Palavras Domesticadas

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quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Uma Carta Uma Brasa Através - Paulo Leminski


Paulo Leminski morreu em 1989, e após sua morte alguns textos inéditos foram publicados, reunidos em edições especiais, trazendo a marca de qualidade, que foi sua marca. Em 1992 a editora Iluminuras publicou um livro com cartas de Leminski para seu amigo Régis Bonvicino, escritas de 1976 a 1981, trazendo textos poéticos, críticos e repletos da verve literária, numa escrita às vezes caótica, mas genial, que sempre permeou tudo relativo ao grande poeta curitibano.
O livro traz prefácio de Caetano Veloso, que diz:
"Leminski foi o poeta mais apaixonado e o escritor mais intenso de sua geração, e as cartas que compõem este livro são um outro modo de nos aproximarmos do entendimento de sua trajetória. Dos primeiros poemas em Invenção ao livro sobre Bashô, do Catatau às decisões caprichosas de relaxar, das canções caipiras ao Agora É Que São Elas (romance fascinante que é um anticlímax em relação ao Catatau mas que me parece ter de fato o interesse que Boris Shneiderman aponta nele, em artigo também constante deste livro), Leminski viveu delícias e tormentos que procurou comunicar aos amigos, e é bonito ver isso nas cartas a Régis."
Na orelha do livro Régis Bonvicino escreve:
" 'Uma carta uma brasa através' é o verso inicial de um poema de Paulo Leminski, que tematiza a correspondência. O texto, publicado em 'Caprichos e Relaxos', prossegue: 'nuvem cheia de minha chuva/cruza o deserto por mim/a montanha caminha/mar entre os dois/uma sílaba um soluço/um sim um não um ai/sinais dizendo nós/quando não estamos mais'. Paulo Leminski já não está mais entre nós desde outubro de 1989 (*), mas deixou sinais: seus livros de poesia e prosa de ficção, os textos jornalísticos, cartas, etc. Por isso resolvi adotar o verso 'Uma brasa uma carta através' como título deste volume, que reúne as cartas por ele enviadas a mim de 1976 a 1981 - ano que Leminski comprou seu primeiro telefone e foi, gradativamente, perdendo o hábito de escrevê-las."
Segue abaixo, uma dessas cartas, de 1979, respeitando a grafia original, publicada no livro:
"Nos 3 dias de show, Gil dedicou para mim 'Logunedé' (soube depois q em Porto Alegre ele dedicava a mesma música a Caetano q estava lá) com o seguinte comercial: para Paulo Leminski, grande poeta do Paraná, poeta realce, uma das inteligências mais faiscantes destre país...
Num dos shows, Cetano cantou a pedido meu 'Cajá', dizendo, 'esta música é para um amigo meu, o grande Paulo Leminski'...
Quer dizer: em matéria de ego, não posso querer mais... definitivamente, meus ídolos são meus fãs.
no último dia, Caetano e músicos foram num jantar na casa do Helinho, garoto nosso daqui.

De tarde esteve aqui em casa onde cantei as últimas.
Ele, enfim, pediu uma fita !!! Que dei de qualquer jeito...
Perguntou se Walter ia mesmo gravar 'Verdura', eu expliquei que não, e ele:
- Ótimo! Porque eu vou gravar!
Disse que neste LP não dava mais. Mas q ele ia cantar no show 'Cinema Trascendental', a seguir... Terminamos a noite de manhã, Caetano e todo mundo cantando 'Verdura', várias vezes...
E soube q Gil disse a um garoto daqui q a joia mais preciosa q ele estava levando de Curitiba era minha fita com música q ia estourar no próx LP dele (q é 'Mudança de Estação', acho).
Estou até meio tonto com tanto...
É um sonho paranoico de 10 anos come true!
(pintou uma música nova: 'canção movida a energia solar', Caetano curtiu pacas
a tempo (há tempo? será que o tempo existe mesmo ou é um subproduto da (H) história? ora, cartésio, isso são horas? vá dormir, que você precisa, rapaz!)
lucinha turnbull(re/rita lee) vai lançar um lp odeon produzido por gil soube via ele q eu tinha cansongs merveieulleulyeuxes
me telefonou implorando, em prantos, uma fita cassete
o qual mando
minha passagem para a MPB está para se completar: operação mass-mídia"

(*) Com relação à data de morte de Paulo Leminski, Régis Bonvicino comete duas imprecisões neste livro. Primeiramente, na orelha ele afirma que foi em outubro de 89. Depois em um artigo, ao final do livro, denominado Morte, que começa com a frase: 'Paulo Leminski, que morreu anteontem...', um texto de rodapé informa: "Artigo publicado na Folha de São Paulo em 9 de agosto de 1989, dois dias depois da morte do poeta(...)". Na verdade Paulo Leminski faleceu no dia 07 de junho de 89, mesma data em que faleceu a cantora Nara Leão.

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