Palavras Domesticadas

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terça-feira, 6 de março de 2012

Os 90 Anos da Semana de Arte Moderna de 1922



Nesse ano de 2012 o Brasil festeja os 90 anos de um dos acontecimentos mais marcantes da cultura nacional: A Semana de Arte Moderna de 1922. Acontecida em fevereiro daquele ano, em pleno período de carnaval, a Semana de 22 acabou entrando para a história cultural brasileira como um evento dos mais ricos e ousados, e que iria influenciar gerações e gerações de artistas, escritores, músicos, cineastas, teatrólogos, etc.
A ousadia do movimento já começa pela própria data em que ocorreu: em pleno carnaval de 1922. Segundo a historiadora Rosa Maria Araújo, a semana não explodiu no carnaval por acaso. Havia um forte elemento de transformação em ambos. Além do mais, um dos livros mais representativos do movimento modernista tinha por título, "Carnaval", de Mário de Andrade.

O encontro de intelectuais e artistas que buscavam novas formas de expressão artística, quebrando regras e estabelecendo novos parâmetros, fez da Semana de 22 um marco não só da artes nacionais, como também a nível mundial.
Quando, por exemplo, o maestro Villa-Lobos se apresenta para reger uma orquestra vestindo fraque e calçando chinelos, quebra qualquer padrão estético, mesmo que a música executada continue a mesma. Artistas plásticos como Di Cavalcanti, Anita Malfatti e Tarsila do Amaral chamavam a atenção para uma nova estética pictórica, e completamente engajada com os ideais do movimento.

Apesar de toda inventividade, e uma nova proposta de se enxergar a arte, e até talvez por isso mesmo, a arte modernista sofria forte resistência da ala mais conservadora da cultura nacional. Um exemplo é a pintora Anita Malfatti, que já em 1917 propunha um novo conceito nas artes plásticas, e ao expôr suas obras em São Paulo foi duramente criticada por Monteiro Lobato, que escrevia em um suplemento cultural do jornal O Estado de São Paulo. Em artigo escrito no jornal O Globo sobre o episódio, em 10/02/02, Wilson Bueno relata:
"(...)Isto convenceu à rebelião dos amigos de Malfatti, Oswald e Mário de Andrade, por quem a artista teceu um complexo de amor platônico. Mário, homossexual, soube corresponder a esta falta de amor bíblico entre um homem e uma mulher.
Com um certo atraso, conseguiram arregimentar artistas jovens, buscar o subsídio de Paulo Prado, cabendo a organização do evento ao carioquíssimo Di Cavalcanti, então em São Paulo. A mostra pretendia chocar. Reconstituída, à exceção da obra expressionista de Malfatti, dos poemas lidos por Mário e da música de Villa-Lobos, a farra modernista era modesta em audácia formal."
Oswald de Andrade, um dos líderes do movimento, trazia em seus textos uma nova linguagem, ousada, criativa, rica em referências de uma cultura nacional pouco explorada. Seus textos teatrais nunca perderam a atualidade, e até hoje podem ser encenados. O exemplo mais marcante do teatro modernista é O Rei da Vela, que em 1967 teve uma montagem histórica, dirigida por Zé Celso Martinez Corrêa, que se alinhou com o movimento Tropicalista, um filho direto do modernismo.

Em entrevista, por conta dos 80 anos da semana de 22, e sobre o Modernismo, o poeta e ensaísta Ferreira Gullar, respondeu, ao ser indagado como o Modernismo afeta a cultura popular:
"Em 65 escrevi um artigo falando do problema estético na sociedade de massa. Pela primeira vez um intelectual elogiava o Chacrinha. Reconhecia que era um cara com grande inventividade e irreverência. Depois me arrependi um pouco, porque vi Chacrinha transformado numa espécie de exemplo estético. Não era a minha opinião... mas ao mesmo tempo é um período interessante... as escolas de samba passam a ter uma presença grande na vida da cidade e do país, tanto que o próprio Hélio Oiticica se mete na Mangueira, quer ser passista.. Essa aproximação da cultura de massa erudita é um fenômeno daqueles anos. Então é nessa onda, a partir da montagem de "O Rei da Vela" pelo Zé Celso, o Oswald é trazido para a atualidade, e embora uma peça anarco-marxista de um radicalismo total, de um esquerdismo atroz, os elementos irreverentes do Oswald fazem a coisa estrapolar, fica carnavalesco. Aí o pessoal junta com o tropicalismo, e há os Beatles, os hippies, o LSD. E cria-se outra cultura. O Brasil é um país interessante porque sempre consegue transformar o que absorve em algo original."

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