No início de 1975 a revista Pop trazia uma matéria fazendo um balanço sobre o ano anterior em termos de rock no Brasil. Intitulada "1974 - O ano do rock", a matéria destaca vários aspectos relativos ao crescimento do mercado de rock no país. É um texto bastante interessante para se conhecer o panorama musical brasileiro, em especial o rock, que experimentou um impulso no país. Fala de shows internacionais acontecidos no país, como os de Alice Cooper, e outros artistas e bandas. Uma frase, colocada na página inicial da matéria resume bem o que o ano de 1974 representou para o nosso rock: "O ano passado marcou a entrada definitiva do rock na vida do público brasileiro. Foi uma grande festa!". Abaixo, a primeira das duas partes da matéria::
"A 25 de janeiro do ano passado, mais de cinco mil abnegados rockeiros de São Paulo passaram uma noite inteira no bosque do parque Ibirapuera, curtindo o som dos conjuntos Made in Brazil, Som Nosso de Cada Dia, Mutantes e outros. E só foram embora quando o sol do dia 26 já estava alto e os músicos quase caíam de cansaço. Duas semanas mais tarde, a 10 de fevereiro, um espetáculo fabuloso acontecia no Rio: o conjunto Secos & Molhados conseguia no Maracanãzinho um clima de delírio nunca alcançado por um artista ou grupo brasileiro. Pela manhã, os 20.000 ingressos postos a venda estavam esgotados. Às 7 da noite, o ginásio estava abarrotado de gente. Do lado de fora, os mais de 15.000 jovens que não puderam entrar depredavam carros, saltavam muros, brigavam com os porteiros e entre si. Os cambistas vendiam por 40 cruzeiros ingressos que valiam 10. No dia seguinte, o grupo estava consagrado e o empresário Moracy do Val juntava 250.000 cruzeiros aos polpudos lucros que o primeiro LP dos Secos & Molhados estava rendendo.
Secos & Molhados no Maracanãzinho |
Talvez entusiasmado por esses sintomáticos acontecimentos, o veterano empresário Marcos Lázaro entrou em cena com uma bomba de altíssimo poder: trouxe ao Brasil, em março, o discutido Alice Cooper, um dos mais controvertidos e assustadores astros da galáxias do rock. Em seu primeiro concerto, no parque Anhembi (SP), 70.000 jovens de várias partes do Brasil se espremiam para chegar o mais perto possível do palco. E criaram um tumulto tão grande que a própria 'Tia' Alice ficou com medo e chegou a interromper o show, temendo pela sua segurança. No fim, muita gente acordou no hospital. E Marcos Lázaro chegou a dizer que nunca mais se meteria com rock.
A verdade é que, bem ou mal, este foi o terceiro, talvez, o mais importante dos acontecimentos que deflagraram a explosão do rock em 1974 no Brasil. A partir daí, as coisas começaram a acontecer e nunca mais foram como antes. A começar pelos grandes empresários brasileiros, que trocaram o medo de perder dinheiro pela certeza do bom investimento, arregaçaram as mangas de suas camisas de colarinho duro e começaram a trabalhar. Enquanto Marcos Lázaro andava às voltas com Alice Cooper, Manoel Poladian tinha menos preocupações e muito lucro com o romântico Billy Paul e já transava a vinda do gordo Demis Roussos para maio. No Rio, os praticamente desconhecidos George Kosky e Alberto Ellis juntam seus capitais, fundam a KEP e anunciam a vinda dos afinados Jackson Five, que acaba acontecendo em setembro.
Alice Cooper |
A essa altura, a especulação é tão grande que quase ninguém se entende mais: quem vai trazer quem, quem vem mesmo, quem não vem nunca? Guilherme Araújo, como quem não quer nada, vai a Londres e procura o Rolling Stone Mick Jagger, um cara que não esconde de ninguém que está louco para cantar na América do Sul. Kosky e Ellis, sempre combatidos pelos concorrentes, anunciam a vinda do conjunto inglês Traffic para novembro. Em cima da hora, o grupo cancela a excursão, provocando grande prejuízo para a gravadora Phonogram e decretando a morte da KEP, que estava com o prestígio abalado desde sua fundação. Com isso, disseram alguns empresários: 'Os aventureiros se assustaram, a euforia passou e o mercado tende a se profissionalizar de vez'.
E o ano acaba com um saldo favorável para os empresários, que ganharam um bocado de prestígio e muito mais dinheiro, trazendo atrações internacionais de sucesso comercial garantido: Stylistics, Supremes, Dione Warwick e George McRae, além dos já citados Jackson Five, Demis Roussos e Billy Paul. Além de Alice Cooper, só houve uma surpresa considerada realmente boa: a passagem atordoante do genial Miles Davis pelo Brasil, dando um verdadeiro banho de música em seus perplexos ouvintes.
Tradicionalmente à margem dessa efervescência comercial, o rock brasileiro decidiu entrar também na festa. E, ajudado pela euforia geral em torno dos Secos & Molhados começou a se infiltrar no cenário. Enquanto os músicos se juntavam e ensaiavam a pleno vapor, com muito mais garra do que com aparatos técnicos, começaram a pintar os jovens empresários, cheios de ideias e de esperança. Caras tão jovens e pirados como os próprios músicos, muniram-se de pastinhas quadradas, contratos e passagens de avião e saíram para a briga.
