" Qualis - No novo disco que você está gravando, você pensa em incluir algumas dessas recriações?
Chico - Eu estou fazendo isso porque parei com o estúdio. Eu gravei três músicas no ano passado e parei porque eu preciso de repertório novo. Mas quando eu voltar a gravar, pretendo sim incluir algumas dessas músicas mais antigas que estão um pouco esquecidas.
Por enquanto, elas vão constar do show que estou montando pra este ano, além de músicas novas e antigas que nunca cantei em público, como 'Eu Te Amo', 'Ela É Bailarina', 'Meu Choro Bandido', 'Outra Noite', 'Choro Pra Ti', 'Sobre Todas as Coisas'.
Qualis - Como é compor sabendo que outros vão interpretar, por exemplo no 'Grande Circo Místico' em que as vozes não são de vocês? Não dá um certo ciúme?
Edu - Não, porque a gente se divertiu muito com isso. Ficar imaginando quem é que podia cantar tal música. Era ótimo.
Chico - Acho que nem o Edu nem eu temos essa coisa de cantor. Eu tenho muito prazer em ouvir músicas minhas cantadas por outros cantores. Na 'Ópera do Malandro' há uma porção de participações. Eu considero um disco meu como qualquer outro. Na época, eu tive um problema com a Polygram, que não considerava um disco meu porque eu não cantava todas as músicas. Pode?
Qualis - Você não era considerado o 'dono da voz'... (risos)
Edu - Isso acontece muito na imprensa. Alguém pergunta qual foi o último disco que fiz. Respondo que foi 'Dança da Lua', por exemplo. E o jornalista diz; 'não, um disco teu'. O mais engraçado é que dá muito mais trabalho fazer um disco dessa forma. Como cantor, basta selecionar músicas de que gosto, entrar no estúdio, gravar em três dias, e aí está o meu disco. Mas se você rala durante meses, faz as músicas, os arranjos e tudo, aí ele não é mais teu só porque outros cantam? Não entendo.
Chico - Isso é uma coisa um pouco antiga. No passado falavam assim: 'Uma criação de Francisco Alves', que era o cantor. Hoje não. Até as rádios falam de 'música de fulano, de tal autor'. As pessoas geralmente sabem de quem são as músicas. Cantar ou não cantar é secundário.
Qualis - Vocês tem algum tipo de preocupação com a preservação do samba tradicional, com a memória musical brasileira?
Edu - Não só com o samba, e sim com todos os ritmos brasileiros que estão esquecidos e muito mais marginalizados do que o samba. O Brasil é um país riquíssimo. Não dá pra acreditar que seja preciso importar alguma coisa para se fazer música com tantas possibilidades. Na Bahia, Maranhão, Pernambuco, há muitas coisas que ainda não chegaram ao grande público pra valer. Por exemplo, o frevo mesmo, aquele barra pesada, não é muito conhecido. É mais restrito a Pernambuco.
Qualis - Vocês têm interesse em ouvir a atual produção brasileira ou internacional? Sentem necessidade de informação musical?
Edu - Música é tudo a mesma coisa, é tudo mais ou menos igual. É verdade, eu posso ouvir o Tom Jobim com o mesmo prazer que o Piazzolla, apesar de serem totalmente diferentes. Mas o que interessa é a harmonia, a melodia e o ritmo, e são dois craques que mexem com isso de uma maneira muito interessante. Interessante a sua pergunta. Para a maioria das pessoas, músico tem que ficar ouvindo música o tempo todo para poder fazer música.
Qualis - Chico, na última entrevista que você deu, no ano passado, a vitrola da sua casa estava quebrada, não tinha som na sua casa, não tinha nada...
Chico - É o Edu que conserta meu som.
Edu - Eu ia dizer isso agora... Normalmente eu conserto. Eu tenho mania de conserto.
Chico - Pois o meu som continua quebrado. Ele quebra com uma facilidade... eu sou capaz de passar meses sem ouvir música. Não fico ouvindo música constantemente. 'I hate music'. Não gosto da música de fundo que está tocando nesse bar.
Recentemente a minha filha me mostrou o último disco do Sérgio Mendes. O que é? Sei lá. Tem o Carlinhos Brown, uma espécie de um rap, uma moça cantando em inglês e aquela batucada lá comendo solta, depois um coro em português, é interessante...
Qualis - Falando em Sérgio Mendes, vocês já consideram a possibilidade de seguir carreira no exterior?
Chico - Tenho uma proposta de gravar ainda este ano um disco na França. A ideia é levar músicos daqui para gravar num estúdio em Paris. Isso é motivado por uma questão técnica, de mercado. É pra evitar problemas com importação, porque o disco importado lá perdeu o charme artesanal que tinha anos atrás. Eles consideram hoje que o disco brasileiro não está tecnicamente à altura.
