A revista Bizz dominou o mercado de publicações musicais sobre rock, especificamente, durante 15 anos. De vez em quando a revista lançava edições especiais, destacando uma vertente do rock, ou edições históricas, como a que destaco aqui, abrangendo o rock brasileiro. Publicada nos anos 80 (não há referência ao ano exato de publicação), a revista fala do rock nacional, desde sua pré-história - a fase anterior à Jovem Guarda (Tony e Cely Campelo, Demátrius, Sérgio Murilo, Wilson Miranda, Ronnie Cord), até o rock dos anos 80, que vivia seu auge, citando ainda artistas de vanguarda, como Arrigo Barnabé e Itamar Assunção, que também produziam uma forma de rock, mais elaborado e de influências e públicos diferentes. A Jovem Guarda, o Tropicalismo e o rock dos anos 70 também são historiados.
Cely Campelo |
Em um trecho do texto de introdução, que é apresentado como "Carta ao Leitor", os editores dizem: "Esse tal de rock'n roll, do lado debaixo do Equador, tem uma história cheia de lacunas, de buracos negros e explosões efêmeras, de esquecimentos imperdoáveis e consagrações injustificadas... Afinal, é só o roteiro inacabado de um filme. Ainda há muita história por fazer..."
A narrativa sobre os primórdios de nosso rock, considerado como "pré-história" é assim narrado:
"O ano é 1959. O país respira a euforia da construção de Brasília e a TV, com nove anos de vida, começa a ocupar definitivamente o lugar do rádio. Em São Paulo, Sérgio 'Tony' Campello, cantor em início de carreira, acompanha a irmã em sua segunda gravação pela EMI-Odeon. É apenas o lado B de um disco, mais uma versão de Fred Jorge. 'Oô cupido, vê se deixa em paz...', suplicava a voz tímida da menina Célia, aliás, Cely, na versão de 'Stupid Cupid', hit de Neil Sedaka e H. Greenfield. Em poucos dias, a música alcançava o primeiro lugar nas paradas, e Cely Campelo, aos 16 anos, conquistava o posto de 'namoradinha do Brasil'. Voz doce, rebeldia controlada, romantismo ingênuo: essa era a receita de Cely, que reinaria suprema em todo o período pré-Jovem Guarda."
O sucesso de Cely e outros astros daquela fase são relatados na publicação, até desembocar na Jovem Guarda. Ainda com relação a Cely, curiosamente, sua carreira experimentou um renascimento cerca de 15 anos após ela tê-la abandonado para casar e viver uma vida longe dos palcos. A novela das 7 da Globo "Estúpido Cupido", de 76, de autoria de Mário Prata, ressuscitou sua carreira. Mesmo com o passar do tempo ela ainda trazia uma jovialidade, que a trouxe de volta aos palcos.
Trio Esperança |
Ao falar da Jovem Guarda, obviamente foi dado um destaque ao trio Roberto, Erasmo e Wanderléa e o programa de TV que dimensionou a carreira dos três e de tantos outros artistas e grupos, como Os Vips, Ronnie Von, Eduardo Araújo, Trio Esperança, Os Incríveis, Renato e Seus Blue Caps e tantos outros. Um box especial sobre os três filmes estrelados por Roberto Carlos, assinado por Nico Pereira de Queiroz, diz:
"Quem conhece o Roberto Carlos atual, dificilmente poderá imaginar 'o outro', o rei da Jovem Guarda. Verdadeiro rock'n roll. Com a ajuda do diretor Roberto Farias, produziu e interpretou três filmes que conseguiram levar para a tela toda a loucura que a Jovem Guarda representou, com a grande força do Tremendão e da Ternurinha. O trio perfeito: o heroi, o escudeiro e a namoradinha eterna e pura. O primeiro filme foi Roberto Carlos em Ritmo de Aventura, lançado em 1968, algo do tipo James Bond misturado com Help, dos Beatles. O segundo filme, mais do tipo Spielberg, rodado no Japão e Israel, foi O Diamante Cor-de-Rosa. O terceiro, certamente o melhor, foi o mais 'brasileiro': A 300 Quilômetros por Hora, onde Roberto Carlos interpretava um mecânico pobre, que, na última hora, substitui o piloto, ganha a corrida e a mulher do piloto. É mole?"
A Tropicália é destacada em seguida, relatando toda a revolução estética que o movimento liderado por Caetano e Gil representou. Os Mutantes - o braço mais roqueiro do movimento - logicamente ganharam um destaque, não só por seu envolvimento com a Tropicália, como por tudo que representam na história e no amadurecimento do rock brasileiro.
Tim Maia, nos anos 70 |
Os anos 70, uma das fases mais ricas e criativas de nosso rock são relatados através de personagens fundamentais para o rock brasileiro, como Rita Lee, Secos & Molhados, O Terço, Made in Brazil, Novos Baianos, o rock rural de Sá, Rodrix & Guarabyra e Raul Seixas, que na época de publicação da revista ainda era vivo, e foi descrito como "A mosca que ainda pousa na sopa do rock bem-comportado. A receita? Chuck Berry + esoterismo + Little Richard + ousadia = duas décadas de rock puro e abusado".
Também é importante destacar artistas que estão intimamente ligados à história de nosso rock, sem que obrigatoriamente seguissem a estética rock'n roll, caso de Tim Maia, que é o responsável por uma vertente mais swingada e ligada à soul music. Ou ainda uma tribo que é assim apresentada na revista: "Espremidos entre a a tribo roqueira e a MPB bem estabelecida, havia os 'malditos': Jorge Mautner, Walter Franco, Macalé e Luiz Melodia."
O Barão Vermelho, no seu início |
Finalmente, chegando nos anos 80, a revista fala do que era atual. O rock brasileiro vivia um de seus períodos de maior popularidade, e muitas bandas, já consolidadas e emergentes eram destacadas: RPM (a banda de maior sucesso na época), o punk-rock dos Inocentes, Gang 90, Blitz, Sempre Livre, Kid Abelha, Ritchie, Paralamas, Barão Vermelho, Lobão, Titãs, Legião, Capital Inicial, Plebe Rude, etc.
Outros grupos também são lembrados, como nesse trecho da revista: "No início da década, o underground paulista está em plena ebulição. Grupos como Ira!, As Mercenárias, Ultraje e Voluntários da Pátria dividem a mesmo palco. No Rio, quem dita as regras do rock nacional é a 'maldita' Fluminense FM."
Assim é contada a história do rock brazuca com boas fotos e referências que servem como um bom material de pesquisa. Um tipo de revista que pode ser chamada de "edição de colecionador".
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