Gal Costa foi a musa do desbunde brasileiro dos anos 70. Cantora de voz privilegiada e porta-voz do Tropicalismo durante o exílio de Gil e Caetano, Gal viveu intensamente toda aquela efervescência cultural e comportamental que acontecia no Brasil. Gal em 1970 visitou os dois baianos em Londres, e teve a oportunidade de participar de forma direta de um dos grandes eventos contraculturais dos anos 70: o antológico Festival da Ilha de Whight, na Inglaterra.
Um fascículo da série "Os Grandes da MPB", dedicado à cantora fala desse contato e participação dos baianos tropicalistas nesse grande evento:
"Gal Costa foi, sem dúvida a musa do exílio de Caetano Veloso e Gilberto Gil. Porta-voz literal dos baianos que viajaram para o exílio em julho de 1969 e que só voltariam ao Brasil no verão de 1972. Caso de Gilberto Gil, já que Caetano Veloso obteve permissão pra vir, em 1971, ver os pais e participar de um programa da TV Tupi ao lado de João Gilberto, que bateu pé pela presença de Caetano e Gal.
Gal Costa, além de gravar as músicas que os compositores baianos fizeram em Londres, como 'London, London' e 'Mini-Mistério', também viajou para Londres, onde passou uma temporada dando apoio moral aos amigos. Entre os fatos marcantes dessa viagem encontra-se a ida dos baianos e agregados ao Festival da Ilha de Wight.
Anunciado como o último dos festivais, realizado em agosto de 1970, reuniu a nata dos roqueiros da época, os grandes como Jimi Hendrix, The Who, Jim Morrison e The Doors, Jethro Tull, Miles Davis e Joan Baez, entre outros, o show que encerraria uma época, um modo de ser todo especial cristalizada na frase de John Lennon: 'The dream is over'.
Mote que seria aproveitado por Gilberto Gil para escrever uma de suas grandes músicas, 'O Sonho Acabou'. Voltando à Ilha de Wight, o certo é que todos os 'desbundados' do mundo foram pra lá; inclusive a brasileirada que se encontrava em Londres, cidade-meca dos anos 70.
Gil, Gal e Caetano |
São vários os relatos da época, mas dois merecem atenção especial: primeiro o de Gal Costa, que participou, junto com Caetano Veloso e Gilberto Gil, além de outros brasileiros, de uma apresentação para os novos. A cantora, em depoimento à jornalista e fotógrafa Mariza Alves Lima, autora de Marginália - Arte e Cultura na Idade da Pedrada, afirmava o seguinte:
'Eu daqui para a frente quero sentar, pegar no violão e fazer tudo em termos de música... A viagem à Europa me deu uma grande abertura. Ficamos cinco dias em Portugal e depois seguimos para a Ilha de Wight, para assistir ao Festival. Foi uma semana de acampamentos em duas barracas enormes, quinze pessoas cantando, tocando e curtindo. Além dos brasileiros que foram comigo, incorporaram-se ao grupo Gilberto Gil e Sandra, Guilherme Araujo, Antônio Bivar, Zé Vicente, entre tantos outros, que agora para mim fica difícil enumerar. O som improvisado que fazíamos na barraca, um misto de vozes, batuque em tambores e reco-reco foi gravado pelo grupo em fita. A gravação entusiasmou os organizadores do festival e, graças a isso, fomos convidados para abrir o segundo dia de apresentação dos conjuntos desconhecidos'.
Gal Costa diz em seu depoimento que ficou impressionada mesmo foi com Miles Davis, 'simplesmente genial nas duas apresentações que assisti, o conjunto Ten Years After, o The Who, absolutamente incrível e Jimi Hendrix'. Nunca vi - continua Gal - ninguém com tanto charme.
Outro relato de época delicioso é o do escritor e teatrólogo Antônio Bivar, autor de Verdes Vales do Fim do Mundo, um registro de sua estada na Europa durante o começo dos anos 70. Ele também foi ao Festival junto com o amigo José Vicente e ficaram acampados nas tais barracas debaixo de um sol de rachar, assegura.
No dia de apresentação do chamado grupo brasileiro para uma plateia de 200 mil pessoas, Antonio Bivar descreve que '... Gil com a guitarra deu o sinal de partida e nós fomos com a cara e a coragem no acompanhamento. David na flauta tranversa e Nik Turner no sax, Gustavo da 'Bolha' nos atabaques, Nigel e Marcos do Meyer nos bongôs, Bruno, o suiço, no baixo, Caetano no violão... Gal Costa que tinha vindo do Brasil para o festival, tocava um reco-reco. E eu outro. Gil cantou em português, inglês, africano... Caetano cantou 'London, London' em inglês para um público atento que prestou atenção na letra O show brasileiro durou perto de quarenta minutos e terminou com Gil cantando 'Aquele Abraço'.
No palco - continua Bivar - muita gente chorou de emoção e a plateia, mesmo não entendendo a letra, sentiu a brasilança do grupo e a aplaudiu de pé, pedindo mais, mais, mais! Nos bastidores de talentos assediavam Claudio Prado. Os homens da CBS estavam eufóricos para contratar todo o grupo. Mas Guilherme Araujo chegou de Londres para dar um não definitivo. Sendo empresário de Gil e Caetano, Guilherme achava que seus contratados deviam continuar suas carreiras individuais. E não se tocou mais no assunto, finaliza Bivar. "
''Brazilança'',gostei do neologismo.
ResponderExcluirA voz da Gal é privilegiada mesmo,pena que ao vivo está quase sempre cansada.
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