Palavras Domesticadas

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sexta-feira, 15 de abril de 2016

A Sombra Subversiva de Rogério Duarte - 2ª Parte

"Ao olhar para trás e avaliar criticamente o tropicalismo, Rogério Duarte não hesita em dizer que o que morreu ou envelheceu da produção artística da época era o 'inessencial'. Para ele, a semente plantada pela sua geração representou uma ruptura definitiva com o colonialismo musical e cultural.
- A manhã tropical é irreversível, nós vencemos a parada - sentencia Rogério. - Nós descompartimentalizamos a cultura, aprendemos a lição do modernismo e fomos mais longe, pois a Semana de 22 era um movimento das elites, fechado. A ruptura do tropicalismo tornou possível, por exemplo, músicos como Luiz Melodia, Djavan ou um Carlinhos Brown.
O destemor em misturar diversos níveis de cultura, assumindo criticamente os valores nacionais e as influências estrangeiras não é, como observa Rogério, uma exclusividade do tropicalismo. Ele acredita que tudo está inscrito num 'contínuo transtemporal' que seria justamente o que faz a vitalidade de uma invenção.
Disco de 1974 de Jorge Mautner
- As coisas iniciais são eternas, a essência do pitagorismo, por exemplo, continua por aí - exemplifica ele. Nossos valores estavam também em Gregório de Matos, em Sousândrade, no Padre Antônio Vieira. Não adianta ficar adorando formas transitórias, o importante é entender como a verdade se manifesta em cada contexto. Essa transformação é o oposto destes cadáveres adiados que procriam num Brasil acanalhado.
Nesta lógica, a Tropicália vive na tradução que Rogério fez para o 'Gita'. Do sânscrito para o português, o poema ganhou métrica e musicalidade de cordel.
- Em 1974 entrei para um mosteiro budista em Santa Teresa, no Rio, queria repudiar toda a cultura Ocidental - conta Rogério. - Em 1978 tive as primeiras aulas de sânscrito e comecei a ler a literatura indiana. Mas acabei querendo fundir aquilo com a cultura brasileira.
O livro, que deveria sair em junho, foi adiado por um imprevisto não menos tropicalista. 'a canção do mestre' virá acompanhado por um CD produzido por Carlos Renó em que Gilberto Gil, Caetano Veloso, Moraes Moreira, Djavan, Moreno Veloso e outros musicarão trechos da versão 'nordestinizada' do poema.
Capa de Cantar - Gal Costa (1974)
O livro de Caetano (ainda sem título) e a tradução do 'Gita' detonam no segundo semestre uma invasão tropicalista nas livrarias. No mesmo período será lançado, pela Companhia das Letras, um volume com a correspondência de Glauber Rocha. Além das cartas, em que o cineasta avalia criticamente o Cinema Novo e faz uma crônica do movimento cultural brasileiro nas décadas de 60 e 70, o livro traz fotos inéditas do arquivo pessoal do cineasta.
Torquato Neto também diz presente com  a terceira edição, revista e ampliada e sua obra. A nova versão de 'Os últimos dias de Paupéria' - que será publicada pela José Olympio e não tem título definido - traz inéditos da juventude do poeta piauiense, uma troca de cartas completa entre ele e Hélio Oiticica e as letras de Torquato que ficaram de fora nas outras edições de sua obra.
No fim do ano, o movimento como um todo é 'biografado' pelo jornalista Carlos Calado. Ele lança sua panorâmica da produção da época pela mesma Editora 34 que publicou o seu 'A divina comédia dos Mutantes', a história do grupo formado por Rita Lee e pelos irmãos Arnaldo e Sérgio."

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