Em 1994, a revista Vogue trazia uma edição especial em homenagem a Jorge Ben Jor. Em uma edição caprichada, com muitas fotos e depoimentos, a revista mostra várias facetas da carreira desse grande compositor e músico. Entre as muitas matérias, há uma que traz curiosidades a respeito de vários assuntos, como explicações sobre algumas de suas letras, que sempre trazem citações, ou trechos de entrevistas, que trazem revelações interessantes, como as transcritas abaixo:
"Como entrar no palco
Num desses momentos de descontração, apenas dez anos depois de ter iniciado, de modo fulminante, sua carreira, Jorge confessava a Silvio Di Nardo: 'Gostaria de ser apenas compositor, deixar de ser cantor. Mas sei que isto, tão cedo, não será possível. Quando me apresentava no Fino da Bossa e no Jovem Guarda , na Record, aprendi muito da vida. Como entrar, ficar e sair de um palco. Mas a lição mais importante foi aprender com quem ficar. Na vida musical é preciso, sempre, ir com muito cuidado. Existe muito lobo querendo engolir você. Mas graças a Deus estou resistindo bem'.
Tão bem que, vinte anos depois, á a maior explosão da MPB.
Modernizando o samba
Ao lançar seu vigésimo-primeiro disco, Benjor, Mario Cesar Carvalho assim definiu Jorge: 'Em 1964 com Sacudin, ele eletrificou o samba, inventando um ritmo próprio. Agora, ele traz os ritmos mundiais pra sua praia sonora, criando sua própria world music. É o único brasileiro residente aqui que conseguiu modernizar o samba'.
Tropicália e musas
Numa bela entrevista a Roberto Comodo, no início do ano, Jorge Ben Jor concordou que 'a minha musa sempre foi a mulher. E as coisas doces e o futebol, que era uma coisa vista como como meio alienada pelas pessoas de minha geração. Elas gostavam, mas queriam uma coisa mais direta, uma música de protesto. Fiz parte da Tropicália, mas fui aceito pelo meu estilo de música, pela minha filosofia urbana e suburbana. E as crianças sempre gostaram. E agora eu acho que esta juventude cresceu ouvindo meus discos que estavam nas estantes dos pais e dos tios. Vejo isso nos shows que fiz em 92, nas faculdades todas do Rio, para a garotada'.
Enlouquecendo Paris
Quando Jean-Louis Barraut, o maior ator e diretor do teatro francês, foi convidado, em 1972, para organizar o show para a Exposição do Parc de la Defense, ele exigiu uma escola de samba brasileira e um cantor, Jorge, ainda Ben. Sabia o que fazia. Na noite de estreia, quando Jorge acabou de cantar, cinco mil convidados levantaram-se para aplaudir. Mais do que isso, aos poucos eles começaram a subir no palco. Era a elite parisiense contagiada pelo samba e pela batida de Jorge. Socialites misturavam-se aos passistas, no que foi descrito como um 'frenesi sem igual'. É uma festa que deveria terminar às 10 da noite só acabou às 3 da manhã.
Competição de decibéis
Alberto Dines, em 1979, ao comparar dois monstros da música popular, Cartola e Jorge Ben, assim definiu este: 'Jorge encontrou uma fórmula, um esquema, um meio. Mas não precisou procurar muito - estava nela. O volume ensurdecedor do seu instrumental não o incomodava, nem a sua plateia. Ele é como o dono daquele fusca, cujo cano de escape aberto e o aparelho de som no último volume não perturbam ninguém. A competição e a comunicação entre esses dois neomotorizados são feitas pelos decibéis. Jorge Ben Jor é a autenticidade e a pureza do samba. Ele está para a música popular como a Beija-Flor para as escolas de samba tradicionais'.
Cortar palavras
A separação de sílabas, a fragmentação das palavras, as frases incompletas são características que marcam fortemente Ben Jor. Além destas bossas, ele tem o costume de, na hora da gravação inventar uma palavra e colocar no meio da frase. Uma palavra cujo significado só Jorge sabe e que, mais tarde, acaba decodificada. Ele um dia revelou: 'A separação das sílabas surgiu por acaso em um show maravilhoso que eu mais Paulinho da Viola, Toquinho, Araci de Almeida, Trio Luís Melo e Trio Mocotó fizemos em São Paulo, no Teatro Cacilda Becker. Só os amigos viram este show, mas para mim foi dos mais importantes. Uma noite, eu estava tão à vontade com o público que comecei a improvisar. Cortava a música toda. O pessoal gostou muito da ideia. Tudo surgiu assim, de repente, sem estudo.
' A minha filosofia é a do bem-estar, que procuro sempre, segundo o ditado dos alquimistas: 'Não conviver longe dos homens, mas morar longe dos homens que podem te prejudicar'. A minha filosofia é musical e através da música estou ligado à alquimia. É uma contribuição feita com consciência, nunca esquecendo que a alquimia é uma 'ciência com consciência' '.
A ótima repórter Miriam Alencar foi numa das primeiras jornalistas a extrair de Jorge certas revelações importantíssimas. Como: ' Comecei, ainda garoto, a ler, por curiosidade, os livros do meu avô que era rosa-cruz. Lia em francês e latim. Ao mesmo tempo, comecei a descobrir porque gostava tanto de vitrais. Era ali, nos vitrais das famosas igrejas da Idade Média, que os alquimistas colocavam suas fórmulas mágicas, representadas por desenhos. Foi na Europa que eu pude me aprofundar mais, não só por ter mais tempo, como também porque lá se encontram grandes alquimistas e os melhores livros. Passei a procurar os locais certos, como a casa onde viveu Nicolas Flamel, alquimista que viveu no século XV. É na Rue Morancy e tem uma placa relembrando o fato. Tem também a Torre de Saint-Jacques, que ninguém até hoje soube explicar a construção'.
Deste encontro é que nasceu um de seus discos mais singulares, o Tábua de Esmeraldas. "
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