Palavras Domesticadas

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sexta-feira, 2 de agosto de 2013

João Bosco - Revista Música 1978 (2ª Parte)

"Uma análise do próprio disco, ou mesmo de algumas músicas, pode ser redundante, segundo o autor. Alguns aspectos, porém, ficam claros. As letras de Aldir, por exemplo, são classificadas como 'uma coisa cortante, irônica, satírica e, acima de tudo, firmes em seu propósito.' O elepê, que se propõe a retratar o nascimento e morte de um 'herói', que pode ou não ser brasileiro, segue o estilo da dupla.
A preocupação básica de Aldir e João sempre foi mostrar o trabalho em shows, pois para ambos o disco não é suficiente para representar esse trabalho. 'Acho que já cantei para um público bem distinto. Presos comuns, delinquentes juvenis, comerciários, gente fina e até mesmo em praça pública. É uma preocupação que sempre tive. Se o trabalho restringe o público, e ele não entende a linguagem, a culpa é nossa. Nas apresentações, sempre procurei esquecer a possibilidade de não ser entendido. No momento em que cantava, eu pensava que as pessoas me entendiam e isso me bastava.'
Durante muito tempo, João Bosco foi um dos poucos artistas que trabalhou sozinho, apenas com um violão na mão. Assim seria mais fácil se livrar de possíveis prejuízos, o que não aconteceria num trabalho com muitos músicos. 'Nós queremos que o músico brasileiro tenha sua função, possa sobreviver. São poucos os que conseguem sobreviver de trabalhos em estúdios.  Sempre saí com meu violão, e isso porque me apresentava em salas de aula, teatro e qualquer lugar em que coubesse um violão. E isso aliado ao que mais me interessava, que era o fator ideológico - mostrar às pessoas o lado refinado de uma melodia, não todo um efeito maravilhoso de iluminação, não o toque genial de um diretor. Mas mostrar um trabalho simples, de maneira que possibilitasse criar um clima, onde as pessoas pudessem conversar comigo. Apenas com o violão, é possível fazer um show mais à vontade. Sem nenhum aparato técnico, me expondo cada vez mais, melhor o público me conhece. Isso foi uma  coisa que me enfeitiçou. Em diversos lugares, em diversos lugares, com diversos públicos, pude sentir essa relação de trabalho com eles.'
Ao lado de Paulo Emílio, letrista apresentado por Aldir e autor das músicas 'Amon Ra', em parceria com Aldir, e 'Cavalo de Tróia', em parceria com João, ambas incluídas em seu primeiro elepê 'João Bosco', o compositor está escrevendo um show para ser lançado no Rio, provavelmente no início de abril.
O show incluirá uma amostra de toda a carreira do compositor, desde o princípio do seu trabalho até o último disco. Propositalmente, não haverá preocupações com direção e iluminação. O objetivo é simplesmente mostrar ao público músicas que 'as pessoas tenham esquecido ou não tenham conhecido. O primeiro disco ainda é inédito. Como sempre, algumas músicas foram mais executadas e outras nem foram tocadas. Com esse espetáculo, as pessoas terão uma ideia global do trabalho. Inclusive, é um show para viajar. Além das músicas, talvez eu inclua alguns textos sobre a minha vida e o meu trabalho.'
João com o parceiro Aldir Blanc
Além dos planos para esse show, a inclusão de 'Bijuterias' como música-tema da novela 'O Astro', da TV Globo, contribuiu, a seu modo, para a divulgação do trabalho do compositor. Mas essa experiência, porém, não é nova no trabalho da dupla João/Aldir. À princípio, os autores foram convidados a fazer o tema de Tonico Bastos na novela 'Gabriela', também da TV Globo. O trabalho, embora registrado em disco, não foi aproveitado. Os autores ouviram duas explicações: a primeira, culpando a censura federal e, a segunda, a censura da própria emissora. Mais tarde, em 'Roque Santeiro', novo convite foi feito, mas a novela foi censurada.
'Agora, terminando de gravar o disco, apareceu alguém no estúdio e se interessou por 'Bijuterias'. Achei que a música contava a história da novela e cedemos. Só foi consentida porque tinha a ver com a novela. Não sou contra o uso da minha música, quando há respeito e tem a ver com o que está sendo mostrado. Pelo contrário. Na verdade o público fica sabendo da existência daquele trabalho. E, de repente, você vai poder mostrar outra coisa, em função dela. Quanto maior resistência houver no trabalho, mais você se isola e fica cantando para uma elitezinha. Você não pode dificultar o próprio acesso do seu trabalho ao público. Você tem que brigar dentro desse jogo que está aí.' "

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