Palavras Domesticadas

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segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Antônio Bivar e Leilah Assumpção: Vivendo Intensamente os Anos 70


Antônio Bivar e Leilah Assumpção eram dois jovens escritores e teatrólogos brasileiros, que como tantos outros personagens de nossa contracultura, resolveram partir para Londres e para o mundo na época do movimento hippie. Segue abaixo um depoimento de Bivar, e uma carta de Leilah para ele, relembrando já nos anos 90, aqueles anos loucos.
"Estou morando em uma comunidade hippie. Ingleses, americanos, brasileiros, belgas, etc na Cromwell Road, com um grande jardim interno, do tamanho de um quarteirão. Claro, estou aqui de passagem. As pessoas são maravilhosas e estou achando ótimo não ter lugar fixo, pois assim vou conhecendo meio mundo, ganhando experiência e aprendendo cada vez mais. As pessoas são gentis e sinto que gostam de mim. Me sinto em casa. David, o americano amigo de Naná, me chama para irmos de bicicleta até a Lapônia (onde não há noite nesta época do ano, 24 horas de sol, dizem). E da Lapônia, rodar pela Escandinávia.
Talvez vá. Rute e Jorge Mautner me chamam para ficar com eles na Calábria, onde passarão dois meses. Michael, um dos heads da comunidade, me convida para ser seu companheiro numa ida à Índia. Bem que eu gostaria. Mesmo porque, segundo Michael, não custa nada e vai-se de carona. Outros me chamam para ir à Espanha, que dizem ser deliciosa na primavera/verão. A apaixonante Renata Souza Dantas insiste para que eu vá com ela & turma para Formentera, nas Baleares. Naná quer me levar pra Marrocos. Fico contentíssimo com toda essa joie mas acho que vou ficar mesmo é na Inglaterra, que adoro. Toda uma eternidade para conhecer esta ilha e curti-la ainda seria pouco. Mas talvez, who knows, dê uma saidinha de 15 dias."
Antônio Bivar (Diários Ínfimos, Londres, 18/05/1970)

" São Paulo, fevereiro de 1990
Bivar,
A gente queria mudar o mundo, sim. De forma tranquila. Saindo pelas estradas, aos bandos, nós, os jovens, cada vez mais jovens e cada vez mais bandos. Acho que nós conseguimos. Mais do que tantas outras gerações. Antes se vestia a moda "ditatorial". Hoje cada um veste o que quer, mesmo dentro de griffes. Descobrimos a cor. Nas roupas, nas nossas cartas arco-iris, no mundo! A mulher descobriu sua força, o homem, sua fraqueza. Sentimos o prazer sexual fora de uma relação sadomasoquista. Antes, o prazer só vinha com a punição (dez ave-marias e oitenta pais-nossos). Descobrimos a estrada e estivemos em Londres, Marrocos, Nova York, Amsterdã, Índia, Peru, de mochila nas costas, sleeping-bag e caronas. Formentera, 1970. A ilha do Mediterrâneo onde nadávamos nus (foi a primeiras vez que meu bumbum sentiu o sol direto). Em Londres, 70, dormíamos na fila para ver os Rolling Stones (especialmente Mick Jagger). Não esqueço o dia em que você me contou de sua caminhada pelo campo, de ter sentindo muita fome e, aí então ver surgir a macieira carregadas de maçãs vermelhas e brilhantes. Antes, as estradas, as fronteiras e as porteiras eram todas estritamente demarcadas, e vir de Ribeirão Preto (você) ou Botucatu (eu) já era de uma coragem e ousadia transcendentais. E, de repente, o nosso "Bando" transformou tudo num mundo só(...)
Um grande beijo,
Leilah"

4 comentários:

  1. Que lindo! Amei. Estou lendo BIVAR na corte de Bloomsbury...feliz porque também tenho a mania de juntar coisas relacionadas com meus "idolos", mas ele foi mais fundo, eu nem sabia que existia esse festival de verão na Inglaterra...parabéns Bivar.
    Obrigado Marcio,parabéns pelo blog.

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  2. Obrigado pelo comentário, Jutilde. É sempre bom saber um pouco mais e mostrar coisas e pessoas interessantes de nossa cultura.
    Um Abraço

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  3. Curioso, também estou lendo Bivar na corte de Bloomsbury, e, procurando pelo autor aqui na rede, acabei caindo neste blog.........estou adorando o livro, e muito mais o autor!

    Valéria Cavalcanti

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  4. Obrigado por visitar meu blog. Volte sempre, Valéria. Abraço

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