Mônica Lisboa dedicou-se exclusivamente a Rita Lee e seu Tutti-Frutti, revelando a ótima guitarrista de óculos Lucia Turnbull. E chegou a comprar parte do equipamento de Alice Cooper para montar um espetáculo profissional: Atrás do Porto Tem Uma Cidade - um show muito bem produzido, com cenário belíssimo e som perfeito, que estreou em agosto em São Paulo e logo correu o Brasil, fazendo a garotada de Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre dançar como não fazia há muito tempo.
E o ano acaba com um saldo favorável para os empresários, que ganharam um bocado de prestígio e muito mais dinheiro, trazendo atrações internacionais de sucesso comercial garantido: Stylistics, Supremes, Dione Warwick e George McRae, além dos já citados Jackson Five, Demis Roussos e Billy Paul. Além de Alice Cooper, só houve uma surpresa considerada realmente boa: a passagem atordoante do genial Miles Davis pelo Brasil, dando um verdadeiro banho de música em seus perplexos ouvintes.
Miles Davis |
Mônica Lisboa dedicou-se exclusivamente a Rita Lee e seu Tutti-Frutti, revelando a ótima guitarrista de óculos Lucia Turnbull. E chegou a comprar parte do equipamento de Alice Cooper para montar um espetáculo profissional: Atrás do Porto Tem Uma Cidade - um show muito bem produzido, com cenário belíssimo e som perfeito, que estreou em agosto em São Paulo e logo correu o Brasil, fazendo a garotada de Belo Horizonte, Curitiba e Porto Alegre dançar como não fazia há muito tempo.
Mutantes |
Antes disso, em abril, os Mutantes já haviam dado um concerto quentíssimo no cinema Super Bruni 70 (2.500 pessoas!), no Rio. A partir daí, com contrato assinado com o jovem empresário Samuca Wainer, começaram a dar shows isolados até a consagradora temporada no Teatro Bandeirantes de São Paulo, em outubro. Outro cara, Gabriel Neto, depois de investir em alguns concertos passou a cuidar exclusivamente do grupo O Terço, um conjunto de pés no chão e cabeça no lugar. Em setembro, depois de exaustivos ensaios, o grupo pôde comprovar a qualidade de seu som: na abertura da temporada carioca de rock, oportuna promoção da Toca (firma de Samuca e Gil), o público levantou e só parou de dançar depois que O Terço bisou várias vezes seus rocks. O entusiasmo foi incrível, e o grupo partiu imediatamente para a produção independente de um LP, que acabou tendo todos os seus direitos vendidos para a Odeon.
(continua)
''Mutantes'' sem Rita Lee é como ''Secos e Molhados'' sem Ney Matogrosso,não foram avante.
ResponderExcluirA fase mais criativa dos Mutantes foi na fase com Rita. A fase progressiva da banda é até boa, mas não teve uma vida longa
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ResponderExcluirSó sei que a fase progressiva dos Mutantes durou de 1972 a 1978 ou 1979 e deixou três álbuns e um ep 7" de registro (além de um lp bootleg duplo ao vivo com um show de 1978 e outro em cd bootleg com um show de 1975), fora isso, deixou, também, duas suítes progressivas em 1972, ainda, com a Rita Lee: A faixa-título "Mutantes E Seus Cometas No País dos Baurets" de quase 10 minutos, que está no último álbum com Rita lee, e "Mande Um Abraço Pra Velha" com quase 8 minutos, que está no lp FIC 72, ambas da fase transitória no ano de 1972. Enquanto o início (1966 ao final de 1968) da fase psicodélica não teve endurecimento e quase nenhuma censura, ninguém da banda sofreu quando chegou esse endurecimento da Ditadura, tanto que gravaram seus álbuns psicodélicos humorísticos do mesmo jeito que o primeiro álbum, mas a fase progressiva pegou todo esse endurecimento, já com a censura pegando do pé de todo rock setentista em geral, fazendo gravadoras e rádios boicotarem quase tudo do rock nacional, mas a banda sobreviveu até 1978 ou 1979 e sempre bem cotada nos festivais de rock e nos seus shows de suas turnês, além de ter seu primeiro álbum prog boicotado pela gravadora e que só saiu, postumamente, em 1993. Então, se mais de seis anos da fase progressiva da banda é dizer que "não foram avante" ou que "não teve uma vida longa"? E, então, o que é seis anos da fase psicodélica de 1966 a 1972? Diferença de tempo das duas fases quase nenhuma e diferença das discografias das duas fases pouco também, um álbum e meio a mais para fase psicodélica. E pouco, meio ou muito criativo vai do ponto de vista de cada fã. Pois, só sei que se a fase psicodélica é cultuada, os álbuns da fase progressiva O A E O Z, Tudo Foi Feito Pelo Sol e o ep Cavaleiros Negros são muito cultuados também. A prova disso foram os shows dos Mutantes tocando o álbum Tudo Foi Feito Pelo Sol e o mini-álbum Cavaleiros Negros, ambos na íntegra, teve público bem grande; pelo menos como estrela principal no festival Psicodália no Sul do Brasil e no teatro Sesc Palladium de BH. Para mim, os dois que, nos comentários acima, criticaram a fase progressiva, criticaram sem muito fundamento algum.
ResponderExcluirEu gosto da fase progressiva dos Mutantes, embora muitos não curtam. Foi uma fase de experimentações, e eles, como vc falou, lançaram um bom número de material. Obrigado pelo comentário
ExcluirÓtima matéria
ResponderExcluirVc sabe como Mônica Lisboa chegou até o Alice Cooper