Os Titãs é, na minha opinião, uma das melhores bandas brasileiras de rock de todos os tempos. Já falei isso várias vezes. A partir do terceiro disco de sua carreira - Cabeça Dinosauro (1986), os Titãs deram uma guinada em sua carreira, depois de dois discos um tanto inexpressivos, se comparados aos ótimos lançamentos que se seguiriam. Em 1993, a banda sofreria sua primeira baixa, com a saída de Arnaldo Antunes, um de seus principais membros. Naquele ano eles lançariam o seu disco mais pesado, Titanomaquia, com produção do renomado Jack Endino. Na ocasião a revista Rock in Book comentaria o lançamento do disco e de um vídeo em VHS com um documentário sobre o trabalho anterior - Tudo ao Mesmo Tempo Agora, em texto de Ayrton Mugnaini Jr.:
"Na onda de Titanomaquia, a Warner Mucic Vision lançou o vídeo Tudo ao Mesmo Tempo Agora, que mostra os bastidores das gravações do disco com o mesmo nome, lançado há dois anos pelos Titãs. Com meia hora de duração, possui boa fotografia em P&B e som estéreo.
Tudo ao Mesmo Tempo Agora, o disco, foi gravado entre junho e julho de 1991, lançado em setembro, e em outubro os oito Titãs iam à estrada para 117 shows em todo o país. A turnê incluiu também shows por San Diego, Los Angeles e San Francisco. Não se tratava de apenas mais um lançamento de disco de uma grande banda nacional. Tudo ao Mesmo Tempo Agora marcou literalmente, a maior briga entre os Titãs e a crítica de rock.
A maioria das estações de rádio do país recusou-se a tocar a música 'Saia de Mim'. O baterista Charles Gavin e o guitarrista Tony Bellotto afirmaram que então viram se fechar pela primeira vez as portas desde Cabeça Dinossauro, em 1986. Sentiram novamente a insegurança de artista em início de carreira. O motivo da crise; - os palavrões inseridos em três das quinze faixas do LP. 'Os chefões de algumas rádios pediram para parar de tocar 'Saia de Mim'. Em outras, foram os ouvintes que ligaram. Qual a diferença entre ela e 'Bichos Escrotos'?, perguntou Gavin.
Tudo ao Mesmo Tempo Agora mostrou que os Titãs não haviam cedido ao pseudo-estrelato nacional. O álbum ousou, e além dos 'palavrões', mostrava uma tendência mais pesada, o que o diferenciava dos timbres claros dos três LPs anteriores produzidos por Liminha (o mesmo de Cabeça Dinossauro). 'Como é um disco mais radical na forma das letras e do som, acho que a crítica não compreendeu, ficou meio ofuscada e não teve clareza para analisar. Também houve um pouco de moralismo...' lembra Bellotto. Músicas como 'Eu Não Sei Fazer Música' e 'Já', foram deixadas de lado por causa dos palavrões de 'Isto Para Mim É Perfume' e 'Saia de Mim'. Mas os Titãs ressaltam 'o resultado ficou exatamente como queríamos'.
Capa de Tudo ao Mesmo Tempo Agora |
Os shows paulistas, com abertura da banda trash feminina Volkana, marcaram o início da turnê de divulgação de Tudo ao Mesmo Tempo Agora. E os Titãs contaram com o auxílio de uma terceira guitarra (Luiz Carlini, do Tutt-Frutti) e covers: 'Hole in the Sky', do Black Sabbath, 'Fire', de Jimi Hendrix e 'Creating Hop', dos Ramones. 'As covers têm a ver com o espírito do show', declaravam os Titãs. O som mais pesado despertou curiosidades e especulações que foram rebatidas pelo tecladista e cantor Sérgio Britto: 'Fazemos o que nos dá prazer. Por coincidência, o som acaba ficando com uma cara heavy'.
'Esses obstáculos têm sido estimulantes. Nunca quisemos manter nosso 'status'. E o Brasil é muito pequeno. Você vira um starzinho, um personagem meio ridículo', finaliza Bellotto.
Titanomaquia é a elevação dos Titãs, é urgente como a urgência de uma banda com dez anos de estrada. Remonta os tempos de Cabeça Dinossauro e soltam os 'Bichos Escrotos' como única salvação. Titanomaquia é rock, um desespero a quem esperava outras 'Comida' ou 'Marvin'.
'Quem aqui não tem medo de se achar ridículo?' Quem aqui, como eu, tem a idade de Cristo quando morreu?', grita o refrão de 'Será que É Isso que Eu Necessito?', faixa de trabalho do novo LP. Titanomaquia é o retrato de Tudo ao Mesmo Agora, porém mais agressivo, sem baladas. A atitude de uma banda que viu as portas se fecharem devido a uma falsa crise de moralismo no rock, por parte de 'críticos', ouvintes e 'mannagers'.
O vídeoclip de 'Será que É Isso que Eu Necessito', espanta qualquer pessimismo: foi eleito o melhor clip nacional na disputa do MTV Awards.
Arnaldo Antunes, ainda nos Titãs |
Em Titanomaquia os Titãs são sete, embora fossem seis na lenda grega, ou seja, os seis filhos de Urano (personificação de Céu) e Géia (personificação da Terra): Oceano, Ceos, Crio, Hiperíon, Jápeto e Rono, os quais pertenciam à primeira geração divina.
Titanomaquia pode ser apocalíptico, caótico, mas é exatamente o que queriam fazer Paulo Miklos (voz, sintetizador e sampler), Sérgio Britto (voz, mini-moog e órgão), Branco Mello (voz), Nando Reis (baixo e voz), Charles Gavin (bateria e percussão) e os guitarristas Toni Bellotto e Marcelo Fromer. 'Nem Sempre se Pode Ser Deus' começa a apresentar o dedo de Jack Endino (produção), embora mantendo a personalidade da banda. 'Disneylândia' nos remete à poesia 'Opuloso', à crítica social escancarada, às mesmas que se engole diariamente e 'crianças iraquianas fugidas da guerra não obtêm visto no consulado americano do Egito para entrarem na Disneylândia'. 'Disneylândia', 'Hereditário' e 'De Olhos Fechados' contaram com a participação de Arnaldo Antunes na composição. Branco Mello eleva em 'Estados Alterados da Mente' as melhores características do rock nacional. 'Agonizando' é meio suja, bem hardcore, possui mudanças de andamentos; Sérgio Britto impõe a voz ora como uma ordem, ora como desabafo e as guitarras finais ficaram para uma participação especial de Endino (também na guitarra rítmica e feed-back em 'Disneylândia').
Muda-se o lado e aumenta-se a tensão. 'Fazer o Quê?' tem como introdução o fragmento de Eurípedes, adaptado à moda titânica e com tendência de hit. 'Mesmo que ninguém escute. Mesmo que ninguém ouça. Mesmo que ninguém acredite, no que sai da minha boca....', 'A verdadeira Marry Poppins' é deliciosa. 'Dissertação do Papa Sobre o Crime Seguido de Orgia' (extraído do livro homônimo de Marquês e Sade) vem reafirmando o que os Titãs fazem desde Titãs. 'Taxidermia' não é o final do mundo, mas o final do disco, e você fica pedindo mais, mais..."
(continua)
Legal o texto,mas tem hora que tá falando de um disco e já é outro.
ResponderExcluirO texto é bem ágil, e isso faz misturar um pouco as referências
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