Em abril de 1973 o nº 6 da revista Pop trazia uma matéria com Maria Bethânia. Na época ela estava envolvida com o show Drama, um dos grandes sucessos de sua carreira. A matéria é assinada por Ione Bandeira. A revista, em seus primeiros números trazia a capa e contracapa duplas, de modo que a primeira e última matéria traziam um poster do artista destacado, após desdobradas. Assim, havia um poster da cantora na primeira capa - foto de Marisa Alves Lima. Abaixo, a matéria:
"Em meio ao verde da floresta, numa casa na estrada das Canoas, Maria Bethânia vive tranquila. De praia ela não quer nem saber: quando morava em Ipanema nunca foi à praia lá. Seu trabalho? Acha uma rotina constante: sempre fazendo shows, gravando lps, viajando com seus shows pelos estados. Agora ela faz Drama, um show dirigido por Fauzi Arap, no Teatro da Praia. Ah, por palco Bethânia tem loucura, acha a glória, uma maravilha. Mas, engraçado, Pierre Barrouch chamou-a para cantar no teatro dele, em Paris, e ela não sabe se vai. Em compensação, trouxe saudades da Alemanha, quando das suas últimas apresentações na Europa. Protegida por uma enorme figa de madeira e prata, pendurada no portão de entrada, ela, podendo, fica curtindo sua casa: só sai para viajar ou andar na sua Yamaha 125. Bethânia vê todas as novelas de televisão: chorava quando Simone beijava Cristiano em Selva de Pedra. Essa gente baixando em casa toda hora para papos, ela não aguenta mais: agora só atende com hora marcada. Quando tem vontade, faz trabalhos manuais, quadros com areia luminosa: conselho do analista. Em cozinha, também se amarra: sem empregada, lembra os pratos que aprendeu em Santo Amaro. Como um vatapá especial que Dona Canô lhe ensinou.
Esparramada no sofá de couro, na ampla sala envidraçada, Maria Bethânia está totalmente à vontade na nova casa, no meio da floresta, longe da badalação de Ipanema onde morava antes.
O poster que vem na revista |
'Aquela de a gente estar tranquila em casa e toda hora pintar gente pra bater papo, não dava mais pé. Eu morava no centro de Ipanema, onde acontecem todas as coisas, e não estava mais aguentando aquele entra e sai. Gente que eu nem conhecia e nem sequer sabia quem era. Sabe, aquelas coisas de as pessoas passarem na rua e lembrarem: 'Ah, Bethânia mora aqui. Vamos chegar lá?' Era esse inferno o dia inteiro. Aqui, as pessoas não vêm mesmo porque é muito longe, e quando aparecem, eu mesmo despacho. Vou dizendo que sinto muito, que estou cansada, que não posso atender. Se quiser vir aqui, tem que marcar hora. Agora só atendo com hora marcada.' O jeito maroto de falar, gestos lentos e preguiçosos, não revelam a mulher nervosa e transbordando energia que a conselho do analista é obrigada a olhar para um aquário, diariamente, durante vinte minutos, ou fazer trabalhos manuais. Roendo as unhas ou as peles ao redor, Maria Bethânia diz que preferiu a segunda indicação.
Me amarro em tudo o que a gente pode criar com as mãos.Faço bordado, muito, e agora estou pintando também. Não como as pessoas andam falando, não é nada disso. A hora que sinto vontade, quero criar alguma coisa, eu faço. Meus quadros são com areia luminosa colorida, não é pintura, não. Por exemplo: um laguinho azul, um céu cheio de estrelinhas, essas coisas... Mas não gosto de mostrar, não. É uma coisa muito minha, não para ser divulgada. Minha profissão é a de cantora, é isso o que eu sei e o que gosto de fazer realmente.'
A casa é em estilo japonês, com portas de vidro e madeira correndo em toda a extensão da fachada. Pedrinhas redondas de fundo de rio contornam uma entradinha que vai até uma ponte de madeira, a qual beira a piscina e dá acesso à entrada principal. Na sala, esteirinhas servem de tapetes. A decoração interior não acompanha o resto do estilo. Lá dentro tem de tudo: objetos de bronze, prata, sininhos, velas coloridas e uma talha imensa fazendo parede de fundo. "
(continua)
Sem comentários ... sempre DIVA, inteligente, lúcida ... maravilhosa!!!
ResponderExcluirObrigado pelo comentário. Volte sempre. Abraço
ExcluirEspetacular... bom demais ter informações sobre a fase inicial da carreira de dona Maria Bethânia. Se puder, publique a crônica que José Cândido de Carvalho escreveu sobre Maria Bethânia. Está no livro "Ninguém mata o arco-iris".
ResponderExcluirValeu, Edeilson. E obrigado pela dica da crônica do sempre genial José Cândido de Cavalho. Abraço
ResponderExcluirEla acreditava em analista,eu considero uma bobagem,mas...
ResponderExcluirTudo tem sua validade, desde que colocado no lugar e hora certos
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