita. Então veio um silêncio terrível, só quebrado pelo pelo barulho de pés se afastando, o abafado ruído de um motor e de pneus cantando. Quando tudo voltou ao silêncio, dentro e fora da casa, Marlene saiu à rua com dificuldade, gritando por socorro. Alguns vizinhos, alertados pelo tiroteio, estavam aturdidos e mudos. Ninguém se moveu em direção à casa até que um procurador que morava no lado oposto tomou a iniciativa e rapidamente atravessou a rua. Ele subiu as escadas correndo e parou no topo atingido pela visão da carnificina, o cheiro de pólvora confundindo seus sentidos. Voltando apressadamente, o advogado gritou para Marlene que ia buscar o carro para levar os feridos para o hospital. Joy e Marlene entraram e voltaram com Peter, semi-consciente. Free-I também foi amparado e Michael Robinson e Santa Davis cambalearam até o carro.
No hospital foi possível fazer um balanço do massacre. Marlene Brown e Joy Dixon foram medicadas e liberadas. Santa Davis deu entrada com seu ferimento no ombro mas estava bem. O estado de Michael Robinson era estável, mesmo com seus três ferimentos. Free-I estava em coma e os médicos consideraram seu estado frágil para uma cirurgia para retirada das balas do seu crânio. Três dias depois ele acabou falecendo. Peter foi oficialmente declarado morto naquela mesma noite.
Nos dias seguintes ao massacre seguiu-se uma disputa entre Marlene Brown e Alvera Coke, a mãe que Peter não via há mais de vinte anos, pelo direito de enterrar o corpo. A briga só foi resolvida com a intervenção do escritório do primeiro-ministro, que garantiu à Sra. Coke a guarda do corpo do filho. O funeral de Peter Tosh começou no dia 25 de setembro, no Estádio Nacional de Kingston, com a presença de mais de doze mil pessoas na fila de despedida. No dia seguinte aconteceu uma cerimônia com a presença de milhares de pessoas, parentes e o público em geral, presidida por um reverendo da Igreja Etíope Ortodoxa de Jamaica. Horace McIntosh, o filho mais velho de Peter, então com vinte anos, fez uma leitura e seu irmão Andrew, de dezenove anos, cantou algumas músicas do pai. O caixão foi conduzido até o o carro funerário por três filhos de Tosh, Horace, Andrew e Steve e pelos músicos Sly Dunbar, Robbie Lyn e Carlton Smith. Depois viajou para Belmont, no estado de Westmoreland, onde repousa num túmulo de frente para o mar do Caribe.
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