Isso, nos EUA nem sei se seria uma questão de ordem técnica. Lá, você simplesmente não entra com um disco feito aqui. Eles não importam música. Você tem que produzir lá, para lançar lá e ver se a partir de lá chega ao Brasil.
Agora na Europa a questão é de ordem técnica, e não estética. A ideia não é fazer um som diferente. Vi ser um disco feito essencialmente por músicos brasileiros, com exceção das cordas, sopros e madeiras, que serão tocados por músicos de lá. Mas não tenho a menor intenção de fazer carreira ou morar fora do Brasil.
Qualis - Mas você costuma passar longas temporadas em Paris...
Chico - Muitas vezes digo que estou em Paris, porque é mais longe, mas na verdade estou em Petrópolis.
Qualis - Vocês fazem parte, ao lado de Gil, Caetano, Paulinho da Viola, etc, de uma turma que chega aos 50. O que se verifica hoje é que não surgiram talentos em número e com peso suficiente para caracterizar uma sucessão, dar continuidade à obra de vocês...
Edu - Não concordo. Acho que não teve mercado nos últimos anos para revelar esses talentos. Quando a gente começou, o mercado era muito mais favorável, era muito mais fácil aparecer com uma canção num programa de TV, e depois gravar um disco. As regras eram menos duras.
Chico - Naquele tempo o artista tinha mais tempo para se firmar, não tinha aquela ansiedade da indústria de lançar pessoas e queimá-las imediatamente. Não existia esse 'público jovem' de hoje, com essa publicidade dirigida para ele. Não existia a palavra mídia. Hoje as pessoas até surgem com facilidade, mas correm o risco de desaparecer da mesma forma se não tomarem cuidado. É uma facilidade muito enganosa, que acontece em todas as áreas.
Qualis - Edu, você disse que o mercado ocultou novos talentos. Mas você vê mesmo o surgimento de novos talentos na MPB?
Edu - Claro. Toda hora. Principalmente instrumentistas.
Qualis - Mas assim carreiras de novos compositores como Guinga, é uma coisa bastante rara hoje...
Edu - Tá certo. Mas há inúmeros instrumentistas de talento, que estão aí com um trabalho bonito.
Chico - E são pessoas sérias, que estudam muito mais música do que se fazia no nosso tempo.
Edu - Na época da gente, entre os violonistas tinha Baden, João Gilberto num outro nível, e mais uns cinco ou seis. Hoje você conta uns trinta de cara, e de altíssimo nível. Isso falando só no violão. Se você pensar nos outros instrumentos, vai encontrar artistas elaborando formas musicais muito difíceis de ser realizadas, que não existiam na nossa época."
Qualis - Mas você costuma passar longas temporadas em Paris...
Chico - Muitas vezes digo que estou em Paris, porque é mais longe, mas na verdade estou em Petrópolis.
Qualis - Vocês fazem parte, ao lado de Gil, Caetano, Paulinho da Viola, etc, de uma turma que chega aos 50. O que se verifica hoje é que não surgiram talentos em número e com peso suficiente para caracterizar uma sucessão, dar continuidade à obra de vocês...
Edu - Não concordo. Acho que não teve mercado nos últimos anos para revelar esses talentos. Quando a gente começou, o mercado era muito mais favorável, era muito mais fácil aparecer com uma canção num programa de TV, e depois gravar um disco. As regras eram menos duras.
Chico - Naquele tempo o artista tinha mais tempo para se firmar, não tinha aquela ansiedade da indústria de lançar pessoas e queimá-las imediatamente. Não existia esse 'público jovem' de hoje, com essa publicidade dirigida para ele. Não existia a palavra mídia. Hoje as pessoas até surgem com facilidade, mas correm o risco de desaparecer da mesma forma se não tomarem cuidado. É uma facilidade muito enganosa, que acontece em todas as áreas.
Qualis - Edu, você disse que o mercado ocultou novos talentos. Mas você vê mesmo o surgimento de novos talentos na MPB?
Edu - Claro. Toda hora. Principalmente instrumentistas.
Qualis - Mas assim carreiras de novos compositores como Guinga, é uma coisa bastante rara hoje...
Edu - Tá certo. Mas há inúmeros instrumentistas de talento, que estão aí com um trabalho bonito.
Chico - E são pessoas sérias, que estudam muito mais música do que se fazia no nosso tempo.
Edu - Na época da gente, entre os violonistas tinha Baden, João Gilberto num outro nível, e mais uns cinco ou seis. Hoje você conta uns trinta de cara, e de altíssimo nível. Isso falando só no violão. Se você pensar nos outros instrumentos, vai encontrar artistas elaborando formas musicais muito difíceis de ser realizadas, que não existiam na nossa época."
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